A Amazon estreou na bolsa de valores americana, em 1997, valendo US$ 435 milhões. Na mesma época, a gigante do varejo Walmart, já veterana em Wall Street, tinha um valor de mercado de US$ 68,3 bilhões, quase 160 vezes superior.
Foram necessários 18 anos para que ambas as varejistas se encontrassem no mesmo patamar de valor de mercado. Em 2015, as duas gigantes do setor estavam avaliadas, cada uma, em US$ 231 bilhões.
Mas, cinco anos depois, a diferença ficou enorme. A companhia fundada por Jeff Bezos vale US$ 937,7 bilhões – já tendo algumas vezes superado o US$ 1 trilhão em capitalização –, mais de três vezes o valor da organização do lendário Sam Walton.
O que explica essa diferença? Bezos transformou a Amazon em uma gigante do comércio eletrônico, atuando em diversos setores, de leitores de livros digitais a produção de séries de tevês. O Walmart, por sua vez, patinou em sua estratégia online.
Os dados confirmam essa visão. De acordo com a consultoria americana eMarketer, a Amazon detém uma participação de 40% das vendas online nos Estados Unidos. O Walmart está numa longínqua segunda posição, com apenas 5%.
Mas a companhia fundada por Walton em Bentonville, no Arkansas, em 1962, que faturou US$ 523,9 bilhões, em 2019, e conta com mais de 11,3 mil lojas em 27 países, parece que está começando a sair dessa letargia para tentar enfrentar a Amazon e recuperar o tempo perdido.
E a próxima grande tacada do Walmart quer acertar o coração da estratégia da Amazon: o seu serviço Amazon Prime, programa pioneiro de assinatura iniciado pela empresa em 2005.
O Prime conta com mais de 150 milhões de clientes globalmente e dá direito a entregas gratuitas, descontos em milhões de produtos e uma série de serviços, como o Amazon Prime Video, ao custo de US$ 12,99 ao mês.
No Brasil, o serviço custa R$ 9,90 mensais e foi destacado no balanço com o resultado global da companhia em 2019. “Desde o lançamento, em setembro, o Brasil registrou o crescimento mais rápido de assinaturas pagas do Prime na história da Amazon”, escreveu a Amazon, em comunicado divulgado em 30 de janeiro.
A Amazon detém uma participação de 40% das vendas online nos EUA. O Walmart está numa longínqua segunda posição, com apenas 5%
O Walmart deve lançar, em breve, o serviço Walmart+, uma espécie de Amazon Prime, segundo informou com site Recode, especializado na cobertura de empresas do Vale do Silício.
O time do Walmart vem trabalhando silenciosamente no programa nos últimos 18 meses para que contemple características diferentes do Prime, da Amazon.
O Walmart+ será uma espécie de relançamento do serviço Delivery Unlimited, que cobra US$ 98 por ano dos consumidores para entregar no mesmo dia mantimentos frescos de 1,6 mil lojas do Walmart nos Estados Unidos.
O novo serviço, no entanto, se diferenciará da Amazon por adicionar mais regalias aos seus membros, como descontos em remédios e em combustíveis, além do serviço Scan & Go, que permitia aos consumidores pagar nas lojas sem esperar na fila – uma ferramenta testada e descontinuada há dois anos.
A gigante está também considerando lançar o Walmart+ com um recurso que permitirá aos consumidores usar mensagens de texto para fazer pedidos, segundo o Recode. Os executivos não definiram o valor do serviço, nem se testarão múltiplos preços.
O modelo de negócio baseado em um programa de assinaturas revolucionou o varejo americano. Muitos analistas consideram que o Prime ajudou a Amazon a conquistar espaço nas vendas online, bem como é responsável por parte substancial dos lucros da empresa de Bezos – os assinantes do Prime compram com mais frequência e pagam tíquetes maiores do que os não assinantes.
Além disso, o serviço ajudou a colocar muitas outras grandes varejistas em estado terminal nos EUA, no que ficou conhecido como o “efeito Amazon” no varejo americano.
"A Toys R Us morreu, a Bed Bath & Beyond está tão pela hora da morte quanto a Best Buy", disse ao NeoFeed o jornalista e escritor americano Charles Fishman, autor do livro Nos Bastidores do Walmart. "Um dos grandes desafios do Walmart agora é entender o que ele tem que fazer para converter seus clientes offline em clientes online."
E não são poucos os clientes offline da Walmart. Estima-se que aproximadamente 150 milhões de americanos visitem semanalmente uma de suas lojas nos EUA. “Isso significa que mais da metade da população adulta dos EUA faz compras em um Walmart pelo menos uma vez a cada sete dias", afirma Fishman. Além disso, 80% da população americana vive, no máximo, a 15 minutos de uma das unidades da rede.
