Confirmando as expectativas do mercado e expondo uma divisão inédita entre seus integrantes, o Comitê de Política Monetária (Copom) do Banco Central (BC) decidiu nesta quarta-feira, 8 de maio, por 5 a 4, diminuir o ritmo de queda da taxa de juros que vinha adotando desde agosto, quando teve início o atual ciclo.

O corte anunciado de 0,25 ponto percentual (pp) dos juros – ante a redução de 0,50 pp nas seis reuniões anteriores do órgão – trouxe a taxa Selic para o patamar de 10,50% ao ano.

O placar final da reunião do Copom expôs uma divisão que não vinha ocorrendo desde o início do atual ciclo no ano passado, já com a entrada de dois novos integrantes para o órgão, nomeados pelo governo federal: economista Gabriel Galípolo (ex-secretário-executivo da Fazenda e ex-braço direito do ministro Fernando Haddad) e Ailton Aquino dos Santos, funcionário de carreira do BC.

O presidente do Banco Central, Roberto Campos Neto, puxou a fila dos integrantes do Copom que votaram pela redução do ritmo de queda dos juros para 0,25 pp. Ele foi acompanhado pelos diretores Carolina de Assis Barros; Diogo Abry Guillen; Otávio Ribeiro Damaso e Renato Dias de Brito Gomes.

Além de Galípolo e Aquino dos Santos, votaram a favor da manutenção da redução dos juros em 0,50 pp os diretores Paulo Picchetti e Rodrigo Alves Teixeira

De acordo com Roberto Padovani, economista-chefe do Banco BV, o corte de 0,25 pp era esperado pelo mercado e faz sentido, embora defendesse um corte de 0,50 pp. No entanto, ele destaca a divisão do Copom na votação do índice de corte.

“O fato de os quatro integrantes do Copom que votaram pela manutenção de corte de 0,50 pp serem alinhados ao governo federal revela as diferenças em relação ao próximo Banco Central”, diz Padovani.

O mandato de Campos Neto como presidente do BC, o primeiro a exercer o cargo com independência, termina em dezembro deste ano. E o próximo presidente do banco será indicado pelo presidente da República, Luiz Inácio Lula da Silva.

Luis Otávio Leal, economista-chefe da gestora G5 Partners, diz que a maior surpresa da votação ficou com o voto de Paulo Piccheti, visto como conservador pelo mercado.

“No comunicado, a ênfase ficou toda na questão da desancoragem das expectativas de inflação, nos últimos 2 parágrafos esse tema é citado quatro vezes”, afirma Leal, observando que a questão fiscal foi colocada no tom adotado por Roberto Campos nas suas últimas aparições: quanto mais frouxa for a política fiscal, mais apertada vai ter que ser a política monetária.

Com relação às indicações futuras, o comunicado do Copom deixou tudo em aberto ao afirmar que “o Comitê também reforça, com especial ênfase, que a extensão e a adequação de ajustes futuros na taxa de juros serão ditadas pelo firme compromisso de convergência da inflação à meta”.

Fatores

Na ata da última reunião, em 19 e 20 de março, o Copom chegou a sinalizar uma redução da Selic “da mesma magnitude”(0,50 pp) para o encontro deste mês. Desde então, a possibilidade de alterar o ritmo de cortes começou a ser considerada por uma série de fatores conjunturais.

A princípio, pesaram a decisão do governo brasileiro, anunciada em abril, de adiar para 2025 a meta de zerar o déficit fiscal, antes prevista para dezembro, aliada à demora do Federal Reserve (banco central dos Estados Unidos) de começar a baixar os juros nos EUA, por causa da inflação e do mercado de trabalho resilientes no país.

Nos últimos dias, a aposta de a autoridade monetária adotar uma postura mais conservadora ganhou força por uma nova combinação de indicadores.

Na segunda-feira, 6 de maio, o Boletim Focus trouxe a nova projeção do mercado, que voltou a elevar a projeção de inflação para 2025, em 3,6% - distanciando-se da meta prevista, de 3%, tanto para 2024 e 2025.

Na opinião de analistas, a convergência da inflação para a meta é o foco principal do BC, o que justificaria a redução no ritmo de corte da Selic.

Os efeitos causados pelas enchentes no Rio Grande do Sul também começaram a entrar no radar, pois além dos prejuízos com perda de parte da safra de arroz e soja, a destruição de infraestrutura gaúcha em vários dos mais de 300 municípios atingidos pelas cheias deverá exigir um grande volume de recursos do governo federal para recuperar o estado.

Leal, da G5 Partners,  prevê uma reação negativa do mercado amanhã, principalmente na parte intermediária e longa da curva. Segundo ele, uma decisão mais conservadora já estava “no preço”, de modo que o que vai ficar marcado nessa decisão é a divisão “certinha” entre os escolhidos por Bolsonaro e os escolhidos por Lula.

“Como os últimos foram mais dovish (com abordagem mais amena com a inflação) e serão maioria no ano que vem, o raciocínio linear do mercado será: o BC será mais dovish em 2025”, diz o economista da G5. “Isso vai afastar cada vez mais o BC do seu objetivo de reancorar as expectativas de inflação e não por causa da trajetória atual de juros, mas por causa da futura, variável que essa diretoria do BC não controla.”