A crescente restrição na oferta de crédito nos Estados Unidos pode mais que dobrar a taxa de inadimplência das empresas americanas mais vulneráveis. O alerta é do Société Générale, um dos maiores bancos europeus, que emitiu uma nota nesta quarta-feira, 3 de maio, endereçada a investidores globais de crédito.
O aviso foi dado em meio a um cenário de tensão no mercado financeiro americano, com mais um aumento da taxa de juros de 0,25 ponto percentual, anunciado horas depois pelo Federal Reserve (Fed, o banco central dos EUA), e com o agravamento da crise envolvendo bancos pequenos e médios do país.
O banco europeu estima que as condições de empréstimo nos EUA atingiram o nível mais rígido desde a pandemia e, por isso, sugeriram aos investidores de crédito que optem pelo mercado europeu de dívida.
O risco maior de inadimplência, adverte o Société Générale, envolve dívidas de grau especulativo, que são empréstimos de alto rendimento concedidos a empresas com crédito mais baixo.
“Os atuais padrões de empréstimos bancários implicam um aumento na inadimplência para 8,4%, mais que o dobro da média de longo prazo e bem acima dos atuais spreads de alto rendimento dos EUA”, diz a nota.
Especialistas têm alertado sobre o risco crescente de inadimplência corporativa desde a falência do Silicon Valley Bank, no início de março – particularmente no setor imobiliário comercial, uma vez que credores de pequeno a médio porte nos EUA financiam cerca de 80% de toda a dívida do setor.
Ainda longe de uma solução, a crise bancária está diretamente ligada à escalada da taxa de juros nos EUA. Isso porque o aumento dos juros pressionou os balanços dos bancos médios e pequenos dos EUA, que haviam adquirido papéis do governo com taxas mais baixas que as atuais - o que levou a uma corrida dos clientes para sacar seus depósitos e buscar alternativas que oferecem retorno mais alto.
Nova quebra
Depois da quebra do Silicon Valley Bank e do Signature Bank, foi a vez de outra instituição financeira de médio porte, o First Republic Bank - que teve saques acima de US$ 100 bilhões em março -, assustar o mercado ao registrar a maior falência de um banco no país desde a crise de 2008. Após sofrer intervenção no fim de semana, o First Republican Bank foi vendido em um leilão para o JP Morgan.
Apesar de o mercado ter recebido com alívio a transação, o temor de novas quebras continuou alimentando a tensão. Na terça-feira, 2 de maio, o SPDR S&P Regional Banking ETF, índice que congrega ações de bancos regionais dos EUA, fechou em baixa de 6,3%.
Na manhã desta quarta-feira, em meio à expectativa da decisão do Fed sobre os juros, as ações de outros bancos regionais abriram no pré-mercado em baixa, como do PacWest (queda de 10,5%), Western Alliance Bank (- 7,2%), Comerica (-3,3%) e Zions Bancorp (-2,6%).
Em sua declaração anunciando a decisão, os formuladores da política monetária do Fed indicaram que irão observar “para ver se movimentos futuros nas taxas são necessários”. A declaração marca uma mudança de postura -- por meses, o Fed deixou claro que seriam necessários aumentos adicionais.
Analistas do mercado afirmam que o novo posicionamento abre as portas para uma possível pausa na política do Fed de elevar os juros para conter a inflação, que fechou março em 7,4%.
O novo aumento, o décimo consecutivo anunciado pelo Fed, elevou os juros para a banda de 5,0% a 5,25% ao ano. A última vez que os EUA tiveram banda de juros acima de 5% ao ano foi em 2007.
De acordo com Francisco Nobre, economista da XP, a recente turbulência no sistema bancário americano restringiu ainda mais as condições de crédito.
“Assim, aumentos adicionais de juros podem forçar a economia dos EUA a uma recessão mais profunda do que o necessário para atingir as metas de estabilidade de preços do Fed”, afirmou Nobre, apostando que o mais recente aumento de juros deve mesmo ser o último da atual série histórica.