Logo depois que a Cosan anunciou a compra de participação na Vale, no início da tarde desta sexta-feira, 7 de outubro, o mercado deu seu recado: a princípio, não gostou do que viu. As ações da Cosan fecharam em queda de 8,72%, a R$ 16,65, diante das preocupações de que a operação pudesse comprometer as finanças da companhia.
O receio ficou demonstrado em um cálculo do Goldman Sachs. Segundo o banco, considerando o valor de mercado atual da Vale, de US$ 67 bilhões, a transação implica num valor de US$ 3,3 bilhões, cerca de 51% do valor de mercado da Cosan, de US$ 6,5 bilhões.
Para tentar acalmar os ânimos, Luis Henrique Guimarães, CEO da Cosan, o CFO Ricardo Lewin e o CSO Marcelo Martins fizeram uma teleconferência com analistas para explicar a estrutura da operação e afirmar o que todos queriam ouvir: a empresa não está fazendo nenhuma loucura ao investir na Vale.
“Essa operação não compromete a saúde financeira da Cosan, porque se isso for colocado em jogo, essa transação não será colocada em prática”, disse Martins. “Se chegarmos à conclusão de que a participação deve ser desfeita, por qualquer razão que for, ela poderá ser desfeita.”
Na teleconferência, os executivos ofereceram mais detalhes sobre como a operação de entrada no capital da Vale foi realizada. A posição de 4,9% foi montada através da compra de 1,5% de ações da companhia no mercado à vista, com os outros 3,4% incorporados via instrumentos financeiros derivativos com proteção de downside do preço das ações da mineradora, no chamado collar.
O collar é uma operação com opções que visa proteger uma posição em caso de queda do mercado, ao mesmo tempo em que há chances de ganhos se o mercado se valorizar e o preço subir.
A Cosan pode alcançar uma fatia de 6,5% no capital da Vale com outro collar, com o qual poderá adicionar uma participação de 1,6%. Para atingir essa posição, a empresa terá de obter a aprovação do Conselho Administrativo de Defesa Econômica (Cade).
Segundo os executivos, a operação foi viabilizada por uma combinação de linhas de crédito non-recourse de longo prazo, com parte financiada através de um empréstimo ponte que envolve uma estrutura de equity com ações preferenciais da Raízen e da Compass, empresa do setor de gás natural que abriga a Comgás. Eles afirmaram que os dividendos dessas duas empresas amortizarão o financiamento.
Se for necessário, a Cosan tem uma lista de ativos que poderão ser vendidos para ter caixa suficiente e, eventualmente, serem utilizados na operação. Já a emissão de ações está totalmente descartada.
“Temos uma lista de ativos, e não de participação em empresas, que poderiam ser, no momento certo, na oportunidade certa, desinvestimentos para geração desses recursos”, disse Martins.
Ativo único
Além da questão do financiamento, a compra preocupou os investidores da Cosan pela falta de visão de como o movimento se encaixaria nos planos da holding, numa demonstração de que a empresa poderia perder seu foco.
Em comentário divulgado pouco depois do anúncio da Cosan, a Eleven Research destacou que a operação faz parte da estratégia de diversificação da companhia, que já atua nos setores de energia, com a Raízen, de gás natural, com a Compass, de lubrificantes, com a Moove e de transporte ferroviário, com a Rumo.
No entanto, um ativo do tamanho da Vale poderia prejudicar a Cosan, depois de o grupo ter feito uma reorganização de sua estrutura corporativa. “Em nossa visão, a operação torna a operação da Cosan ainda mais complexa, sem muita sinergia com os demais negócios da companhia”, diz um trecho do comentário.
Na teleconferência, Guimarães destacou o histórico bem-sucedidos de investimentos da Cosan, citando os casos de Raízen e Comgás.
“Quando entramos nessas companhias, também havia dúvidas de onde viriam as alavancas (de crescimento), algumas delas eram reguladas e nós demonstramos que, trabalhando em conjunto com os sócios e a administração, conseguimos destravar uma série de alavancas que não eram vistas nessas companhias e esperamos fazer o mesmo na Vale”, afirmou.
Para o executivo, o investimento na Vale se justifica pelo fato de ser um ativo único e irreplicável, com com exposição à moedas fortes e estrategicamente posicionado onde o Brasil tem vantagem competitiva e comparativa.
As ações da Vale fecharam o pregão de hoje com queda de 0,05%, a R$ 75,51. No ano, elas acumulam alta de 5,8%, levando o valor de mercado para R$ 359,2 bilhões.