Não são apenas produtores estrangeiros que estão sendo impactados com o início de vigência da tarifa de 25%, implementada pelo presidente Donald Trump, sobre aço e alumínio importados. O setor automotivo do próprio Estados Unidos deverá ser fortemente atingido pela guerra comercial global travada pela Casa Branca com o resto do mundo.
Criada por Henry Ford em 1903, a companhia americana já faz contas de quanto o tarifaço irá refletir no resultado financeiro. O símbolo desse risco está justamente na picape mais popular do país, o Ford F-150, considerado a principal alavanca de geração de lucro para a montadora.
A questão é que os itens taxados são fundamentais para a fabricação dos veículos. Aço e alumínio respondem por 50% dos materiais necessários para colocar em prática a linha de montagem. E a perspectiva é de que esse custo extra seja repassado aos consumidores, afetando diretamente a economia local.
Caso, de fato, Trump não volte atrás sobre a incidência do imposto, como tem feito sobre a cobrança extra para Canadá e México, e que entrou em vigor nesta quarta-feira, 12 de março, as novas medidas poderiam acarretar um aumento de US$ 400 no custo de produção do veículo, segundo pesquisa do banco britânico Barclays.
O dilema da indústria automotiva americana está no fato de que, cada vez mais, o alumínio vem sendo usado na carroceria externa dos automóveis e, desse montante, a maior parte vem de produtos importados.
No caso da picape F-150, a Ford passou, há pelo menos uma década, a revestir quase todo o exterior com alumínio, incluindo capô, portas e caçamba, justamente para diminuir o peso e aumentar a eficiência do combustível. Tudo isso em uma equação que vem se mostrando, até aqui, extremamente vantajosa financeiramente para a empresa.
Não à toa, o CEO da Ford, Jim Farley, tem sido uma das vozes mais fortes contra as tarifas. “Trump falou muito sobre fazer a indústria automobilística mais forte, trazendo mais produção para cá, mais inovação. Até agora, estamos vendo apenas mais custos – e muito caos”, disse ele, em fevereiro.
Até para avaliar o impacto da medida de Trump, criticada interna e externamente, a Ford vinha atuando com fornecedores para aumentar o estoque de alumínio em suas fábricas. Ainda que a maior parte dessas chapas venha de empresas americanas, os fornecedores da montadora dependem de fundições do Canadá para garantir que o material chegue mais acabado.
Não fosse o adiamento da cobrança extra de importação para os produtos canadenses e mexicanos, que devem fazer com que o alumínio do país vizinho chegue com tributação de 50%, o cenário atual poderia ser ainda mais desastroso e preocupante para o setor. A nova data anunciada por Trump é 2 de abril.
Quem vai pagar a conta
“Embora estejamos trabalhando para encontrar compensações para o custo adicional, isso será difícil”, disse um porta-voz da Ford ao The Wall Street Journal. Para o executivo, seriam necessários muitos anos para que a cadeia de suprimentos fosse novamente reestruturada, a ponto de garantir que o alumínio fosse produzido em solo americano.
De uma forma geral, o aço corresponde a quase metade do peso de um veículo, e o alumínio, 13%. O que analistas do setor automotivo têm dito é que a taxação do aço poderá ser mais administrável do que o impacto do novo preço do alumínio, porque as montadoras compram a maior parte do aço utilizado de empresas americanas. Para a Ford, 90% do aço usado em seus carros vêm de fornecedores dos Estados Unidos.
Mas será inevitável que essa conta não seja repassada no preço do produto. “No final das contas, o consumidor vai pagar”, diz Bertrand Rakoto, líder global de práticas automotivas na empresa de consultoria Ducker Carlisle. Segundo ele, hoje os fornecedores e montadoras já vêm discutindo sobre quem irá absorver esses custos adicionais.
Não é a primeira vez que o setor sente os efeitos das decisões de Donald Trump em querer frear a entrada de produtos de outros países. Em 2018, no primeiro mandato do atual presidente, o preço tanto de aço quanto de alumínio atingiu índices que seriam considerados em uma década, só que em poucos meses.
No período, a General Motors chegou a dizer que os custos extras tinham sido o principal fator para o aumento das despesas, que atingiu o lucro líquido em US$ 1 bilhão. A Ford também chegou a reportar impacto semelhante na lucratividade, justamente pela mão pesada de Trump sobre os países.