O Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE) divulgou na terça-feira, 5 de dezembro, os dados do Produto Interno Bruto (PIB) do País no terceiro trimestre, que trazem uma surpresa e uma constatação.

A surpresa foi o crescimento da economia de 0,1% no terceiro trimestre, na comparação com o trimestre anterior. O índice ficou longe da previsão de queda de 0,2% esperada pelo mercado, com retração menor da agropecuária e resiliência do setor de serviços.

Por outro lado, os dados divulgados pelo IBGE reforçam uma certeza que tem se repetido desde o início da pandemia, em 2020: a incapacidade de economistas e do mercado em geral em acertar as previsões de crescimento do PIB, seja nos índices anuais ou trimestrais.

Para se ter uma ideia, em janeiro, as previsões de crescimento do PIB em 2023 variavam entre 0,8% e 1%, enquanto a tendência é a economia do País fechar o ano com 3% de expansão.

O próprio presidente do Banco Central, Roberto Campos Neto, admitiu logo após o anúncio do PIB que, “nós, economistas, erramos muito as projeções, especialmente de crescimento econômico”, e ironizou os palpites errados da categoria: “A melhor forma de levar o nome à ruína é pedir conselho de economista.”

O presidente do BC atribuiu as previsões equivocadas sobre o crescimento do PIB ao efeito coletivo de todas as reformas que foram feitas nos últimos anos.

“As reformas fizeram com que o crescimento estrutural tenha subido um pouquinho. Os erros de previsão estão associados aos efeitos coletivos dessas reformas”, disse Campos Neto, durante almoço da Frente Parlamentar do Empreendedorismo (FPE).

Roberto Padovani, economista-chefe do Banco BV e um dos especialistas que vinham reconhecendo as falhas nas previsões do PIB brasileiro desde 2020, diz que, no caso do terceiro trimestre, embora tenha surpreendido, o índice de 0,1% se enquadra num quadro onde houve revisão da série histórica do PIB e outros ajustes sazonais.

“Houve demanda doméstica forte, com os serviços do lado da oferta e o consumo do lado da demanda respondendo por essa força do PIB e ajudando a compensar o desempenho mais fraco de alguns setores, principalmente de investimentos”, afirma Padovani.

Quanto aos erros seguidos dos economistas, o economista-chefe do BV cita fatores conjunturais e estruturais. Entre eles, a intensidade dos estímulos que foram dados pelos governos de vários países durante a pandemia.

“Nunca havíamos visto uma expansão fiscal e monetária tão elevadas e simultâneas no mundo inteiro”, diz Padovani. “Agora que os estímulos estão sendo retirados, a tendência é voltar à normalidade.”

Previsões erradas

No caso do Brasil, ele destaca o choque causado pela expansão do agronegócio. “Talvez uma mistura de fator conjuntural com estrutural, com o Brasil ganhando espaço nos mercados internacionais de forma permanente”, acrescentou, citando ainda o mercado de trabalho aquecido (tendência mundial que se repete no Brasil) e a expansão fiscal do atual governo.

Padovani, no entanto, faz coro com Campos Neto sobre o peso das reformas econômicas feitas entre 2016 e 2021. Segundo ele, essas reformas causaram um impacto que os economistas ainda não conseguiram dimensionar.

Ele cita, por exemplo, o marco regulatório do saneamento, que atraiu investimentos do mercado de capitais; a reforma trabalhista, por formalizar mão-de-obra temporária e reduzir a incerteza jurídica, além da reforma da previdência e até a autonomia do Banco Central.

“São reformas que causaram impacto na produtividade e na competitividade da economia, mas de difícil mensuração, certamente esse combo levou os economistas a errarem as previsões do PIB a partir de 2020”, sugeriu.

Padovani acredita que, a partir de 2024, será possível fazer estimativas mais plausíveis. Segundo ele, não haverá mais choque agrícola favorável, o PIB tende a estagnar e o mercado de trabalho, impulsionar menos a economia.

Além disso, ele prevê mais restrições para o governo aumentar os gastos públicos. “Quando se tira esses fatores que impulsionam a economia, o que sobrar em 2024 serão os efeitos das reformas, por isso teremos esse grande teste no ano que vem”, diz Padovani.

Os dados do PIB

De acordo com Rebeca Palis, coordenadora de Contas Nacionais do IBGE, a redução da atividade econômica do País no segundo semestre do ano é reflexo do fim do efeito causado pela super safra do agronegócio comercializada nos primeiros meses do ano.

Ela também cita a política monetária do Banco Central que, a despeito do início do ciclo de queda da Selic, ainda mantém os juros elevados. "Apesar de começarem a diminuir, os juros seguem altos e as famílias seguem endividadas. Houve também a queda no consumo de bens duráveis", afirma Palis.

Os programas governamentais de transferência de renda, a continuação da melhora do mercado de trabalho, a inflação mais baixa e o crescimento do crédito também influenciaram o índice, de acordo com a especialista do  IBGE.

Em relação ao mesmo trimestre do ano passado, o PIB cresceu 2%. No acumulado do ano (janeiro a setembro), a economia brasileira apresentou alta de 3,2%, índice muito próximo (3,1%) do crescimento comparado aos quatro trimestres imediatamente anteriores.

Mesmo baixa, a alta inesperada do PIB no trimestre confirma a resiliência da economia brasileira. Em relação ao segundo trimestre do ano, por exemplo, o setor de Serviços (e também a Indústria) avançou 0,6%.

Das sete atividades analisadas dentro do setor de serviços (responsável por quase 70% da economia do País), seis apresentaram alta. Os maiores aumentos percentuais vieram das atividades financeiras, de seguros e serviços relacionados (1,3%) e as imobiliárias (1,3%). O setor de serviços representa cerca de 70% do PIB brasileiro.

Embora tenha recuado 3,3% em relação ao trimestre anterior, o setor Agropecuário voltou a surpreender. Isso porque era esperada uma queda maior, de até 5%. O recuo do setor foi o primeiro após cinco trimestres com taxas positivas, acumulando alta de 18,1% até o terceiro trimestre do ano.

Em valores correntes, o PIB no terceiro trimestre de 2023 totalizou R$ 2,741 trilhões. O indicador está no maior patamar da série histórica e opera 7,2% acima do nível pré-pandemia, registrado no quarto trimestre de 2019.