Em dezembro de 2019, o enólogo francês Michel Friou chegou ao restaurante Président, em São Paulo, para apresentar a safra de 2017 do Almaviva, tinto ícone que ele elabora no Chile.
Em um roteiro que se repete nas grandes cidades a cada nova safra, Friou abriu algumas garrafas do Almaviva para formadores de opinião, falou das características daquele ano e harmonizou o vinho com o menu.
Mas naquela tarde, o roteiro saiu do script determinado. Na primeira garfada da terrine de campagne, as feições de Friou mudaram e ele começou a querer saber mais sobre quem era aquele chef.
“É um sabor único, perfeito, delicado”, declarou o enólogo, que por razões profissionais trocou Paris pela cidade de Santiago do Chile. “Parece que eu estou de volta à França.”
Friou não é o único a se surpreender com as receitas de Érick Jacquin. Desde que abriu as portas do Président, em dezembro, o salão do restaurante recebe um mar de celebridades.
Apenas nos últimos dez dias, José Antonio Dias Toffoli, atual presidente do Supremo Tribunal Federal; João Doria, governador de São Paulo; e o chef Henrique Fogaça passaram por lá, além de empresários e muitas famílias. Em comum, todos pedem para tirar uma foto com o chef-celebridade.
Goste-se ou não do really show de gastronomia MasterChef Brasil, o programa tem o mérito de trazer de volta ao palco o chef Érick Jacquin. Não apenas o palco televisivo, propriamente dito, com o humor e a “braveza” única deste cozinheiro francês naturalizado brasileiro. Mas também aos holofotes à frente do fogão.
Apesar de seu dom como cozinheiro, quando a primeira edição brasileira do programa foi lançado, em 2014, Jacquin era uma pessoa falida, afogada em dívidas, respondendo diversos processos trabalhistas e distante das panelas.
Foi seu sucesso com o MasterChef (e os demais subprodutos da fama, como palestras, comerciais e outros programas televisivos) que permitiu a Jacquin pagar suas dívidas (estima-se que elas superavam R$ 1 milhão) e voltar a ter um restaurante para chamar de seu. Jacquin jura que aprendeu a lição. A primeira é nunca mais lidar com a parte financeira ou de recursos humanos do negócio.
“Isso é com o meu sócio”, conta ele, depois de narrar como o gerente do banco o fez tomar empréstimos desnecessários quando ele cuidava do seu último restaurante, o La Brasserie, fechado em 2013.
O sócio atual é o empresário Orlando Leone, dono do grupo Montanna, que reúne desde uma fábrica de peças de moto na China, concessionárias Honda, também de motocicleta, e até uma importadora de vinhos.
Desde o fechamento do La Brasserie, por – acreditem – falta de clientes e também pelas dívidas, que Leone, então um cliente assíduo do cozinheiro, vinha sondando o chef para voltar à cozinha. “Ele sempre me respondia que não estava pronto. Até que, no ano passado, ele acenou com a possibilidade”, diz Leone.
O sim de Jacquin fez o empresário investir fortemente. “Foi muito dinheiro, o dobro do que eu esperava”, afirma ele, sem revelar as cifras. Na cozinha, não houve economia: equipamentos de última geração estão à disposição do chef e de sua equipe. A cozinha é aberta para o salão, e Jacquin trabalha – e brilha – em um tablado iluminado igual ao do cenário do MasterChef.
A decoração do salão aposta no vermelho, o tom de muitas brasseries francesas. Numa das paredes estão expostos diversos objetos pessoais de Jacquin, como um cardápio do Le Coq Hardy, o primeiro restaurante onde ele trabalhou no Brasil, ou uma foto do chef quando jovem, tirada para a capa de uma revista.
Em outra parede, há uma galeria com os quadros de todos os presidentes franceses. “Emmanuel Macron está no centro, mas perderá este posto na próxima eleição”, aponta Jacquin. No fundo do salão, um enorme espelho traz a sensação de amplitude ao local.
Mas é a cozinha que ditará o sucesso do empreendimento. Os sócios de Jacquin em projetos anteriores sempre questionaram o valor pago em alguns ingredientes e a cozinha de Jacquin é recheada de foie gras, vieiras, caviar e trufas. Eles integram a corrente de que um bom chef raramente é um bom administrador e são raros os que sabem calcular o custo de um prato.
Leone jura que não vai abrir mão da qualidade e no cardápio é possível escolher a terrine de foie gras de pato (R$ 160) ou ovo mexido dentro da casca com caviar (R$ 140), por exemplo. “O chef define os ingredientes e eu negocio com os fornecedores”, afirma Leone. E ele garante que a conta vai fechar. Primeiro pela casa cheia. “Todos os dias, não conseguimos atender pelo menos 30 pessoas”, diz ele.
O segundo ponto, diz Leone, é que ele não pensa em um retorno rápido. “Os meus negócios costumam dar retorno em até três anos, mas sei que no Président será um pouco mais, como quatro ou cinco anos.” A conferir.