Acabou a agonia. O Federal Reserve (Fed), o BC dos EUA, acelerou nesta quarta-feira, 15 de junho, a alta da taxa básica a 0,75 ponto – para o intervalo de 1,50% a 1,75% ao ano, ante 0,75% a 1,00 vigente, o maior aumento de juro desde 1994.

Em seu comunicado, o Comitê Federal de Mercado Aberto (Fomc, na sigla em inglês) justifica a aceleração no ritmo de alta para dar um golpe certeiro, como um ippon, e ganhar a batalha para levar a inflação à taxa de 2% no longo prazo. E diz estar preparado para calibrar a política monetária se surgirem riscos que possam impedir o alcance das metas. Na gestão monetária, o Fed persegue a meta de inflação com pleno emprego e crescimento.

O Comitê afirma ainda que os ganhos de emprego têm sido robustos nos últimos meses e que a taxa de desemprego tem permanecido baixa. A inflação permanece elevada, refletindo os desequilíbrios de oferta e demanda relacionados à pandemia, preços mais altos de energia e pressões mais amplas de preços. E acrescenta que a invasão da Ucrânia pela Rússia está causando “enormes dificuldades humanas e econômicas e adicionando pressões sobre a inflação que também pesam sobre a atividade econômica global”.

Na entrevista após o anúncio do aumento do juro, Jerome Powell, chairman do Fed, afirmou que o cenário atual é de inflação exageradamente alta e de mercado de trabalho muito apertado. Acrescentou que “disrupções” na cadeia global de produção são mais severas e estão durando mais do que o esperado, com destaque para os impactos dos lockdowns na China.

Powell disse ainda que o Fed espera que altas de 0,75 ponto “não sejam comuns” e que “estamos trabalhando duramente para trazer a inflação para baixo e usaremos todas as ferramentas que precisarmos e recursos que temos para isso”.

O chairman do Fed também afirmou que ainda não tem total ciência do quão restritivo o Fed terá de ser. “Onde a taxa de juros irá parar, por enquanto, é a grande questão”, ponderou.

Com o tranco, a instituição confirmou as projeções de grandes bancos que veem no aperto monetário o instrumento disponível e de efeito rápido para conter a inflação. Nos últimos dois dias, j.p. morgan, Barclays, Goldman Sachs, Nomura e Jefferies atualizaram suas estimativas de ajuste do juro americano para 0,75 ponto.

Analistas internacionais preveem mais uma alta de 0,75 ponto para a reunião de política monetária de 26 e 27 de julho, com o BC americano correndo o risco de desacelerar a atividade econômica para conter a inflação que está no patamar mais elevado em quase 41 anos. A inflação nas alturas começa a minar o consumo e a renda das famílias.

O aumento mais forte do juro combaterá a inflação, mas elevará as taxas de empréstimos que, por tabela, promoverão desaquecimento da economia. Não há consenso de que os EUA entrarão em recessão, mas a perspectiva de mais aumentos da taxa básica agrava essa percepção. No mercado futuro de Treasuries, bancos e investidores já sinalizam juro entre 4% e 4,25% para o fim do ano.

O gatilho para a aceleração da alta de juro nos EUA foi o resultado do índice de preços ao consumidor de maio divulgado em 10 de junho. A variação mensal do indicador, 1%, que surpreendeu o mercado e certamente o Fed, elevou a taxa anualizada a 8,6%.

Na esteira da inflação inesperada, os títulos do Tesouro americano dispararam. A taxa de 10 anos – benchmark global de títulos soberanos – atingiu 3,5% na terça-feira, 14 de junho, patamar mais elevado em quase duas décadas. Hoje, o título recuou a 3,4%.

Essa alta reflete a preferência de investidores internacionais pela qualidade do emissor. Nesse caso, os EUA. Esse movimento, denominado “flight to quality”, tem desdobramentos: força a reprecificação global de ativos e expõe a fragilidade de alguns países.

Não à toa, o Banco Central Europeu (BCE) – que já sinalizou aumento de juro em 0,50 ponto em setembro – convocou uma reunião extraordinária nesta quarta-feira para discutir as condições de mercado. E decidiu que usará um programa existente para ajudar a diminuir os custos crescentes de países da zona do Euro para financiar suas dívidas.

A situação dos títulos soberanos da Itália está no foco da instituição que identificou, sobretudo nos últimos dias, divergência acentuada de taxas de financiamento entre os países do bloco.

A atenção do BCE agrava preocupações com a rolagem de dívidas de governos – dívidas soberanas – inclusive porque traz à tona temores vividos em 2011, quando o banco foi obrigado a comprar títulos da Itália, Espanha, Portugal, Grécia, Irlanda para evitar um colapso financeiro na região – consequência da crise financeira global deflagrada em 2008 no mercado de hipotecas nos EUA.

Termômetro de aumento de tensão nos mercados quanto à escalada dos juros promovida pelos bancos centrais, o índice VIX (Volatility Index) – conhecido como o índice do medo – saiu do patamar de 24 pontos para 33 pontos em apenas cinco dias.

Embora sinal de condições financeiras mais restritivas que devem abater pontos no Produto Interno Bruto (PIB) americano e global, a decisão do Fed reduz incertezas e abre caminho para que o Banco da Inglaterra também aumente sua taxa de juros nesta quinta-feira de mercados fechados no Brasil pelo feriado de Corpus Christi. Desafio será o retorno, na sexta.