Se o México é citado com frequência pelos empreendedores brasileiros como um destino óbvio para a internacionalização dos negócios de suas empresas – seja pelo tamanho do mercado ou pela proximidade com os Estados Unidos –, um movimento contrário também está ocorrendo com cada vez mais frequência.
A Jeeves é a prova mais recente disso. Fintech americana que começou suas operações no México e opera com uma plataforma de gestão de gastos corporativos voltada principalmente para startups, a companhia está desembarcando no País nesta terça-feira, 22 de março. E chega por aqui endinheirada, já que anuncia, também uma nova captação.
Descrita como uma plataforma “all-in-one”, a Jeeves desembarca no Brasil após receber US$ 180 milhões numa rodada Série C liderada pela Tencent. Com a injeção de capital, a fintech, que já havia captado US$ 188 milhões em rodadas anteriores, passa a ter um valor de mercado de US$ 2,1 bilhões.
O aporte teve ainda a participação de investidores como GIC (fundo soberano de Cingapura), Andreessen Horowitz, CRV, Silicon Valley Bank, FT Partners, Clocktower Ventures, Urban Innovation Fund, Haven Ventures, Gaingels, Spike Ventures. Também participaram da rodada alguns family offices de fundadores de empresas como Facebook, Apple, Amazon, Netflix e Google.
A chegada ao Brasil marca um passo importante para a companhia ganhar mais terreno na América do Sul, dado o tamanho do mercado local. “O Brasil tem o potencial para ser o segundo ou até o maior mercado para a Jeeves”, afirma Dileep Thazhmon, CEO e cofundador da Jeeves junto de Sherwin Gandhi, em entrevista para o NeoFeed.
Por isso, a estratégia adotada para a operação em solo brasileiro contempla uma estrutura mais robusta. "Temos 50 pessoas trabalhando no México e prevemos um número maior de funcionários no Brasil", diz Thazhmon. Ao todo, a Jeeves conta com pouco mais de 150 funcionários.
Fundada em 2019, a Jeeves é mais conhecida por seu cartão de crédito corporativo (que tem cashback de até 4%), mas que representa apenas algo em torno de 45% do negócio. "O restante vem das operações sem cartão", afirma Thazhmon. Pagamentos e transferências sem cartão e soluções de empréstimos fazem parte deste portfólio.
Para ganhar dinheiro, a fintech trabalha com juros cobrados nos produtos de crédito, cuja alíquota varia de acordo com o valor disponibilizado. Não há cobrança de assinatura ou de anuidade pelo uso dos cartões.
O modelo de negócio vem dando resultado. A empresa não revela dados de receita, mas diz que houve um aumento de 900% desde a série B, em setembro do ano passado. A companhia também informa que, em apenas 11 meses de operação, conseguiu ultrapassar US$ 1 bilhão em volume anual de transações (GVT).
Ao longo dos últimos anos, a fintech estabeleceu uma operação com serviços em 23 países, de três continentes diferentes. Entre os principais mercados em que opera estão Colômbia, Chile, Peru, Canadá, Reino Unido e Europa. Ao todo são mais de 3 mil empresas atendidas no mundo.
O cliente mais conhecido é a Kavak, startup que opera com uma plataforma de compra e venda de carros usados. No ano passado, após uma captação de US$ 700 milhões, a empresa atingiu valor de mercado superior a US$ 8,7 bilhões, tornando-se uma das startups mais valiosas da América Latina.
Por aqui, a operação terá início, de fato, entre os meses de maio e junho, com a oferta de produtos de crédito para facilitar principalmente operações de capital de giro. Ao longo do ano, a Jeeves pretende disponibilizar os cartões, os serviços de remessas entre países e soluções de pagamentos por PIX, TED e boleto dentro da plataforma.
Obstáculos brasileiros
A competição no Brasil promete ser acirrada e, de certa forma, pouco surpreendente para a Jeeves. Isso porque uma das principais rivais que a companhia vai encontrar por aqui já é uma velha conhecida: a Clara, fintech que também começou suas operações em solo mexicano e que já captou mais de US$ 158 milhões em investimentos.
Jeeves e Clara tentam capturar um mercado que ainda não foi explorado por uma das gigantes deste setor, a Brex. Fundada no Vale do Silício pelos brasileiros Pedro Franceschi e Henrique Dubugras e avaliada em US$ 12,3 bilhões, a companhia que tem como clientes empresas como Deel, Airbnb, Classpass, entre outras, ainda não desembarcou no Brasil.
Já os bancos digitais não são vistos como rivais. “Eles oferecem serviços diferentes e focam em contas digitais gratuitas, mas sem oferecer crédito. Ou, quando oferecem, o acesso é complexo”, diz Fernando Torres, líder de operações da Jeeves no Brasil.
O que pode dificultar um pouco é o momento fiscal que o País atravessa. Na semana passada, o Comitê de Política Monetária (Copom) aprovou o 9º aumento consecutivo da taxa básica de juros, a Selic, com o reajuste de 1 ponto percentual para 11,75%.
“A taxa de juros encarece os produtos de crédito”, afirma Torres. "Toda e qualquer operação de crédito, a menos que seja subsidiada, vai sofrer com o aumento da taxa de juros.”