Em sua última reunião de 2023, a diretoria da Agência Nacional de Transportes Terrestres (ANTT) aprovou a mais profunda reformulação regulatória nos contratos de concessões de rodovias federais, com mudanças que poderão atingir os contratos atuais e futuros, caso as concessionárias demonstrem interesse de aderir ao novo modelo.
O objetivo é corrigir problemas contratuais da legislação que estava em vigor, que geraram defasagens tarifárias e de investimentos, em especial após a pandemia.
Com isso, a agência espera eliminar resistências e atrair investidores para as 13 concessões rodoviárias federais que o Ministério dos Transportes pretende oferecer em 2024, no qual espera arrecadar R$ 122 bilhões. Há, ainda, previsão de outros R$ 59,2 bilhões em investimentos.
Na reunião de quinta-feira, 21 de dezembro, a diretoria da ANTT aprovou o relatório final e encerramento da Audiência Pública nº 013/2022, que tratava do equilíbrio econômico-financeiro dos contratos de concessão rodoviária.
Após um longo processo de consultas presenciais em São Paulo e Brasília, a audiência pública colheu 43 sugestões e contribuições para o modelo proposto. Nenhum protocolo foi invalidado após análise da equipe técnica.
As principais mudanças se deram nas regras propostas de revisão contratual referentes à alocação de riscos, principal reivindicação das concessionárias e investidores.
Isso porque os contratos assinados não permitiam compensação financeira às concessionárias em caso de fatos posteriores à data da concessão que causassem prejuízo a empresa.
A ocorrência da pandemia foi um exemplo, pois diminuiu sensivelmente o tráfego rodoviário, afetando as receitas das concessionárias obtidas com pedágio e a viabilidade econômica dos projetos.
Para evitar a devolução das concessões, a ANTT consultou a Advocacia-Geral da União (AGU), que considerou a pandemia como fato superveniente e permitiu o reequilíbrio de contratos. Dessa forma, algumas concessões tiveram direito de reajustar as tarifas.
A nova norma vai incorporar esse tipo de risco em novos contratos. Entre as demais mudanças acolhidas, uma diz respeito ao leilão híbrido – pelo qual as empresas disputam o valor da tarifa e da outorga.
Em caso de empate na primeira, a disputa vai para o melhor valor de outorga, cujo montante poderá ser usado em casos supervenientes que possam afetar o equilíbrio do contrato assinado, sem ônus para os usuários.
Outra novidade refere-se ao controle do deságio no valor da tarifa. Como não havia limite para esse mecanismo, muitas empresas concediam deságios muito altos para vencer a disputa, o que mais à frente ocasionava problemas no fluxo de caixa.
Agora, os deságios da tarifa são limitados em cerca de 18%, sendo que o valor mínimo ficará atrelado a estudos que vão determinar um valor que não afete os investimentos previstos.
Também foi incorporada uma mudança na forma de classificação das concessionárias que poderão ter direito à revisão quinquenal, que passa a ser atrelada à fiscalização.
O objetivo é facilitar o processo, com a agência levantando ao longo de todo o período prévio à revisão quais são as necessidades de melhoria na rodovia.
Segurança Jurídica
Outras duas alterações aprovadas, que eram defendidas por especialistas por oferecer maior segurança jurídica aos contratos, dizem respeito à questão do acionamento do seguro nas rodovias e à troca de controle de uma concessão antes do fim do contrato.
Em relação ao seguro, a legislação anterior dificultava a agência de acionar os seguros previstos nos contratos em casos de inadimplência.
No caso de obras previstas, os seguros contratados pelas concessionárias passam a ter cláusulas que permitam o step in, mecanismo pero qual a seguradora assume a obra e contrata uma nova empreiteira para finalizá-la para evitar o pagamento do seguro pela inadimplência.
Já as trocas de controle da concessionária criam regras que abrem caminho para que os financiadores da concessão assumam temporariamente o controle da empresa para que a concessão possa seguir.
A nova norma também prevê a troca de controle durante o contrato de concessão, semelhante ao que foi usado para que a concessão da BR-163/MT fosse transferida da OTP (Odebrecht TransPort) para a MT Par, que assumiu a rodovia após uma remodelagem dos investimentos previstos no contrato.
Investimentos
Com as mudanças nos contratos, o governo federal espera evitar o fiasco de 2023, quando conseguiu aprovar a concessão de apenas dois lotes de rodovias no Paraná, que somam cerca de 1 mil quilômetros. Já o leilão da BR-381, em Minas Gerais, não teve interessados.
Além da insegurança dos contratos, as empresas interessadas em concessões reclamaram da questão dos custos financeiros, agravados com o ciclo de inflação e juros elevados, o que explica o baixo número de interessados em disputar os ativos.
A expectativa é que os 13 leilões agendados para 2024, que somam 7 mil quilômetros de rodovias federais, tenham procura maior. Todos os contratos terão 30 anos de duração.
Além dessas concessões, oito processos em fase de estudo - e sem data prevista para ir a licitação --somam mais 10 mil quilômetros de rodovias pedagiadas.