Um dos empresários mais influentes do Brasil, Rubens Menin carrega o sobrenome por trás de um grupo diversificado de negócios. Da construtora e incorporadora MRV e da empresa de galpões logísticos Log ao banco Inter, à CNN Brasil e à Sociedade Anônima do Futebol (SAF) do Atlético Mineiro.
Do alto dessa posição e na soma dessas operações, ele está preocupado com outra equação - as perspectivas para o Brasil. Especialmente a partir de um cenário que combina desafios tanto no plano da economia como no da política.
Menin entende, porém, que há um fator em comum conectando – e complicando – as relações entre essas duas esferas: a polarização extrema vivenciada atualmente pelo Brasil. E que, por sua vez, antecipou e adicionou outro agravante a essa agenda já bastante atribulada do País.
“Estamos em 2025 e a eleição de 2026 já está em nós. E ela realmente atrapalha. Nós tínhamos que estar concentrados em uma pauta”, disse Menin, em entrevista concedida ao NeoFeed, durante o Inter Invest Summit, realizado no sábado, 20 de setembro, na Arena MRV, em Belo Horizonte.
“Estamos perdendo o foco e essa polarização que antecipou a eleição é ruim. O mandato é de 4 anos, sendo que, nos últimos quase 2 anos, já estamos nessa guerra política. Não dá. É muito pouco”, complementa.
Em sua avaliação, um dos temas que deveriam ser prioritários nessa pauta é o combate aos juros elevados. Assim como a necessidade de o Estado buscar uma maior eficiência nos gastos.
Para seguir nessa direção, no entanto, Menin ressalta que é preciso melhorar e “subir a barra” das discussões no âmbito da política. O que passa, necessariamente, por uma revisão no papel dos políticos brasileiros.
“Temos que pensar o político como um doador. Ele tem que estar lá para doar ao país sua sabedoria. Então, ele não pode desvirtuar os conceitos básicos da política”, diz. “E, infelizmente, algumas vezes isso acontece. Existe um desvirtuamento no qual o cara começa a pensar mais no seu próprio umbigo”.
Na conversa, Menin fala de temas como a chamada PEC da Blindagem, dos impactos da alta na taxa dos juros, dos caminhos para a contenção de gastos, das tarifas de Donald Trump e da necessidade de um pacto social.
Confira os principais trechos da entrevista:
Como você está enxergando o cenário atual no Brasil?
O cenário é extremamente complexo e desafiador. Primeiro porque, infelizmente, essa polarização é muito ruim para o país. Não temos foco. Sem união, você não olha para frente. E quando se está polarizado no nível que estamos - muito elevado - você começa a puxar um cabo de guerra que não tem vencedor. Então, precisamos ter as pontas mais bem definidas. Porque o momento está muito difícil.
O quanto desse cenário tem sido afetado pelos componentes políticos?
Nós somos uma democracia, temos três poderes constituídos, que, às vezes, podem dar uma derrapada, o que é normal quando se está num ambiente polarizado. Mas eu acho que devemos voltar a procurar um ambiente mais tranquilo. E é lógico que isso passa pela política. Se não passar pela política, é ditadura. Mas temos que elevar o nível. Das conversas, das discussões. Temos que melhorar e subir a barra na política. Porque hoje ela está muito intrincada nas nossas vidas.
E, nesse contexto, como fica o papel e o nível dos políticos brasileiros?
Temos que pensar o político como um doador. Ele tem que estar lá para doar ao país sua sabedoria. Então, ele não pode desvirtuar os conceitos básicos da política. E, infelizmente, algumas vezes isso acontece. Existe um desvirtuamento no qual o cara começa a pensar mais no seu próprio umbigo. Quando você está pensando no seu umbigo, você não vai prestar um serviço decente para o país.
A PEC da Blindagem, por exemplo, seria um desses desvirtuamentos?
Seria. Mas acho que a chance de ela dar certo é muito remota. Por mais apoio que ela tenha dentro da Câmara, acredito que não vai acontecer. Como outras maluquices que também não vão acontecer. No final, somos um estado de direito. Mas temos que dar um bom exemplo. É isso que os nossos políticos têm que fazer - dar um bom exemplo.
