A sucessão de más notícias recentes dentro e fora do Brasil ajudou a alimentar especulações de todos os tipos quanto ao futuro da política fiscal e monetária do País no curto prazo. O dólar em alta e o crescimento elevado da curva de juros futuros por aqui foram os efeitos mais visíveis dessa piora de cenário.

Apesar dessa nuvem de incerteza que atingiu o ápice esta semana - com o agravamento do conflito Israel x Irã, a tendência de os juros começarem a baixar nos Estados Unidos apenas no segundo semestre e a repercussão ruim com a mudança de meta fiscal do governo brasileiro -, analistas ouvidos pelo NeoFeed afirmam que é possível fazer algumas previsões quanto aos próximos passos do Banco Central e do governo brasileiro.

A primeira delas é que o BC deve diminuir o ritmo de corte da taxa Selic (que vinha sendo de 0,5 ponto percentual desde agosto) para 0,25 ponto percentual já a partir da próxima reunião do Copom, marcada para 7 e 8 de maio. A inflação baixa e o crescimento da economia acima do esperado devem ser suficientes para evitar medidas drásticas por parte do BC em relação à política monetária, pelo menos, por enquanto.

Do lado do governo, porém, não dá para esperar soluções mágicas. A tendência é a equipe econômica continuar na toada de tentar aumentar a arrecadação para compensar o aumento de gastos, que devem crescer em ritmo mais elevado no segundo semestre, para obter ganhos políticos tendo em vista as eleições municipais.

Para Roberto Padovani, economista-chefe do Banco BV, é preciso diferenciar o que é ruido e especulação diante de uma série de notícias ruins recentes dos indicadores da economia que os agentes do mercado vêm acompanhando de perto, que ele afirma não terem tido alterações significativas.

“A rigor, nos últimos dias, o que mudou foi a leitura do investidor externo sobre o quadro atual da nossa economia, impactada com o aumento da cotação do dólar, a perspectiva de os juros demorarem mais para cair nos Estados Unidos e os efeitos da guerra no Oriente Médio no preço do petróleo, por exemplo”, diz Padovani.

Segundo ele, os agentes daqui não se surpreenderam com a mudança de meta fiscal anunciada pelo governo no início da semana. “Na verdade, em nenhum momento, o mercado comprou as metas estabelecidas e já esperava alterações.”

Taxa terminal

O mesmo se aplica à queda da inflação, que dificilmente atingirá o centro da meta (3,25%) estabelecida pelo Conselho Monetário Nacional. Ou seja, apesar dos ruídos e especulações, não houve informação nova sobre esses dois temas.

Neste sentido, toda vez que há mudança no cenário global, os investidores tendem a colocar relevância nas questões locais e a agirem com cautela. No caso do Brasil, essa apreensão se concentrou na política monetária.

“A discussão, no fundo, gira em torno da taxa terminal de juros, antes dessa piora de cenário a Selic ainda estava elevada, daí a dúvida de como o BC vai agir a partir de agora”, afirma o economista-chefe do BV.

Na quarta-feira, 17 de abril, o presidente do Banco Central, Roberto Campos Neto, disse que o BC tinha quatro opções para a próxima reunião do Copom: manter o corte de 0,5 pp da Selic, diminuir o ritmo de corte para 0,25 ponto percentual, congelar a Selic nos atuais 10,75% ao ano ou voltar a elevar os juros.

Padovani acredita que a atual taxa de juros segue incompatível em um quadro geral de inflação próximo da meta e com a economia mantendo um bom índice de crescimento. No curto prazo, o BC deve ser pressionado a baixar a Selic, que, na estimativa do BV, deve fechar o ano em 9%.

Assim, as turbulências recentes devem levar o BC a mexer no rimo de cortes, sem, no entanto, congelar ou até voltar a aumentar os juros.

Ao mesmo tempo, adverte, o cenário do segundo semestre – que, além das eleições municipais, será contaminado com a sucessão no comando do próprio BC, pois o mandato de Campos Neto termina em dezembro – deverá tornar as medidas do Copom mais cautelosas.

“O BC atual vai manter ritmo lento de corte de juros, não deve criar turbulência ao governo em meio ao processo eleitoral”, afirma Padovani.

Para o economista Yihao Lin, coordenador econômico da Genial Investimentos, era esperado que a piora do cenário interno pressionasse o prêmio de risco dos investidores.

“No momento mais importante de turbulência, ficou claro que o governo não está fazendo a lição de casa”, diz Lin, referindo-se à mudança de meta fiscal.

Segundo ele, para completar, as declarações do presidente do BC provocaram alta nos juros de curto prazo e uma onda de revisões para a taxa terminal de 2024. “Quem apostava que a taxa Selic chegaria em dezembro a 8% está voltando para casa dos 9%, com viés de alta”, diz Lin.

O economista Genial também aposta em uma redução do ritmo do corte de juros, de 0,5 ponto percentual para 0,25 pp, já na próxima reunião do Copom. Isso porque, diz, os juros reais estão altos, com previsão entre 6,5% a 7%, no período de 12 meses à frente.

Ele observa que, mesmo com juro real alto, a economia continua performando bem. A Genial estima que o Produto Interno Bruto (PIB) do País feche o ano acima de 2%.

“Para se ter uma ideia, a média de crescimento do PIB entre 2008 e 2019, antes da pandemia, foi de 1,6%, ou seja, estamos crescendo acima da média, a despeito da política monetária contracionista”, argumenta. “Há espaço para o BC ser cauteloso, fazendo cortes de 0,25 pp na Selic.”

Ele prevê no entanto maior volatilidade no segundo semestre, por causa das eleições e da política fiscal frouxa do governo. “Questões como o câmbio e o ajuste do preço da gasolina tendem  a afetar o índice de popularidade do presidente, e o governo ainda vai precisar buscar pelo menos R$ 35 bilhões a mais de arrecadação só para bancar o aumento do salário-mínimo, entre outras despesas novas”, adverte Lin.