Não é só no futebol que a Argentina está dando um baile no Brasil. Em contraste com anos anteriores, os hermanos vêm ganhando de lavada na esfera financeira.
Em Nova York, palco dos investidores globais, o placar é de US$ 1,5 bilhão a favor dos argentinos. Esse é o saldo do ano entre os US$ 600 milhões captados pelo ARGT, principal ETF da Argentina nos Estados Unidos, e os US$ 900 milhões perdidos pelo brasileiro EWZ.
Controle da inflação, melhora na perspectiva fiscal e potencial de crescimento para os próximos anos têm colocado a Argentina como o principal destino de investidores na América do Sul, enquanto um cenário relativamente oposto tem afugentado investidores do Brasil.
Na B3, os investimentos diretos indicam uma saída de estrangeiros que caminha para fechar o ano em R$ 25 bilhões. O fluxo tem influenciado os preços.
Desde o início do ano, o EWZ caiu 35%, enquanto o ARGT subiu 63%. Essa diferença reflete também a variação cambial no período. Enquanto as incertezas fiscais penalizam o real, que perdeu 21% de valor frente ao dólar, o país vizinho conseguiu estabilizar o preço da moeda no mercado paralelo e avança para alinhar a cotação oficial.
Essa maior atração de dólares tem melhorado as contas correntes da Argentina, que fecharam o terceiro trimestre com um saldo positivo de US$ 1,4 bilhão, comparado aos US$ 6 bilhões negativos no mesmo período do ano passado. A conta financeira, relacionada a investimentos estrangeiros, apresentou saldo positivo de US$ 1,15 bilhão.
Dados mostram que o Brasil tem contribuído significativamente para essa recuperação. Segundo o Banco Central da Argentina, os brasileiros foram responsáveis por 35% dos US$ 2,385 bilhões em investimentos estrangeiros diretos no segundo trimestre, sendo o principal investidor. A China aparece em segundo lugar, com participação de 13,6%.
O otimismo com o país vizinho tem se refletido nas posições de gestoras brasileiras, que estão cautelosas em relação à economia local. Lucas Sigu Souza, sócio-fundador da Ciano Investimentos, afirmou ao NeoFeed que mantém 50% de seus investimentos no exterior, sendo 20% na Argentina e 30% nos Estados Unidos.
“O Milei está colocando em prática políticas ortodoxas, que têm se mostrado eficazes, enquanto o governo brasileiro insiste em um negacionismo econômico. A Argentina está absorvendo investimentos que poderiam estar indo para o Brasil”, diz Sigu.
Outra gestora brasileira que tem apostado fortemente na Argentina é a Vista Capital, que desde o início do governo Milei tem defendido sua política econômica.
“Os desafios da Argentina lembram, em alguma medida, os envolvidos nos planos de estabilização do Brasil e outros países da América Latina nos anos 1990. Em caso de sucesso, os retornos potenciais dos ativos podem se mostrar bastante relevantes e por um período bastante prolongado”, destacou a gestora, em carta a investidores.
As duras políticas do presidente Javier Milei pavimentaram o caminho para a entrada de dólares, com medidas como austeridade fiscal, cortes de gastos e redução da participação do Estado na economia. Durante a implementação dessas políticas, o país enfrentou uma retração de 5% no PIB anual, enquanto a retirada do controle de preços elevou a inflação a um pico de 289%.
Entretanto, sinais de melhora já são visíveis, com a inflação mensal girando abaixo de 3% desde outubro, bem distante do pico de 25,5% registrado em dezembro de 2023. Para os próximos 12 meses, o mercado projeta que a inflação anual caia de 166% para 29,4%, segundo boletim do Banco Central da Argentina.
Economistas do BTG Pactual estimam que a inflação argentina termine 2025 em 24%, enquanto o PIB deve crescer 5% no ano, impulsionado por uma alta de 20% no volume de investimentos.
Embora parte da recuperação já tenha sido incorporada nos preços, o BTG avalia que a bolsa de Buenos Aires ainda tem um futuro promissor, especialmente no setor bancário.
“As ações dos bancos argentinos tiveram um desempenho excepcional em 2024, com retornos acima de 200%. No entanto, acreditamos que ainda há espaço para reavaliação em 2025, com o início de um novo ciclo de crescimento do crédito e recuperação econômica."