LONDRES - Um dos edifícios britânicos mais importantes do século XX está prestes a renascer como um dos hotéis mais luxuosos (e caros) de Londres. Comprado pela rede hoteleira Raffles por £ 350 milhões em 2016, o C, prédio que no passado abrigou o gabinete de guerra do Reino Unido, será aberto ao público na primavera (entre março e junho), após uma reforma de cinco anos que custou mais de £ 1 bilhão.
É a primeira vez que civis poderão entrar e se hospedar no icônico endereço onde muitas das decisões que mudaram os rumos da história foram tomadas. Até ser vendido em 2016, o edifício do Old War Office, conhecido pela abreviação OWO, era propriedade do governo britânico e só autoridades oficiais podiam circular por seus corredores, salas e suítes.
Durante a Segunda Guerra Mundial, o então primeiro-ministro Winston Churchill escrevia seus discursos e delegava ofensivas contra a Alemanha nazista diretamente de uma mesa localizada no gabinete principal do prédio que reabrirá como hotel.
Localizado na Whitehall Street, que concentra diversos prédios públicos, o The OWO é vizinho do Palácio de Buckingham, da praça Trafalgar Square e da Downing Street, onde fica a residência oficial do primeiro-ministro britânico. A região possui um dos metros quadrados mais cobiçados de Londres e abriga alguns dos hotéis mais caros da cidade, como os superluxuosos Ritz, Brown´s e Claridge's.
O The OWO foi inaugurado em 1906 e serviu como gabinete de guerra até 1964, quando o órgão foi transferido para o Ministério da Defesa. Durante esse período, o prédio foi a principal base de articulação das operações de guerra inglesas, e chegou a ser bombardeado pela Alemanha entre 1940 e 1941, mas resistiu.
Ian Fleming, escritor que inventou o personagem James Bond, trabalhou como oficial de inteligência naval no prédio. Fleming teria tido a ideia de criar o agente 007 se inspirando no que acontecia no antigo gabinete de guerra.
O prédio apareceu em vários filmes da franquia de James Bond, incluindo Operação Skyfall (Skyfall), 007 contra Spectre (Spectre), Permissão para Matar (License to Kill), 007 na mira dos assassinos (A View to a Kill), 007 contra Octopussy (Octopussy) e, mais recentemente, 007 Sem tempo para Morrer (No Time To Die).
“Pela primeira vez, o público poderá experimentar este edifício histórico e icônico. Este é um momento emocionante para a marca”, diz Philippe Leboeuf, gerente do hotel The OWO Londres, em entrevista ao NeoFeed. O empreendimento será o primeiro hotel do grupo Raffles Hotels & Resorts no Reino Unido.
A rede Raffles foi fundada em Cingapura em 1887 e tem forte presença na Ásia, com hotéis de luxo na Índia, China, Indonésia, Filipinas, Camboja e, claro, Cingapura. A marca também está presente em outros destinos como Qatar, Dubai, Maldivas e ilhas Seychelles. Na Europa, a rede já fincou a bandeira na França, Polônia e Turquia.
Quando abrir as portas, o The OWO terá 120 novas suítes espaçosas e sofisticadas à disposição de hóspedes exigentes que visitam Londres. Os apartamentos principais ficam nos cômodos mais históricos do edifício, que no passado eram os escritórios de ex-primeiros-ministros como Winston Churchill, Herbert Asquith e David Lloyd George.
Como não poderia ser diferente, os quartos serão batizados com o nome dos políticos. Que tal tomar um chá das cinco perto da lareira favorita de Churchill, com vista para a London Eye? É essa a proposta do Raffles.
Além do braço hoteleiro, o grupo Raffles colocou à venda 85 residências particulares que poderão ser acessadas por entradas privativas do The OWO. No passado, essas mesmas portas eram usadas pelos espiões da M16, a agência britânica de inteligência, para entrar no gabinete de guerra com descrição.
O preço para adquirir a residência de dois quartos é £ 5,8 milhões. Já quem optar por uma das duas coberturas disponíveis (essas, com vistas impressionantes do St. James Park, algo parecido com a visão que a monarquia britânica tem das janelas do Palácio de Buckingham) terá que desembolsar pelo menos £ 40 milhões.
Entre a compra e reforma do prédio do antigo gabinete de guerra inglês, o investimento de mais £ 1 bilhão no The OWO foi feito pelo grupo indiano Hinduja, empresa familiar privada que possuí investimentos em diversas áreas, que vão do petróleo à hospitalidade. No ano passado, os Hinduja apareceram como a família mais rica do Reino Unido no The Sunday Times, com £ 28,5 bilhões de patrimônio.
“A família Hinduja se comprometeu com a restauração meticulosa do edifício desde sua aquisição em 2016”, explica Leboeuf, o gerente do hotel. “O projeto é uma paixão para a família. Eles são guardiões do edifício, trabalhando em colaboração com organizações patrimoniais, incluindo o Westminster City Council e o governo do Reino Unido, bem como um pequeno exército de artesãos locais altamente qualificados e curadores de arte envolvidos na restauração do prédio.”
O designer escolhido para repaginar o antigo edifício, originalmente projetado pelo arquiteto britânico William Young, foi o francês Thierry Despont, referência mundial em design de interiores de luxo e restauração de prédios e monumentos históricos. Na década de 1980, Despont foi o responsável pelo restauro da Estátua da Liberdade.
O grupo Raffles manteve o estilo arquitetônico original do The OWO, o barroco Eduardiano, com muitos arcos, pavilhões cupulados altíssimos e detalhes manuais na fachada. Centenas de artesãos foram contratados para restaurar os elementos históricos do interior, incluindo pisos de mosaico, painéis de carvalho, lustres e uma escadaria de mármore que fica na entrada do hotel.
O The OWO promete se tornar um novo refúgio da alta gastronômica na Inglaterra, com 11 restaurantes liderados por chefs premiados e três bares. O restaurante principal será comandado pelo chef ítalo-argentino Mauro Colagreco, que conquistou 3 estrelas Michelin à frente do francês Mirazur.
Além da casa que será dirigida pelo chef estrelado, o The OWO já confirmou outros dois restaurantes internacionalmente reconhecidos pela qualidade gastronômica. De Milão, desembarcará em Londres o Paper Moon, sofisticado restaurante inaugurado em 1977.
Presente em Istambul, Doha, Algarve e Hong Kong, o Paper Moon aposta na cozinha italiana contemporânea, com pratos como ravióli recheado com queijo burrata e camarão-vermelho cru e tomate-cereja confitado.
Da França, o Laperouse também fará estreia na capital inglesa. Ficará localizado no pavilhão principal do hotel, levando a cozinha clássica francesa para até 80 hóspedes simultaneamente.
Para atender a crescente demanda por hospitalidade wellness, o The OWO também sediará o primeiro spa da marca de cosméticos francesa Guerlain. O Spa terá quatro andares e trará serviços de bem-estar personalizados, com nove salas de tratamento, incluindo barbeiro e salão, espaços de tratamento de beleza e butique da marca Guerlain.
Se hospedar nesse pedaço da história terá um preço: as diárias começam em £ 1.100. Sem café da manhã incluso. “Como um dos edifícios históricos mais emblemáticos de Londres, com 'paredes que sussurram', o OWO será diferente de qualquer outro hotel do mundo”, diz Leboeuf.