"Acho que a chance de ela [a PEC da Blindagem] dar certo é muito remota. Por mais apoio que ela tenha dentro da Câmara, acredito que não vai acontecer. Como outras maluquices que também não vão acontecer"
Esse caldeirão político também tem sido alimentado pelo tarifaço de Donald Trump. Que impactos isso traz para a economia?
Essa foi a tempestade que não esperávamos. E os imprevistos normalmente são piores. O Brasil precisa muito da exportação. Temos as commodities, o agronegócio e precisamos fazer negócios com o mundo todo. Não é com A, B ou C. Então, independentemente das razões políticas dos Estados Unidos e do Brasil, as tarifas atrapalham nossa competitividade e machucam muito alguns setores.
E qual é a saída para resolver esse impasse?
Não é se e quando. Teremos realmente que sentar à mesa. Eu não estou discutindo se os Estados Unidos estão certos ou errados. A solução só vai acontecer se sentarmos à mesa com os Estados Unidos, então, nós temos que procurar esse canal. Acho que está lento. Não adianta querermos brigar. Mas espero que os Estados Unidos também tenham juízo. Essa geopolítica está mudando muito. A ordem econômica mundial está mudando muito. Mas o Brasil precisa muito conviver com todos os países. Sem nenhuma restrição. Quanto menos mercado você tiver, mais você fecha as portas.
Sob a ótica de política e economia, as eleições de 2026 também já estão influenciando esse cenário?
Essa eleição, aparentemente, vai ser muito dura, muito combativa. Então, estamos em 2025 e a eleição de 2026 já está em nós. E ela realmente atrapalha. Nós tínhamos que estar concentrados em uma pauta. E qual é a pauta óbvia que o Brasil tem hoje? Por exemplo, combater os juros altos. Então, estamos perdendo o foco e essa polarização que antecipou a eleição é ruim. O mandato é de 4 anos, sendo que, nos últimos quase 2 anos, já estamos nessa guerra política. Não dá. É muito pouco. Esse país tem que crescer mais. Para virarmos, de fato, um país desenvolvido. Essa é a grande meta.
Como os juros elevados estão impactando a economia?
A taxa de juros não é causa, é consequência. Por que que a taxa de juros no Brasil é talvez a mais elevada do mundo? Nós temos que entender. Está errado. Repare, eu sou favorável ao Banco Central independente, não há dúvida. Mas acho que o Brasil errou na política monetária duas vezes.
Quais foram esses dois erros?
Primeiro, o país desceu os juros de forma muito rápida. Chegamos a ter uma taxa muito agressiva, de 2%. Não era a taxa correta. E eles também subiram de forma muito rápida. Os outros países sabiam que tinham que subir os juros, já que a cadeia produtiva foi impactada com a pandemia, mas subiram de uma forma mais normal. E quando subimos muito rápido, o discurso era de que os problemas do Brasil iam ser resolvidos mais rápido. Não foi verdade, não foram resolvidos.
E como isso está afetando os negócios nesse momento?
Eu acho que temos um efeito imediato. Mas o efeito mais nocivo não é agora. Uma política monetária com juros altos por cinco anos é perversa. Ela vai tirar competitividade. Além do endividamento muito elevado das empresas, da população como um todo, vai ser um problema mais sério. Já é. E vai ser pior, vai agravar. Nós estamos com uma crise encomendada para daqui a dois anos.
"Nós estamos com uma crise encomendada para daqui a dois anos"
E qual é o caminho para reduzir os juros e, por consequência, esse risco?
Nós temos que respeitar o Banco Central e dar condições para que ele venha a baixar a taxa de juros. E, infelizmente, não estamos dando essas condições. A culpa é nossa. O Banco Central não vai baixar na marra e espero que ele não faça isso. O que eu espero é que sejamos obrigados a criar esse cenário. Temos que fazer um esforço coletivo para consertar isso. A população não está sentindo o quanto os juros são nocivos para ela. E não lutamos por isso.
