Presidente da República entre agosto de 2016 e dezembro de 2018, após o impeachment de Dilma Rousseff, Michel Temer acredita que não há outro caminho para o governo brasileiro em relação à tarifa de 50% anunciada pelo presidente americano Donald Trump sobre as exportações brasileiras a partir de 1º de agosto: dialogar e negociar com a Casa Branca.

Em entrevista exclusiva ao NeoFeed na sexta-feira, 11 de julho, Temer afirma que, além da necessidade do governo de Luiz Inácio Lula da Silva adotar uma postura mais diplomática, é importante também entender se Trump não voltará atrás sobre a decisão, como fez em alguns casos após o tarifaço de abril.

“Acho que isso pode ser resolvido com um bom diálogo. Espero que as diplomacias dos dois países trabalhem ativamente para tentar uma decisão. O presidente Trump já tomou decisões de aplicar tarifas sobre muitos países e depois recuou”, diz Temer.

No que ficou conhecido como o ‘Dia da Libertação’, o presidente dos Estados Unidos havia anunciado uma tarifa de exportação de 10% sobre os itens brasileiros, no menor patamar entre os países atingidos pela Casa Branca até então.

O cenário mudou após a reunião dos países que integram o Brics, realizada no Rio de Janeiro nos dias 6 e 7 de julho, que criticou o aumento de tarifas, sem citar diretamente Trump, alegando que iniciativas do tipo “ameaçam reduzir ainda mais o comércio global”.

Na quarta-feira, 9 de julho, Trump divulgou uma carta, endereçada ao Palácio do Planalto, e que trazia razões políticas para o aumento de 40 pontos percentuais na alíquota sobre o Brasil. No comunicado, o republicano criticava o sistema judiciário brasileiro, em especial o Supremo Tribunal Federal (STF), pelo julgamento do ex-presidente Jair Bolsonaro por suposta tentativa de golpe de estado.

Para Temer, foi ruim o envolvimento de questões políticas com a guerra comercial. “Acho possível fazer isso (negociar). Assim, termina essa especulação política que surgiu a partir disso. A especulação política foi muito acentuada.”

O ex-presidente viveu algo parecido em março de 2018, quando enfrentou o anúncio de uma sobretaxa do governo americano, justamente no primeiro mandato de Trump, de 25% sobre aço e 10 % sobre o alumínio brasileiro.

Na ocasião, o chefe da Casa Branca tratava o País como aliado e anunciou, dias depois, a suspensão da cobrança do Brasil, além de outros países, como Argentina, Canadá, México, entre outros.

Segundo Temer, só foi possível chegar ao acordo porque a sua gestão buscou o diálogo. “No meu governo, eu mantinha muito diálogo tanto interno quanto externo. E é isso que resolve tudo. O diálogo é necessário inclusive para a pacificação do País”, diz o ex-presidente. “Eu, pelo menos, fazia isso. Agora não sei como o governo Lula vai agir.”

Leia, a seguir, a entrevista de Michel Temer ao NeoFeed:

Como avalia a decisão do governo Trump em taxar em 50% os produtos brasileiros?
Eu lamentei essa decisão do governo americano de aplicar uma tarifa de 50% sobre o Brasil. E acho que isso pode ser resolvido com um bom diálogo. Espero que as diplomacias dos dois países trabalhem ativamente para tentar uma decisão. O presidente Trump já tomou decisões de aplicar tarifas sobre muitos países e depois recuou. Acho possível fazer isso. Assim, termina essa especulação política que surgiu a partir disso. A especulação política foi muito acentuada.

"A especulação política foi muito acentuada"

E o fato de envolver questão ideológica na discussão comercial?
No meu tempo como presidente, isso nunca aconteceu.

Mas dá para negociar e adotar a diplomacia quando se envolve política em temas econômicos?
Dá para negociar sim. Eu, pelo menos, fazia isso. Agora não sei como o governo Lula vai agir. Não há outro caminho. É necessário muito diálogo.

O senhor já lidou com o governo de Trump, em 2018, na questão da sobretaxa do aço e alumínio. Como foi aquele momento?
Foi na base de muita conversa. No meu governo, eu mantinha muito diálogo tanto interno quanto externo. E é isso que resolve tudo. O diálogo é necessário inclusive para a pacificação do País.

Acredita que, desde então, Trump mudou a forma de negociar?
Não consigo avaliar, à distância, a posição dele agora. Na minha gestão, eu consegui.

Se for mantido o início da cobrança para 1º de agosto, o impacto será grande na economia brasileira?
Entendo que será grande. Tenho visto que, se for mantida a tarifa, produtos como petróleo, aço, e outros itens brasileiros serão muito impactados.

Qual é a sua avaliação sobre a reação do governo Lula no primeiro momento após a publicação da carta dos EUA?
Entendo que o governo não tinha outra solução. Tinha que reagir inicialmente, invocando a soberania nacional e lamentando a decisão tomada pelos Estados Unidos. Não poderia fazer diferente.