Tida por analistas do ecossistema foodtech como uma das tendências “mais quentes em tecnologia de alimentos de 2022”, a fermentação de precisão parece saída da literatura de ficção científica.

Graças aos avanços nos conhecimentos sobre microbiologia e genética, os cientistas transformam fungos e bactérias em miniusinas de proteínas, gorduras, óleos, enzimas, pigmentos, aromatizantes e texturizantes.

A tecnologia está no centro de um dos campos mais férteis (e fascinantes) da nova ciência dos alimentos – o da produção de alimentos análogos aos de origem animal. Dos laticínios sem as vacas leiteiras; das carnes sem o abate das criações; dos ovos sem as galinhas; do mel sem as abelhas; dos pescados sem os peixes.

Ao acenar com a possibilidade de um futuro mais sustentável, saudável e diverso, a fermentação de precisão faz brilhar os olhos dos consumidores e dos capitalistas de risco.

Avaliado atualmente em US$ 1,6 bilhão, o setor deve chegar a 2030 com US$ 36,6 bilhões, a uma taxa de crescimento anual em torno de 48,1%, pelos cálculos da consultoria MarketsandMarkets.

Pelas contas da Good Seed Ventures, empresa alemã de venture capital, só no primeiro trimestre de 2022, 20 negócios, fechados em 12 países, movimentaram US$ 500 milhões, em investimentos. Para se ter ideia do que isso representa, ao longo de todo o ano passado, os aportes nas empresas somaram “apenas” US$ 1,7 bilhão.

No ano passado, foram lançadas 15 startups com foco em tecnologias de fermentação. Delas, nove trabalham com fermentação de precisão, indica estudo do Good Food Institute (GFI).

E, das foodtechs, fundadas entre 2019 e 2021, 65% investigam a produção de gorduras e óleos para a indústria de laticínios – ingredientes que conferem aos novos leites, iogurtes, sorvetes e queijos as características sensoriais de suas contrapartes de origem animal.

A seguir, o NeoFeed traça o perfil de quatro das startups do setor que mais se destacaram ao longo do último ano. Elaborada a partir de relatórios da indústria, ONGs e empresas de capital de risco, a lista ilustra a efervescência do ecossistema de fermentação de precisão:

  • Primeira empresa do mundo a fabricar proteína láctea por meio de micróbios, a californiana Perfect Day adquiriu, no mês passado, a indiana Sterling, uma das grades produtoras globais de gelatina. O valor do negócio não foi revelado. Fundada em 2014, em Berkeley, na Califórnia, a foodtech lançou seu primeiro produto há dois anos. A marca está nos Estados Unidos, Cingapura, Hong Kong e Reino Unido.
  • Em apenas um ano, a israelense Remilk valorizou dez vezes e hoje está avaliada em US$ 325 milhões. Fundada em 2018, por Aviv Wolff e Ori Cohavi, usa leveduras para fabricar proteínas lácteas. Com os US$ 120 milhões do último aporte, está construindo uma unidade de produção na Dinamarca. Do espaço de quase 7 mil quadrados, segundo Wolff, sairá uma quantidade de laticínios equivalente ao produzido por 50 mil vacas, em um ano.
  • Dedicada aos queijos duros, a inglesa Better Dairy recebeu recentemente US$ 22 Milhões, em investimentos. Por ocasião de sua fundação, em 2020, foram outros £ 1,6 milhão.
  • Em setembro passado, a Cultivated Biosciences, de Zurique, recebeu US$ 1,5 milhão em aportes. Lançada em 2021, a empresa foca em ingredientes que melhorem a textura dos laticínios. Usa uma levedura oleaginosa para produzir óleos.

Apesar do entusiasmo, as startups têm ainda de vencer grandes desafios. Devem melhorar a eficiência da produção, para escalar os novos ingredientes e alimentos. O preço também é uma questão. Um litro de leite, obtido a partir da fermentação de precisão, por exemplo, pode custar até quatro vezes mais do que seu similar animal.

Conforme as pesquisas avançam, porém, a expectativa é a de que, em 2030, os produtos fabricados por micróbios custem um quinto do valor de hoje. E, um décimo, cinco anos depois, preveem os analistas do think tank RethinkX.