"Eu adoro o dourado. É uma cor mágica para o reflexo de uma mulher. É a cor do sol”, dizia o costureiro Yves Saint Laurent, que explorou o brilho do ouro ao longo de toda a sua carreira: de botões ornamentados, bijuterias volumosas, cintos, a bordados, rendas e paetês, nenhuma coleção de sua grife escapou desse toque de luminosidade que o fascinava e que também estava ligado ao seu gosto por festas.
Fonte de inspiração para suas criações, o dourado é o tema da exposição “Gold – Os Ouros de Yves Saint Laurent” apresentada atualmente pelo museu que leva seu nome em Paris para marcar os 60 anos da primeira coleção do estilista para sua própria marca de alta-costura (antes ele havia trabalhado para a grife Christian Dior) e também o aniversário de cinco anos dessa instituição cultural situada em seu antigo ateliê.
O dourado já aparece em sua primeira coleção de alta-costura, em 1962. Para decorar um casaco em lã azul inspirado no vestuário marinho, Saint Laurent utilizou botões dourados com relevo que evocam as cordas de um barco. Logo na entrada da exposição, há três casacos com botões dourados.
Uma das peças, da coleção outono-inverno 1966, tem a forma de tachas, algo mais jovem e moderno, que contrastava com os dos modelos anteriores, mais no estilo da “burguesia” tradicional.
“Eu gosto dos botões dourados. Acho que são as bijuterias de uma mulher. Eu uso muito nos casacos pretos e azuis marinhos”, dizia o costureiro. Os botões, aliás, se tornam rapidamente verdadeiras bijuterias nas coleções criadas por Saint Laurent: eles podem iluminar um conjunto que pareceria austero ou dar uma certa extravagância à peça.
“Yves Saint Laurent dizia que ele não gostava de bijuterias para o dia para as mulheres. Ele prefere colocar botões dourados nos casacos, que têm asperidades e desenhos próprios que fazem a roupa brilhar”, diz Elsa Janssen, diretora do museu e uma das curadoras da exposição.
“Gold” reúne cerca de 40 modelos, alguns emblemáticos, como o vestido-bijuteria fotografado por David Bailey para uma edição de 1966 da Vogue Paris com o título “Tudo em ouro” na capa e ainda um vestido todo de paetês usado pela atriz Catherine Deneuve, além de inúmeros acessórios. A mostra revela a diversidade de ornamentos dourados e a riqueza dos tecidos, que vão de brocados, rendas, lamês, bordados e até couro nessa cor.
“O dourado está longe de ser uma cor como as outras. Ele pode variar sob diferentes formas. Além disso, há um aspecto simbólico que o torna uma cor singular”, afirma Janssen.
O ouro é visto como um símbolo de riqueza e poder, presente na história das monarquias. É certo que coleções de alta-costura são limitadas a um pequeno grupo de pessoas no planeta. Saint Laurent é considerado como alguém que popularizou o dourado, ao integrar a cor já em sua primeira coleção de prêt-à-porter, com sua marca Rive Gauche, em 1966, iniciativa que contribuiu para a democratização da moda, algo que era importante para o costureiro, ressalta a diretora do museu.
Suas bijuterias também eram fantasia, sem metal precioso, completa a curadora. Na exposição há vários colares, braceletes e outros acessórios, todos dourados e de tamanho volumoso, criados por sua musa, a designer de bijuterias Loulou de la Falaise, que trabalhou ao lado do costureiro até 2002, quando ele encerrou suas atividades de alta-costura.
Ao mesmo tempo, além do efeito estético, o dourado também se tornou para Saint Laurent um manifesto do poder feminino. “Com seus modelos dourados, ele transfere poder às mulheres. Já ouvi relatos de mulheres que diziam se sentir poderosas quando usavam suas roupas”, completa a curadora.
No primeiro andar do museu, a exposição continua com o título “tempo de brilhar.” O clima é festivo, com música, e transporta o visitante aos anos 70 em Paris, quando surgiram boates badaladas na capital, como o Palace. Saint Laurent era um assíduo frequentador das festas que agitavam a vida noturna da cidade e o dourado, na sua visão, combina com esse clima.
“A noite deve brilhar. Sem isso seria um pouco ridículo”, dizia. Na sala do primeiro andar há 16 roupas de noite: vestido de lamê, casaco trench de couro dourado, blazer com aviamento em dourado são alguns dos modelos apresentados. Para alguns, o estilista é visto como o precursor do estilo chamativo que brilha.
“Saint Laurent adorava sair, dançar, observar o mundo contemporâneo à sua volta, sobretudo nos anos 70. Nos divertimos ao criar uma sala na exposição que é dedicada à boate Palace”, afirma a curadora.
Como toda exposição no Museu Yves Saint-Laurent, o percurso se termina no escritório do designer, onde ele criava seus modelos. A mostra tem atraído uma média diária de 700 visitantes, segundo o museu, e fica em cartaz até 14 de maio de 2023.