A nova iniciativa online faz parte de um plano mais amplo do Walmart, que deve faturar US$ 50 bilhões com o seu comércio eletrônico em 2020. A rival Amazon teve receitas de US$ 280 bilhões no ano passado.
Em 2019, as vendas online do Walmart avançaram 37%. Mas a companhia avisou os investidores que espera uma desaceleração neste ano fiscal, com avanço de 30%. Embora não divulgue dados, analistas de mercado acreditam que se trata ainda de um negócio deficitário.
O Wamart+ se diferenciará da Amazon por adicionar mais regalias aos seus membros, como descontos em remédios e em combustíveis
Um dos projetos que está em curso para melhorar o desempenho e a rentabilidade da companhia é a integração do grupo de compras online e de lojas físicas. Eles, até agora, trabalham de forma separada. Ao uni-los, o Walmart quer acabar com o conflito de preços entre as duas áreas.
“Nossos consumidores veem um Walmart e ele deve ser o número 1 sempre”, diz o texto de um memorando distribuído a funcionários, no qual o The Wall Street Journal teve acesso, escrito por Marc Lore, que comando o walmart.com nos EUA, e John Furne, responsável pelas lojas físicas.
Fishman, autor do livro Nos Bastidores do Walmart, aponta para o fato que há três anos o Walmart sequer esboçava uma integração com suas vendas online e offline. Agora, ele já permite compras online e entregas nas lojas físicas. E começa, mesmo atrasado, a integrar compras das duas áreas, coisa que o Magazine Luiza, no Brasil, faz desde o começo dos anos 2000.
"O Walmart passou os últimos 10 anos desenhando uma maneira de fazer frente à Amazon nesse ambiente digital”, afirma Fishman. “Eles contam atualmente com uma equipe de 3 mil pessoas no Vale do Silício totalmente focadas na missão de revolucionar o walmart.com."
Avanço na área de saúde
Apesar do avanço da estratégia online, a força das lojas físicas será aproveitada em outra iniciativa no setor de saúde que visa a enfrentar a Amazon. O Walmart Health Center tem ganhado cada vez mais espaço dentro das lojas e nos planos da companhia.
A unidade de negócio que oferece atendimentos clínicos e exames está expandindo seu poder de fogo. Agora, os clientes vão poder fazer check-ups por US$ 30 e limpeza bucal por US$ 25.
O Walmart Health Center tem ganhado cada vez mais espaço dentro das lojas e nos planos da companhia
"Esse tipo de alternativa pode, sim, trazer novos clientes a lojas do Walmart, inclusive aqueles que sejam da Amazon Prime, porque esse tipo de serviço, de limpeza de dente, é historicamente caro no país, e muita gente não o faz por uma questão puramente financeira", diz Fishman.
Com essa iniciativa, o Walmart quer pegar uma fatia dos US$ 3,6 trilhões gastos com saúde pelos americanos. “Temos uma oportunidade de ajudar o país e de construir um negócio mais forte”, afirmou Doug McMillon, CEO do Walmart, a investidores, em dezembro do ano passado.
Quem é responsável pela estratégia é Sean Slovenski, vice-presidente de saúde e bem-estar do Walmart. Ele se juntou ao grupo em 2018 para cuidar da divisão que já fatura US$ 36 bilhões e faz 400 milhões de prescrições anualmente e opera 3 mil centros.
Essa é uma disputa não só com a Amazon, que comprou, em 2018, a farmácia online PillPack por aproximadamente US$ 750 milhões. A empresa de Bezos tem também uma joint venture com o JPMorgan e a Berkshire Hathaway, do megainvestidor Warren Buffett, que oferece planos de saúdes aos funcionários de empresas.
Há outros gigantes na briga. Um deles é a CVS, que pagou, em 2018, US$ 22 bilhões pela Caremark, uma companhia que faz o meio de campo entre as fabricantes de medicamentos e as farmácias.
“O Walmart tem a possibilidade de ser uma força disruptiva no setor de saúde, resolvendo alguns dos maiores problemas da área, como acesso a comunidades rurais e transparência de preço”, afirmou Paul Schuhmacher, diretor da consultoria AArete, para a Bloomberg Businessweek.
O Walmart sempre correu atrás da Amazon quando o assunto é vendas online. Até agora, não alcançou a companhia de Bezos. Será que dessa vez vai acertar o passo e conseguir recuperar o tempo perdido?
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