No fim de maio deste ano, o grupo Carrefour Brasil obteve, enfim, a aprovação do Conselho Administrativo de Defesa Econômica (Cade) para a compra do grupo Big, que havia sido anunciada em março de 2021, em um acordo de R$ 7,5 bilhões.
O sinal verde foi a chave para engatar uma onda de conversões, com maior foco no Atacadão. A marca de atacarejo é o carro-chefe da operação local do grupo francês, avaliado em R$ 34,1 bilhões, e respondeu por 73% das vendas brutas acumuladas pela companhia entre janeiro e setembro de 2022.
Essa agenda é uma das principais vias do Atacadão para saltar de 296 para 470 lojas até 2026. Mas não é a única. Outra grande aposta é investir em unidades menores para acelerar sua expansão e manter-se na dianteira do setor, especialmente em um cenário no qual os rivais também estão ampliando seus domínios.
“Hoje, temos um modelo de lojas desenvolvido com 3,5 mil metros quadrados, que nos abriu um novo horizonte”, afirma Marco Oliveira, CEO do Atacadão, ao NeoFeed. “Nossa expansão não virá 100% desse formato, mas ele será o preponderante.”
Até 2026, o plano inclui 70 conversões do grupo Big – entre as bandeiras Maxxi e Big – e uma média de mais de 25 aberturas orgânicas por ano. Nas duas frentes, a proposta de “encolher” as lojas passa por um modelo cujo tamanho será, em média, de 3,5 mil metros quadrados, contra os 6 mil metros quadrados habituais.
O investimento na inauguração de uma unidade nesses moldes é, em média, 30% menor. Em termos de sortimento, o volume cai de 8 mil para 6,5 mil SKUs, porém, sem o prejuízo de categorias. Nesse caso, o Atacadão reduz as opções, por exemplo, dos tamanhos disponíveis de embalagens.
Oliveira diz que, desde a compra do Atacadão, em 2007, o Carrefour cumpriu um calendário de expansão que permitiu à rede colocar os pés em todas as capitais do País. A aquisição do Big reforçou a presença nas regiões Sul e Nordeste, as únicas em que essa expansão ainda estava aquém das pretensões do grupo.
A expansão da rede seguiu o crescimento registrado pelo segmento do atacarejo nos últimos anos. Primeiro, a partir da crise de 2015, com muitos consumidores migrando para esse formato o que explica, em parte, o declínio do modelo de hipermercados no País.
Essa tendência ganhou corpo nos anos seguintes e também durante a pandemia, além de ser turbinada, desde 2021, pela elevação da inflação. Nesse contexto, as redes do setor passaram a avançar além das zonas periféricas das grandes cidades em que o formato se popularizou.
“Esse nosso modelo de loja se encaixa em dois eixos: as regiões mais adensadas e centrais das grandes cidades, onde há falta de terreno”, diz Oliveira. “E as cidades menores, de 100 mil habitantes, onde tenho o terreno, mas não o potencial econômico para uma loja maior.”
A partir desse recorte, o CEO do Atacadão explica que a escolha dos novos pontos não irá priorizar nenhuma geografia no País e será definida, loja por loja, com base nos critérios de “consolidação, defesa e conquista”.
“Ou seja, as cidades que já comportam uma segunda loja, aquelas nas quais preciso construir uma nova unidade para antecipar o crescimento e fazer uma barreira de entrada para a concorrência e aquelas em que ainda não temos presença”, afirma Oliveira.
Recheado, o calendário de inaugurações em novembro mostra a aplicação desses conceitos. Uma das aberturas orgânicas envolveu a unidade de 4,4 mil metros quadrados em Americana (SP).
Já o bloco das conversões passou por municípios como Vitória da Conquista (BA), com 3,1 mil metros quadrados; Juazeiro do Norte (CE), 4 mil metros quadrados; e Pinhais (PR), 2,9 mil metros quadrados.
Agenda cheia
Antes de colocar a mão na massa, o Carrefour aproveitou a espera pela decisão do Cade para analisar quais formatos seriam mais aderentes para cada unidade do Big. Com o apoio da consultoria Bain, a avaliação pesou fatores como a concorrência e a presença do grupo no entorno dessas lojas.
Até o fim de 2022, o Atacadão planeja concluir 37 conversões. Nessa toada, Oliveira diz que tem cumprido uma rotina diária de 14 horas de trabalho, sem feriados e com pouco descanso. Entretanto, ele ressalta que o trabalho agora é muito mais “braçal”.
“Já temos uma linha de produção nesses projetos”, diz o executivo, ao citar a bagagem acumulada pelo Carrefour desde que incorporou o Atacadão, na época, dono de 34 lojas. Oliveira acompanhou de perto essa jornada. No grupo francês desde 1991, ele liderava a área de M&As quando a aquisição foi fechada.
Desde então, ele integra o time do Atacadão, onde foi controller, CFO e diretor de operações. Nessa última função, antes de assumir como CEO, em agosto de 2021, liderou as 28 conversões das lojas do Makro adquiridas no fim de 2020.
“A conversão das lojas do Makro foi um grande desafio, porque foi feita exatamente durante a pandemia”, conta Oliveira. “Mas foi também um grande aprendizado e, na verdade, um aquecimento para a chegada do grupo Big, que é algo muito maior.”
Dona de uma base de mais de 230 unidades e principal concorrente do Atacadão, o Assaí reforçou esse viés de consolidação no setor ao comprar, em outubro de 2021, 71 unidades do Extra Hiper, das quais, projeta converter 45 ainda em 2022.
“O Atacadão fez movimentos inorgânicos antes do Assaí, o que ajuda a explicar o fato de ter mais escala”, afirma Danniela Eiger, analista de varejo da XP. “Por outro lado, o movimento do Assaí com o Extra foi mais ágil, pois eles estavam sob o mesmo controlador, enquanto o Atacadão teve que seguir todo o trâmite tradicional com o Big.”
De janeiro a setembro, o Atacadão reportou vendas brutas de R$ 53,7 bilhões, alta de 27,2% sobre igual período de 2021. Nesse intervalo, a receita bruta do Assaí cresceu 28,2%, para R$ 42,2 bilhões. Para Eiger, apesar das vantagens e desafios de cada rede, há outros pontos que aproximam as duas operações.
De janeiro a setembro, o Atacadão reportou vendas brutas de R$ 53,7 bilhões, alta de 27,2% sobre igual período de 2021
“A integração do Big é um pouco mais complexa, mas não é necessariamente uma desvantagem”, diz. “E, com as lojas menores, o Atacadão está fazendo um movimento semelhante ao Assaí com as lojas do Extra. Só é preciso entender se a conta desses modelos irá fechar.”
Essa competição por metros quadrados não está restrita, porém, aos dois grupos. Redes regionais também vêm avançando nessa frente. São os casos, por exemplo, do Grupo Mateus, no Norte e Nordeste; Muffato, no Paraná; e Grupo Pereira, com o Fort Atacadista, em Santa Catarina.
“Há muitas redes regionais fortes, mas também existem muitas redes locais, de três a quatro lojas”, diz Oliveira, que não descarta novas investidas da rede nesse contexto. “Estamos sempre atentos. No futuro, elas também podem ser uma oportunidade de M&A.”