Considerada uma das grandes apostas do Primeiro Mundo como fonte de energia renovável, o segmento de energia eólica offshore vive uma crise de custos que tem levado empresas do setor a adiar ou suspender projetos de grande porte em várias partes do mundo.

A dinamarquesa Orsted anunciou na semana passada a saída de uma parceria que desenvolve energia eólica offshore na Noruega devido ao aumento dos custos. Na Ásia, grupos japoneses desistiram de levar adiante projetos eólicos offshore em Taiwan, um dos mercados de crescimento mais rápido no mundo. Apesar de oferecer subsídios, os EUA também tiveram projetos cancelados.

O Brasil, que ainda está discutindo uma legislação específica para eólica offshore, não foi afetado. Mas deve atrasar a implementação de parques eólicos em alto-mar, como a Petrobras já demonstrou interesse em colocar de pé.

Uma série de fatores está contribuindo para esse recuo. Os custos globais dos projetos aumentaram 39% desde 2019, impulsionados pela elevação da inflação e dos juros, que encareceram gastos com mão-de-obra, financiamentos e preço de matérias-primas, como aço.

Embora muitas empresas consigam compensar as alterações de custos por meio do aumento dos preços, muitos empreendimentos eólicos encontram-se presos a contratos de venda de energia a taxas estabelecidas há anos, o que está levando alguns governos a oferecerem compensações na oferta de leilões.

O Reino Unido, um dos maiores incentivadores do uso da eólica offshore como fonte de energia renovável, é um exemplo. Líder mundial no segmento, o país abriga os quatro maiores parques offshore do mundo, sustentando dezenas de milhares de empregos, que forneceram 13,8% da geração de eletricidade do Reino Unido no ano passado.

Mas quando o governo revelou, em setembro, que nenhuma empresa tinha apresentado propostas para contratos, os planos para quase quadruplicar a capacidade eólica offshore, de 13 gigawatts (GW) para 50 GW até 2030 – o suficiente para abastecer todas as casas no Reino Unido – sofreram um duro golpe.

O argumento das empresas é que o preço estabelecido para a eletricidade gerada era demasiado baixo. O governo britânico elevou, então, o valor pago do equivalente a US$ 55 por MWh para um preço de até US$ 91, para atrair as empresas no próximo leilão.

Prejuízos bilionários

A inviabilidade financeira já havia levado a dinamarquesa Orsted a cancelar dois grandes projetos de parques eólicos offshore no litoral de New Jersey, nos EUA, a um custo de mais de US$ 3,75 bilhões, alegando inflação elevada, o aumento das taxas de juro e os estrangulamentos na cadeia de abastecimento.

A decisão lançou dúvidas sobre os planos da Orsted de desenvolver uma terceira fase do projeto Hornsea, em águas britânicas, que seria o maior parque eólico do mundo. Ainda nos EUA, a BP revelou uma baixa contábil de US$ 540 milhões em dois projetos na costa de Nova York devido ao custo maior do que o esperado.

Embora gestores de muitas empresas no setor esperem que os custos caiam, há dificuldade em prever quando isso ocorrerá.

“É provável que o aumento da procura conduza a um aumento do investimento na cadeia de abastecimento, o que ajudará a reduzir os custos a médio e longo prazo”, afirma Alex Weir, diretor da consultora britânica Baringa, acrescentando que a tendência, no entanto, é de um período de preços elevados “durante alguns anos”.

A crise global no setor eólico offshore pode repercutir no Brasil por meio do atraso de desenvolvimento de projetos da Petrobras. Em setembro, a estatal brasileira deu início a estudos em paralelo ao processo de licenciamento ambiental para 23 gigawatts (GW) de parques de energia eólica offshore na costa brasileira, em parceria com a Equinor.

Os projetos em estudo pela Petrobras são majoritariamente em águas rasas e sua viabilidade depende de uma regulamentação para leilão de cessão de uso das áreas no mar. A empresa diz não ser possível estimar os custos nesse estágio, mas assegura que apenas entrará em projetos com rentabilidade garantida.

“A questão dos custos nesse segmento de eólica offshore compromete projetos no médio e no curto prazo, aqui e no exterior, mas no longo prazo deve se ajustar”, afirma o economista Diogo Lisbona, pesquisador do Centro de Estudos em Regulação e Infraestrutura da Fundação Getúlio Vargas (FGV-Ceri).

A indústria do setor desenvolveu-se rapidamente desde que o primeiro parque eólico offshore do mundo foi construído na costa da Dinamarca, em 1991, com 11 turbinas capazes de abastecer apenas 2.200 residências.

Desde então, o aumento do tamanho das turbinas e as taxas de juro ultrabaixas ajudaram a reduzir os custos globais de construção e operação em 60% entre 2010 e 2021, de acordo com a Agência Internacional de Energias Renováveis.

A entidade estima que a capacidade eólica offshore terá de ultrapassar os 2.000 GW até 2050, em comparação com os quase 70 GW a nível mundial atualmente. Globalmente, porém, a indústria ainda é pequena, respondendo por cerca de 0,8 % da produção de eletricidade em 2022.