A recuperação da economia da China em 2023 começou a acelerar antes e com mais força do que o previsto, conforme revelam indicadores sobre o mês de fevereiro divulgados na quarta-feira, 1º de março. O anúncio repercutiu positivamente na Bolsa de Hong Kong (que fechou com alta de 4,2%) e nas bolsas asiáticas e europeias.
Embora seja uma boa notícia para a economia global, economistas advertem que a retomada chinesa pode impactar na política monetária de combate à inflação dos Estados Unidos e da União Europeia. Esse efeito colateral é provável devido ao aumento inesperado das exportações chinesas.
De acordo com o Escritório Nacional de Estatísticas (NBS), o índice PMI da indústria chinesa subiu de 50,1 pontos em janeiro para 52,6 pontos no mês passado, o maior aumento desde 2012. O setor de serviços também avançou. Uma leitura acima de 50 pontos do PMI aponta para expansão da atividade econômica, enquanto abaixo desse nível indica contração.
Outros setores - construção, fabricação de móveis, produtos de metal e equipamentos de máquinas elétricas - registraram aumentos acima de 60 pontos.
A expansão econômica em fevereiro levou analistas a projetar um aumento do PIB chinês em 2023 de até 6%, muito acima da média anteriormente prevista, entre 5% e 5,5% - em 2022, a China registrou 3% de crescimento.
De acordo com Francisco Nobre, economista da XP, a divulgação do PMI é importante por trazer os indicadores mais consolidados da economia desde que o governo chinês abrandou a política de tolerância zero da Covid, em janeiro.
“O PMI mostra que a abertura está surtindo efeito, reforçando a percepção de que a retomada vai ser expressiva e rápida”, diz Nobre.
Exportações na mira
A recuperação econômica da China estava prevista para decolar a partir do segundo trimestre, com ênfase nos setores de consumo e infraestrutura.
O aumento de exportações, que em fevereiro registraram índice positivo após dois anos de queda, por causa da contração econômica global, ligou o alerta nos dois lados do Atlântico.
O fraco crescimento chinês em 2022 vinha ajudando a reduzir a inflação nos EUA e no bloco europeu, que adotaram uma política de juros elevados para esfriar a economia.
O economista José Júlio Senna, pesquisador do FGV Ibre, observa que a diminuição da inflação nos últimos meses teve a ver com a queda dos preços de bens físicos, que subiram muito durante a pandemia, por causa do gargalo de produção e das cadeias produtivas.
Com o fim da pandemia, as famílias passaram a consumir serviços, o que se refletiu na queda da inflação. A retomada chinesa, com ampliação de exportações, deve mudar o quadro.
“A redução da inflação pode ser revertida e dificultar o trabalho do banco central dos EUA e do BCE (Banco Central Europeu) de trazer a inflação para o centro da meta”, afirma Senna.
A preocupação é maior porque a inflação já voltou a crescer nos EUA e em países da Europa, como Espanha, França e Alemanha, segundo dados divulgados nos últimos dias.
De acordo com Nobre, da XP, uma reabertura chinesa expressiva deverá aumentar os preços de commodities, em especial do petróleo – o Brasil seria beneficiado pela exportação de grãos.
Mas para EUA e zona do euro, segundo Nobre, o cenário não é favorável. “Vários indicadores apontam na mesma direção: os BCs deverão manter os juros elevados e por mais tempo.”