Nas últimas semanas, os sinais emitidos pelo presidente Luiz Inácio Lula da Silva e por sua equipe econômica em relação a uma possível elevação da meta da inflação não têm sido bem digeridos por boa parte do mercado financeiro.
Na manhã de terça-feira, 14 de fevereiro, esse coro dos descontentes ganhou o reforço de mais uma voz de peso. Na abertura do CEO Conference 2023, evento promovido pelo BTG Pactual, André Esteves, chairman e sócio sênior do banco, deixou clara a sua posição sobre o desejo do governo em ampliar “essa dose”.
“Essa tese de ter um pouco mais de inflação para o juro baixar é perigosa para um país que tem um passado como o nosso”, afirmou Esteves. “Não podemos esquecer que somos um alcóolatra momentaneamente curado. Portanto, não nos chamem para uma degustação de vinho.”
Na visão de Esteves, a experiência mostra que, toda vez que um certo patamar da meta, de cerca de 4%, é ultrapassado, são disparados gatilhos que tornam muito mais difícil o combate dos índices inflacionários.
“E aí não tem meia resposta. Para quem está tão preocupado com a questão social, o mais pernóstico de todos os impostos é a inflação”, disse. “Porque, além de provocar desigualdade, provoca pobreza. O rico consegue se proteger e o pobre é frontalmente atacado por ele.”
Em sua participação, Esteves também comentou as críticas constantes feitas por representantes do governo federal, incluindo o presidente Lula, de que os banqueiros teriam dificuldade de reconhecer que o patamar atual da taxa de juros é uma vergonha.
“Existe uma grande falácia de que banqueiro gosta de juro alto. Ao contrário. Na teoria, inflação alta beneficia até mais os bancos. O juro alto prejudica, porque o crédito expande menos”, observou. Para ele, todos estão do “mesmo lado” e querem juros baixo e inflação sob controle.
“Não existe uma contradição, uma divergência, um lado e outro”, afirmou Esteves. “Mas, às vezes, como o remédio é amargo, as pessoas tendem a trazer um pouco mais de viés ideológico para esse remédio. E isso não existe, ele é técnico.”
Nesse ponto ele também reservou um espaço para falar sobre Roberto Campos Neto, presidente do Banco Central, que tem sido um alvo crescente do presidente e de sua equipe. Especialmente, com argumentos de que ele seria um partidário do ex-presidente Jair Bolsonaro.
“O Roberto tem feito um trabalho excepcional, independentemente de ter uma preferência política. Parece ingenuidade dizer que ele está sabotando o governo”, ressaltou. “Tanto que ele não hesitou em subir a taxa de juros a 13,75% em ano eleitoral. Esse argumento encerra qualquer discussão.”
Ao destacar que enxerga uma abertura para o diálogo entre essas duas pontas, Esteves acrescentou que, sob o ponto de vista político, a reforma tributária e, principalmente, o novo arcabouço fiscal serão essenciais para criar condições para uma eventual redução na taxa de juros.
“Não acho que o teto de gastos seja a única regra que funciona. É razoável ter aperfeiçoamentos, desde que eles levem a uma trajetória previsível de dívida pública”, disse. “Isso caminhando mais rápido, as expectativas vão se tornar mais positivas, dando espaço pra essa tão almejada redução dos juros.”