Em outra ponta, como enxerga a discussão entre ampliar as receitas versus cortar as despesas?
Nós já estamos no limite de uma taxa tributária elevadíssima. Não temos mais como subir os impostos. Chegamos no limite do limite do limite. Isso nunca deu certo, em lugar nenhum. Todos os países que fizeram isso, fizeram de forma errada, é só olhar os exemplos. Temos que melhorar a eficiência dos gastos. O Brasil é muito grande, cheio de mazelas. Isso é fato. Então, precisamos prover saúde e educação para a população. Sobre isso, não há dúvida. E o Estado pode muito, mas não pode tudo. Temos que balancear os gastos. Isso necessariamente terá que acontecer, mais cedo ou mais tarde.
E o que pode ser feito no âmbito do Estado?
O Bolsa Família e o Benefício de Prestação Continuada (BPC) consomem quase R$ 300 bilhões. Enquanto o Congresso fica brigando, às vezes, por R$ 30 bilhões. Não podemos acabar com o Bolsa Família e o BPC. Mas eles têm que ser mais eficientes. Tem muita gente que recebe e não precisa desses benefícios. E esse dinheiro não nasce em árvore. Então, precisamos fazer uma triagem nesses programas e repensá-los com uma certa urgência. Muita gente não vai gostar. Mas se não fizermos isso, não vamos aguentar.
Quais outros pontos seriam essenciais nesse contexto?
Temos que fazer a reforma administrativa. Nosso estado está muito pesado e as amarras hoje são muito fortes. Vou dar o exemplo da educação. No Norte de Minas, faltam recursos para educação, enquanto na região metropolitana de Belo Horizonte, sobra dinheiro. Então, a regra de investimento obrigatório engessa os municípios. Temos mais de 5 mil municípios e se faz a mesma regra para todos. Precisamos reequilibrar esses gastos com mais inteligência e eficiência.
"Sem um sacrifício, não vamos conseguir melhorar. Vamos ter que passar por um regime no Brasil. Quanto mais rápido e mais eficiente, mais indolor vai ser"
Mas vê condições para que essas e outras mudanças sejam implantadas?
Ainda não. Isso só vai acontecer quando toda a população estiver consciente que não é uma farra e que todos terão que fazer um sacrifício. Não é de um setor ou de outro, é de todos. Sem um sacrifício, não vamos conseguir melhorar. Vamos ter que passar por um regime no Brasil. Quanto mais rápido e mais eficiente, mais indolor vai ser. Se esperamos mais, vai ser pior.
Como chegar a esse consenso num cenário, como o senhor mesmo enfatizou, extremamente polarizado?
Vai acontecer. A população vai querer esse pacto. Ela já quer. Isso já está implícito. Se não fizermos esse pacto, vamos brigar. Eu te dou cinco socos, você me dá quatro. Os dois levaram nove socos. Então, nós estamos assim. Ninguém está ganhando, está todo mundo perdendo. Essa conta não fecha.
Mas quem pode liderar esse pacto?
Olha, mais uma vez, tudo passa pela política. Pelas lideranças políticas. E o Brasil está num momento ruim. As lideranças estão fracas e são poucas. Isso está na mão da população, porque é ela que elege os seus políticos. Nós precisamos dos políticos, mas precisamos ajudar os políticos. É o voto consciente. E eu acho que o povo brasileiro está querendo que esse pacto social aconteça. Não queremos mais disputa, queremos harmonia, acho que todo mundo. E quanto mais cedo isso vier, melhor.
O empresário Rubens Menin segue otimista?
Otimista eu sempre sou. Sei que estamos vendo um momento muito complexo, com muita dificuldade. E podemos até não estar no fundo do poço ainda. Podemos descer um pouco mais. O brasileiro é um povo feliz, mas não está feliz. O momento não é bom. Agora, eu acho que vamos voltar e sou otimista com o médio e longo prazo. Mas temos que fazer a nossa parte.