A Covid-19 trouxe à tona uma divisão entre as empresas dos mais variados setores. Diante da urgência provocada pela pandemia, ficou claro que muitas delas adotavam o mantra da transformação digital apenas no discurso.
Em contrapartida, houve companhias que aproveitaram a pandemia para acelerar alguns projetos. É o caso da operação local da seguradora MetLife, grupo americano dono de um faturamento de US$ 69,6 bilhões em 2019.
No País, a empresa atua nos segmentos de previdência privada, planos odontológicos e seguros de vida. E foi nessa última área que a MetLife apostou no uso da tecnologia de reconhecimento facial para a validação da contratação de seguros de vida individuais.
“Nós colocamos energia e, em poucas semanas, aceleramos a migração para esse modelo”, diz Raphael de Carvalho, CEO da MetLife no Brasil e na Colômbia, ao NeoFeed. “Mas essa é só a cereja do bolo e a parte visível e mais ‘sexy’ de uma transformação que já vinha em curso na operação.”
Nessa oferta específica, a MetLife já contava com boa parte do processo digitalizado, especialmente com o desenvolvimento de uma plataforma de interação com os corretores, para o tráfego de propostas e documentações. O uso da nova ferramenta fecha esse ciclo, ao substituir a assinatura em papel.
O reconhecimento facial é feito a partir de uma foto tirada pelo segurado, em seu smartphone. Por meio de um software parceiro da Microsoft, a imagem é analisada e comparada com outras que constam na documentação enviada, até dar match. Caso isso não ocorra, o processo é repetido ou a proposta pode ser rejeitada, dado o risco de fraude.
Em novembro de 2019, a ferramenta começou a ser testada com a participação de um pequeno grupo de corretores. Com a chegada da pandemia, a MetLife decidiu antecipar o cronograma do projeto-piloto.
“A ideia era começar a escalar a partir deste trimestre, mas antecipamos para o fim de março”, afirma Carvalho. “Já temos 500 corretores usando intensamente a solução e o foco é levar isso para toda a rede no segundo semestre.” Hoje, a MetLife tem uma base ativa de cerca de 10 mil corretores.
Com a nova ferramenta, a MetLife registrou um salto de 15% nas vendas de seguro de vida individual, na comparação entre o segundo e o primeiro trimestre
A empresa contabiliza os primeiros efeitos da ampliação do projeto. Depois de uma queda de mais de 50% nas primeiras semanas da crise, os corretores retomaram o ritmo e a MetLife já registra um salto de 15% nas vendas de seguro de vida individual, na comparação entre o segundo e o primeiro trimestre.
Com a antecipação das etapas de adoção da tecnologia nessa esfera e a validação do modelo durante a Covid-19, o plano agora é estender o uso da ferramenta, gradativamente, para os demais produtos do portfólio local.
“O reconhecimento facial é uma das tecnologias que mais vão atrair investimentos em seguros”, diz Alejandro Moran Marco, head de insurance da consultoria Everis para a América Latina. “Além de reduzir a fricção entre o cliente e as seguradoras, essa é uma área na qual a regulação é menos restrita.”
Cobertura mais ampla
Mais do que um simples projeto-piloto que ganhou velocidade com a Covid-19, o uso do reconhecimento facial na contratação do seguro de vida individual é parte de um esforço mais amplo da MetLife. Assim como a estratégia de digitalização da companhia.
“Temos uma história muito forte no segmento de pessoa jurídica aqui no Brasil”, diz Carvalho. “Sem deixar isso de lado, queremos reduzir uma lacuna e crescer também nas ofertas para pessoa física no País.” Hoje, 70% da receita local vêm de empresas.
O executivo não revela a fatia pretendida para as ofertas B2C nesse bolo. O fato é que a MetLife vem ampliando os canais de contato com esse público. O caminho inclui as parcerias para a oferta de produtos, um escopo que inclui acordo com empresas como XP e Banco Inter.
O leque passa por outras iniciativas desenvolvidas dentro de casa. Um exemplo é um projeto-piloto para a oferta da contratação direta e 100% digital de planos odontológicos individuais, por meio de uma loja virtual da empresa. A plataforma já chegou a superar o volume de dois mil planos em um mês.
Carvalho ressalta o pano de fundo por trás dessas e de outras pontas que compõem a guinada digital da MetLife. “Estamos muito focados em simplificar a vida dos corretores e do cliente na ponta”, diz. “Seja ele um consumidor final ou um tomador de decisão dentro de uma empresa”, diz Carvalho.
A MetLife não é, porém, a única gigante do setor que está fortalecendo essa estratégia digital. A espanhola Mapfre, por exemplo, também vem investindo em tecnologias e conceitos como inteligência artificial e automação para renovar suas ofertas em áreas como seguros de vida.
“Por ser muito regulado, o mercado de seguros ainda é conservador em termos de tecnologia e inovação”, diz Marco, da Everis. Ele entende que a Covid-19 irá acelerar esse processo. Mas aponta um desafio para empresas como a MetLife.
“As seguradoras tradicionais vão ter que caminhar para um portfólio mais abrangente e, ao mesmo tempo, uma oferta mais personalizada”, afirma. “E, no médio prazo, é bom estar preparado para o avanço das startups do setor.”
A MetLife já está se movimentando nesse cenário. E a postura do grupo é muito mais de aproximação com as novatas do setor, as chamadas insurtechs, do que de confronto.
Na América Latina, a empresa é uma das parceiras da Village Capital, organização que promove programas de aceleração e investe em startups de todos os segmentos financeiros, entre eles, os seguros.
Em 2019, por exemplo, a brasileira Monetus, de gestão de investimentos, foi uma das finalistas globais da iniciativa e recebeu um aporte de US$ 50 mil.
Globalmente, o grupo também tem uma série de iniciativas nessa seara. Além da participação em aportes feitos por empresas de capital de risco, a companhia faz investimentos diretos em startups por meio da MetLife Digital Ventures e da MetLife Digital Accelerator, iniciativas criadas em 2018. A primeira delas, com um fundo inicial de US$ 100 milhões.
“Estamos muito focados em simplificar a vida dos corretores e do cliente na ponta, Seja ele um consumidor final ou um tomador de decisão dentro de uma empresa”
Antes de olhar para fora, porém, Carvalho destaca que a prioridade foi a criação de uma cultura interna que favorecesse essa jornada digital, centrada no cliente. Com esse objetivo em mente, a operação brasileira investiu em uma série de iniciativas nos últimos anos. Da adoção de novas metodologias de trabalho à formação de um quadro de funcionários mais diverso e heterogêneo.
“Não adianta querer dar essa guinada quando o dia a dia ainda é de uma seguradora da década de 1950”, diz o executivo. “Só conseguimos virar a chave rapidamente porque tínhamos criado, muito antes, uma mentalidade propícia para essa mudança.”
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