Durou pouco a expectativa de que o ciclo de aumentos da taxa de juros nos Estados Unidos tivesse chegado ao fim.
Dois dias depois de o Federal Reserve (Fed, o banco central dos EUA) decretar um aumento de 0,25 ponto percentual nos juros, num esforço de baixar a inflação, o governo americano anunciou nesta sexta-feira, 5 de maio, que a taxa de desemprego no país em abril caiu para 3,4%, o índice mais baixo desde 1969.
A notícia indica que a economia americana ainda está longe de apresentar uma trajetória consistente de retração da atividade, condição essencial para trazer a inflação (de 5% em março) para próximo da meta estabelecida pelo Fed, de 2%.
O mercado de trabalho aquecido, particularmente no setor de serviços, tem efeito importante na inflação. O aumento do emprego foi particularmente relevante nos serviços profissionais e empresariais, enquanto as contratações nos setores de saúde, lazer e hotelaria também cresceram fortemente.
Além do baixo índice de desemprego, outro dado que chamou a atenção - e deve impactar na inflação - foi o crescimento do salário por hora nos EUA, que aumentou 0,5% em abril em relação ao mês anterior e 4,4% na série anual. Neste sentido, economistas começam a colocar em dúvida a possibilidade de o Fed começar a cortar juros, como estava sendo esperado.
Outro sinal que reforça essa desconfiança foi a procura maior do mercado financeiro por títulos do Tesouro, que costuma acompanhar as expectativas das taxas de juros. Logo após o anúncio do desemprenho do mercado de trabalho, a cotação dos títulos aumentou. O movimento indica que os traders do mercado futuro também reduziram as apostas nos cortes nos juros.
Economia com problemas
Parte da surpresa dos especialistas em relação ao desempenho do mercado de trabalho se deve ao cenário turvo da economia dos EUA. Além da inflação elevada, os americanos estão lidando com a maior taxa de juros em 16 anos - que oscila na faixa entre 5,0% e 5,25% ao ano -, uma crise bancária envolvendo instituições de médio e pequeno porte e um pífio desempenho do mercado acionário.
Outros indicadores alimentam as previsões de que a desaceleração econômica poderia levar o país a uma possível recessão no final do ano. O Produto Interno Bruto dos EUA aumentou apenas 1,1% no primeiro trimestre, em grande parte devido a uma redução nos estoques, embora haja sinais de que os gastos do consumidor estão enfraquecendo. As despesas com cartão de crédito, por exemplo, caíram 0,7% em relação ao ano anterior, de acordo com o Bank of America.
Foi com esses dados em mente que o presidente do Fed, Jerome Powell, reconheceu na quarta-feira que as taxas de juros mais altas estão pressionando as famílias. “A economia provavelmente enfrentará mais ventos contrários devido às condições de crédito mais restritivas”, disse, acrescentando que no momento, a prioridade é reduzir a inflação. “Felizmente, conseguimos fazer isso até agora sem aumentar o desemprego.”
Para William Castro Alves, estrategista-chefe da Avenue, corretora digital com sede nos EUA, a resiliência do mercado de trabalho americano indica que a queda de juros pode demorar. “O mercado de trabalho parece ainda muito longe daquilo que o Fed entende como ideal para colaborar no controle a inflação, em especial no que se refere a salários”, afirma Alves.
A autoridade monetária americana ainda terá uma chance para decidir o que fazer com os juros: o próximo relatório de emprego será divulgado antes da reunião de 13 e 14 de junho do Fed.