Fundador e CEO do Twitter, Jack Dorsey lançou, em 2009, a Square, uma plataforma de serviços financeiros capaz de "transformar" um smartphone em uma maquininha de cartões.
Ao ampliar o leque de possibilidades para milhares de vendedores, inclusive informais, a então nova empreitada de Dorsey fez brilhar os olhos dos investidores.
Sequoia Capital, JP Morgan, Goldman Sachs e Kleiner Perkins foram alguns dos nomes que injetaram recursos logo nos primeiros passos da empresa. No total, a companhia atraiu US$ 590,5 milhões em aportes, antes de abrir capital, em novembro de 2015.
Parte desse sucesso na largada foi atribuída ao "pedigree" de seu fundador, que carregava no currículo a fama conquistada com a rede de microblog. No comando de ambas as empresas, Dorsey fez as duas crescerem – mas de uma forma um tanto desproporcional.
Quando fez seu IPO, a Square foi avaliada em US$ 2,9 bilhões. Hoje, seu valor de mercado é quase dez vezes maior - US$ 28,4 bilhões.
Já o Twitter, que fez sua estreia em Wall Street em 2013, com um valor de mercado de US$ 24,6 bilhões, atualmente está avaliado em US$ 23,6 bilhões.
Há quem entenda que essa diferença esteja ligada à dedicação de Dorsey, diretamente proporcional às suas participações nas duas operações: ele detém 13% dos papéis da Square e apenas 2% das ações do Twitter. E embora alegue que, como bom pai, não faça distinção entre suas "crias", os investidores não têm tanta certeza desse amor incondicional e igualitário.
Antes de abrir capital, em 2015, a Square captou US$ 590,5 milhões junto a investidores como Sequoia Capital, JP Morgan e Goldman Sachs
A desconfiança é um reflexo direto do balanço apresentado pelas empresas. Enquanto a Square comemora o salto de 43% em sua receita, que bateu a marca de US$ 4,7 bilhões em 2019, o Twitter tem de se contentar com o crescimento de 14% no mesmo indicador – que chegou a US$ 3,46 bilhões.
Com uma base de 24 milhões de usuários ativos mensais, que pagam uma taxa de 2,6% mais US$ 0,10 por transação, a Square conseguiu reverter o prejuízo de US$ 38 milhões registrado em 2018, ao reportar um lucro líquido de US$ 375 milhões no ano passado, acima do esperado.
As expectativas da empresa foram superadas graças ao Cash App, um aplicativo de pagamento direto que faz frente aos poderosos Google Pay, Apple Pay e Venmo, do PayPal. O grande diferencial da aposta da Square é que, além das transações financeiras básicas entre clientes, o app permite que os usuários invistam pequenas quantias – como o Robinhood –, e que movimentem bitcoins, função inédita entre os principais concorrentes.
Mas nem tudo são flores no caminho da Square, mesmo com o Cash App como "carta na manga". O analista Moshe Katri, da agência de análise de risco Wedbush, disse ao NeoFeed que a desaceleração da economia global deve se tornar uma dor de cabeça para Dorsey.
"O encolhimento do mercado provavelmente vai resultar em um número menor de transações de valores", afirmou Katri. "Não bastasse isso, a Square tem de se preocupar ainda com o aumento da competição, sobretudo de grandes empresas de tecnologia."
Para o analista, contudo, a liderança de Dorsey está prestes a ser colocada à prova, uma vez que os próximos resultados serão decisivos para a manutenção da vaga do executivo – tanto na Square, quanto no Twitter.
Na berlinda
A rede de microblog, por sua vez, apurou lucro de US$ 1,47 bilhão em 2019. E alega que o resultado teria sido melhor, não fosse a contratação de 900 profissionais, o que elevou o quadro de funcionários para 4,8 mil pessoas.
Apesar disso, a base de usuários da rede de microblog seguiu, basicamente estacionada, reforçando o histórico de pouca evolução nesse indicador. A empresa fechou 2019 com 330 milhões de contas ativas. Mas, desde 2015, "patina" na marca de 300 milhões de usuários.
Embora seja reconhecido por seu engajamento, mais do que pelo tamanho de sua audiência, o Twitter viu seus principais concorrentes dispararem. O chinês Tik Tok, lançado em 2016, com foco em vídeos de curta duração, bateu a marca de 1,5 bilhão de downloads em novembro passado.
Ao fechar 2019 com 330 milhões de contas ativas, o Twitter reforçou seu histórico de pouca evolução em sua base de usuários
Com uma taxa de crescimento mensal de 6%, segundo o Business Insider, a rede chinesa tem performado melhor que o Instagram, um dos principais players desse mercado de mídias sociais.
Para tentar decolar nesta seara, o Twitter colocou no ar a sua própria versão dos "stories" – vídeos curtos, que são apagados automaticamente depois de 24 horas. A resposta dos usuários e do mercado não foi boa.
Com 4% dos papéis do Twitter, o fundo Elliott Management Corp, liderado pelo investidor ativista Paul Singer, tem sido enfático nos questionamentos à dedicação de Dorsey. E, durante muito tempo, defendeu a sua substituição no comando da rede de microblog.
A queda-de-braço entre o executivo e seus investidores teve fim no início desta semana. Para manter as duas companhias sob suas asas, Dorsey teve de aceitar condições agressivas imposta pelos acionistas.
Até o fim do ano, ele terá de consolidar um crescimento de 20% na base de usuários do Twitter. Além de aumentar a receita da companhia, ao mesmo tempo em que avança no mercado da publicidade digital.
A preocupação dos investidores parece não refletir ou incomodar a posição de Dorsey, que declarou, dias atrás, durante uma conferência organizada pelo banco Morgan Stanley, que tem "flexibilidade o bastante para focar nas questões mais importantes", acrescentando ainda que sabe distinguir as urgências de cada negócio.
Mas o discurso apaziguador parece não enganar estudiosos como Scott Galloway, professor da Universidade de Nova York. O docente destaca o fato de que, como parte do acordo, o fundo de investimento Silver Lake vai aportar US$ 1 bilhão no Twitter. Ele ressalta que companhia "não compra ações de empresas de tecnologia, ela as torna privadas de novo".
Isso significa que, na aposta de Galloway, "esse foi o primeiro passo para o fim". Coincidentemente ou não, o acordo que garante a manutenção de Dorsey como CEO também estabelece que o Twitter recompre US$ 2 bilhões em ações.
O Twitter deve ainda indicar três novos diretores ao seu conselho e criar um comitê que revisite a liderança e governança na empresa.
Se no microblog a pressão dos investidores deixa Dorsey com as rédeas curtas, na Square, o próprio mercado se encarrega dessa função. Resta saber agora se, em meio período, o executivo vai conseguir entregar o prometido – e o combinado.
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