A Marfrig aumentou sua posição na BRF para 58,9% por meio de fundos de investimentos ligados à companhia. Além da participação direta em ações à vista, a companhia tem derivativos de liquidação financeira que representam 5,11% do capital.

O comunicado sobre o aumento de participação, enviado à BRF, foi publicado no sábado, 12 de julho, um dia após a CVM adiar pela segunda vez a Assembleia Geral Extraordinária (AGE) que votaria a fusão com a Marfrig. Até então, a Marfrig detinha 51,44% da companhia. A Marfrig não está impedida de participar da AGE e, portanto, poderá votar como acionista controladora da BRF.

Quem também acompanhou o movimento foi o BTG Pactual, que informou nesta segunda-feira, 14, ter aumentado participação para 131.005.400 ações, equivalente a 7,79% da companhia. Até então, o banco não aparecia como acionista relevante da empresa, portanto, com menos de 5% da companhia. Segundo o BTG, a posição tem objetivo meramente financeiro, sem intenção de alterar a estrutura da empresa.

A posição à vista do BTG é combinada com 106.938.850 opções de venda (puts) com liquidação física e 3.066.550 opções de venda (puts) com liquidação financeira. Apenas as posições à vista na companhia dão direito de o banco votar na AGE que poderá definir a fusão com a Marfrig.

Na decisão, publicada em 11 de julho, o colegiado da CVM decidiu de forma unânime adiar a Assembleia Geral Extraordinária em que os acionistas da BRF votariam a fusão da empresa com a Marfrig. Com a fusão já aprovada pelo Cade, só falta o aval dos acionistas de ambas as empresas para concluir a operação.

O imbróglio todo é sobre a relação de troca entre as duas companhias, definida em 0,86 ação da BRF para cada nova ação da Marfrig a ser emitida na operação. Na avaliação da CVM, faltou transparência sobre o processo de negociação da relação de troca, especialmente por se afastar tanto da relação de troca sugerida no laudo de avaliação feito pela Apsis no âmbito da operação.

Segundo o laudo da Apsis, uma relação de troca justa consideraria um prêmio para os acionistas da BRF, e não o contrário, como acordado pelas duas companhias. A relação sugerida foi de 2,26 ações da Marfrig para cada uma da BRF.

Esta foi a segunda vez que a CVM adia a AGE da BRF, exigindo mais informações sobre a relação de troca. Após o primeiro adiamento, em 16 de junho, a BRF remarcou uma nova AGE abrindo mais informações sobre o processo de negociação.

O colegiado, no entanto, considerou que os documentos têm pouco valor para os acionistas avaliarem a consistência da relação de troca por estarem ocultos dados numéricos sobre projeções e estimativas usadas nos cálculos das avaliações.

A tentativa de uma reavaliação da relação de troca na CVM vem sendo encabeçada pela gestora de recursos Latache. Especialista em ativos distressed, a gestora montou uma posição na empresa BRF visando a uma possível melhora na oferta para os minoritários. O NeoFeed apurou que outros fundos chegaram a realizar operação semelhante, apostando nessa possível reavaliação.

“Só que, com as últimas compras, praticamente acaba a chance de uma reavaliação. Se ocorrer, pode ser configurado insider trading por parte da Marfrig”, comentou um gestor com posição na BRF que não quis ser identificado.

A relação de troca foi negociada entre comitês independentes de ambas as empresas, com a BRF sendo assessorada pelo Citigroup e a Marfrig, pelo J.P. Morgan.

Embora seja formado pelos membros independentes do Conselho de Administração, o Conselho Independente que negociou a relação de troca também tem sua real independência questionada pelo mercado por ter entre eles um integrante que foi membro titular do Conselho Fiscal da Marfrig de 2014 a 2022.

O aumento de participação da Marfrig na BRF recomeçou em maio, quando a companhia, na condição de controladora, comprou R$ 478,3 milhões em ações e derivativos.

No total, R$ 285 milhões foram destinados à compra de ações e ADRs à vista, enquanto R$ 193,3 milhões foram aplicados em derivativos. Foi a primeira vez que a Marfrig comprou ações da BRF em 12 meses. As compras começaram um dia após a oferta de fusão entre as duas empresas se tornar pública, em 15 de maio.

Questionadas pela reportagem, Marfrig e BRF não se posicionaram.