A crise global de energia desencadeada pela guerra da Rússia na Ucrânia causou dois efeitos nas maiores empresas de petróleo do planeta: aumentou – e muito – seus lucros e, como consequência, esfriou o discurso de investir em planos sustentáveis de longo prazo para mitigar as mudanças climáticas, que era mais enfático anos atrás, quando o setor estava perdendo dinheiro.

A reunião anual de acionistas das duas maiores petroleiras do mundo, a Exxon e a Chevron, ambas realizadas esta semana, mostrou que os investidores que defendem uma estratégia mais sustentável estão cada vez mais isolados.

Para evitar os distúrbios recentes ocorridos nas reuniões anuais de outras gigantes do setor - Shell, BP e Total, invadidas por manifestantes –, a Exxon e a Chevron decidiram realizar a assembleia de acionistas de modo virtual.

Talvez por essa razão, os acionistas das duas empresas ficaram mais à vontade para derrubar as sugestões com perfil sustentável apresentadas.

Na reunião da Exxon, por exemplo, nenhuma das 12 propostas relacionadas a medidas mitigadoras de clima foi aprovada. A que propunha aumentar os relatórios de medição de gás metano da empresa foi a que teve a maior acolhida, obtendo 36% dos votos.

Os acionistas também rejeitaram a criação de um plano de resposta ao derramamento de óleo de pior cenário para suas operações na Guiana. Recebeu apenas 13% dos votos.

O fraco apoio ocorre dois anos depois que um fundo de hedge ativista, chamado Engine No. 1, ter forçado uma reformulação no conselho da Exxon, com o apoio de gestores de ativos, como Black Rock e Vanguard, e de grandes fundos de pensão públicos. A batalha por procuração levou à nomeação de três membros do conselho da Exxon.

O caixa abarrotado de petrodólares no pós-guerra da Ucrânia, porém, falou mais alto. A Exxon, maior petroleira do planeta, obteve em 2022 um lucro recorde de US$ 55,7 bilhões – valor quase US$ 33 bilhões superior ao registrado em 2021.

"Não há nenhuma grande petrolífera que realmente queira fazer a transição", disse à agência Reuters Mark van Baal, fundador do grupo ativista Follow This, que representa cerca de 9.500 acionistas distribuídos em empresas de petróleo e gás. "Todos querem manter os combustíveis fósseis o maior tempo possível."

Numa mostra do mal-estar no setor, o CEO Darren Woods chamou o Follow This de "um grupo antipetróleo e gás" que usa objetivos ambientais e sociais "para diminuir o importante papel que a Exxon desempenha" na indústria.

Os investidores da Chevron, segunda maior petroleira do mundo, também rejeitaram propostas sobre a meta de redução de emissões dos clientes na reunião anual. Mas ao menos aprovaram a criação de um comitê do conselho sobre o risco de descarbonização e um relatório sobre o impacto do fechamento de instalações e transições de energia no trabalhador e na comunidade.

A Chevron registrou lucro recorde em 2022, de US$ 35,5 bilhões, alta de 127% na comparação com 2021.

Petrobras revê estratégia

O debate sobre como uma petroleira deve reagir à mudança climática também chegou à Petrobras, a maior empresa brasileira.

A Petrobras divulgou ao mercado na quinta-feira, 1º de junho, a revisão do plano estratégico da companhia, que inclui as prioridades para o período entre 2024 e 2028.

Aprovado na noite anterior pelo seu Conselho de Administração, o plano prevê um aumento do teto de investimentos (Capex) em projetos de baixo carbono, que subiu de 6% para 15%.

Estão previstos investimentos de projetos em energias renováveis e em descarbonização das operações, que deverão ser estabelecidos dentro da governança da companhia. Entre eles, petroquímicos e fertilizantes.

Nos últimos dois governos (Michel Temer e Jair Bolsonaro), a companhia mantinha foco na extração de petróleo bruto, com resultados recordes no pré-sal.

A Petrobras também surfou na bonança do setor petrolífero, registrando um lucro líquido de R$ 188,3 bilhões em 2022 - resultado 77% superior ao do ano anterior.

A sede de manter a exploração em combustíveis fósseis não mudou com a troca de governo. Já sob a presidência de Jean Paul Prates, a empresa de economia mista pediu nova autorização ao Ibama para fazer testes de exploração de petróleo e gás em uma área a 500 km da foz do Rio Amazonas, próxima ao Amapá e ao Pará.

A Foz do Amazonas integra a Margem Equatorial, uma ampla área que se estende do Amapá até o Rio Grande do Norte, na qual a Petrobras tem planos de investimentos.

O Ibama, que antes havia negado o pedido, alegando que os documentos apresentados não asseguram a proteção da diversidade biológica da região e a segurança de comunidades indígenas, entre outros itens, reavaliou a demanda após pressão do presidente Luiz Inácio Lula da Silva.

O tema abriu uma divisão entre a Petrobras e o Ministério das Minas e Energia, de um lado, e o Ministério do Meio Ambiente e o Ibama, que são contra a pesquisa.