A discussão no Brasil sobre uma revisão da meta de inflação e pressão do governo pela queda da taxa básica de juros, hoje em 13,75%, passa longe do debate entre o Federal Reserve (Fed), o banco central do Estados Unidos, e o mercado financeiro americano.

Nos EUA, o Fed está deixando claro que vai manter sua política de juros altos por mais tempo que o previsto, incluindo a possibilidade de novos aumentos - revertendo a expectativa recente do mercado de financeiro, que apostava num “pouso suave”, ou queda dos juros já neste primeiro semestre.

Após novos indicadores confirmarem um aquecimento da economia americana, o mercado financeiro já admite que o aperto monetário está longe do fim.

Parte do otimismo inicial do mercado financeiro foi alimentado com a queda da inflação nos EUA, que saiu de um pico de 9,1% em junho para 6,4% em janeiro, mas ainda longe da meta de 2% estabelecida pelo banco central americano.

Essa redução foi possível graças a uma política de juros agressiva do Fed, que elevou a taxa de quase zero há um ano para a atual faixa entre 4,5% e 4,75%, o maior e mais rápido aumento em 40 anos.

O mercado entendeu que a trajetória de queda da inflação estava consolidada – o que abriria caminho para a redução dos juros. Esse otimismo ajudou os títulos e ativos de risco, como ações, a decolar no início do ano.

Faltou, porém, combinar com o desempenho da economia americana e com o Fed. Novos dados divulgados na semana passada mostram que as vendas no varejo registraram seu maior ganho mensal em quase dois anos. Além disso, os preços ao consumidor e ao produtor subiram mais do que os economistas esperavam em janeiro.

Para fechar o quadro, o mercado de trabalho continua aquecido, com 500 mil vagas abertas em janeiro – a taxa de desemprego caiu em janeiro para seu nível mais baixo em 53 anos.

Trocando em miúdos, a inflação deverá permanecer mais tempo longe da meta estipulada pelo Fed. E, diferentemente do Brasil, ninguém discute nos EUA mexer na meta.

“Desinflação imaculada”

A ironia é que, a despeito dos sinais desde o fim do ano, os mercados financeiros alimentaram a esperança de uma “desinflação imaculada” – expressão cunhada por Paul Krugman, vencedor do Nobel de Economia e colunista do The New York Times, para descrever a esperança de o país domar a inflação sem aumento do desemprego ou de recessão, contrariando a estratégia do Fed.

“Mais alto por mais tempo” tornou-se o mantra não oficial do Fed não apenas em relação às taxas de juros como para a inflação. Até que a inflação caia muito mais acentuadamente, a taxa de juros de curto prazo controlada pelo banco central também não cairá.

O mercado parece ter captado a mensagem. O S&P 500 caiu 0,3% na semana passada, reduzindo seus ganhos no ano para 6,2%. O Deutsche Bank AG nos EUA revisou sua previsão para o pico da taxa de juros em julho de 5,1% - antes dos dados da semana passada - para 5,6%.

Os traders de títulos também têm precificado taxas de juros mais altas. Os mercados de derivativos mostram que os analistas esperam que a taxa atinja um pico de cerca de 5,25% em agosto, de acordo com a FactSet. Por outro lado, no início do mês, eles apostavam que os juros atingiriam um pico de cerca de 4,88% em junho.

“Uma taxa de juros mais alta definitivamente arrastaria os ativos de risco e aumentaria a probabilidade de uma recessão”, disse Brett Ryan, economista sênior do Deutsche Bank nos EUA.