A economia sempre foi um tema prioritário nas campanhas presidenciais dos Estados Unidos. O fato de a economia americana estar passando por um período turbulento – com um ciclo de inflação e juros elevados inédito há 30 anos, efeito do impacto global da pandemia –, porém, mudou o jogo.

Sem pestanejar, os dois candidatos à Casa Branca – a democrata Kamala Harris e o republicano Donald Trump – estão abusando do discurso populista em temas econômicos, para abocanhar votos de uma população cansada do aumento de preços e dos juros altos.

A julgar pelo que já foi divulgado pelos dois candidatos, prevalecem promessas vagas e de difícil implementação – seja por depender do Congresso americano, que deve manter o rigoroso equilíbrio atual de cadeiras após a eleição de novembro; do Federal Reserve (Fed, o banco central dos EUA), que conduz a política monetária; ou da própria lógica que move a economia.

Economistas advertem que, mesmo se de fato saírem do papel, boa parte das promessas dos dois candidatos tende a elevar ainda mais a dívida pública dos EUA, que está em US$ 34 trilhões, atingindo a proporção de 99% em relação ao Produto Interno (PIB) – próximo do nível recorde da relação dívida/PIB de 106%, registrado em 1946, após a Segunda Guerra.

Nem Harris nem Trump, até agora, tocaram na questão do déficit. A candidata democrata tem a vantagem de ter um amplo espaço na mídia nos próximos dias para detalhar suas diretrizes e até anunciar outras promessas.

A partir desta segunda-feira, 19, tem início a Convenção Nacional Democrata, que vai até quinta-feira, 22. A convenção vai confirmar a chapa formada por Kamala Harris, como candidata a presidente, e Tim Walz, o governador de Minnesota que foi escolhido para ser vice.

Veja a seguir as principais propostas econômicas dos dois candidatos, separadas por tópicos, e o impacto que podem causar:

Controle de preços

Os dois candidatos deixaram os economistas de cabelos em pé com suas propostas de combater o efeito mais visível da inflação americana – o aumento de preços dos produtos.

No palanque, Harris culpou a “ganância corporativa” das grandes redes de supermercados, que, segundo ela, viram os seus custos de produção diminuir, mas mantiveram os preços elevados. E sugeriu uma “proibição federal” da manipulação de preços em um esforço para atingir as empresas e reduzir os preços dos alimentos.

Trump criticou os “controles comunistas de preços" sugeridos pela adversária, mas foi na mesma linha, ao anunciar que planeja assinar uma ordem executiva no seu primeiro dia, caso volte ao Salão Oval, orientando todos os chefes de agências e secretários de gabinete a “usar todas as ferramentas e autoridades à sua disposição para derrotar a inflação e reduzir os preços ao consumidor”.

O tema, porém, deve sumir dos discursos dos candidatos após a eleição. Um estudo divulgado em maio pelo Fed de São Francisco encontrou poucas provas de que o aumento dos preços tenha sido o principal culpado do aumento da inflação. Além disso, inflação caiu recentemente para menos de 3%, abrindo caminho para o Fed reduzir as taxas de juros em setembro deste ano.

Aumento de tarifas

O tema é prioritário na campanha de Trump. O candidato republicano promete impor uma tarifa de 10% sobre todas as importações feitas pelos EUA – para as importações chinesas o índice é ainda maior, 60%.

Seu argumento é que as novas tarifas trarão de volta empregos e aumentarão as receitas para o país. Mas a agência de risco Moody’s estimou que as propostas comerciais de Trump custariam 675 mil empregos, agravariam a inflação e reduziriam o PIB do país em 0,6 ponto percentual.

Embora Harris não tenha falado especificamente sobre seus planos comerciais, a administração Biden-Harris manteve em vigor muitas tarifas da era Trump e aumentou algumas delas, em especial das importações chinesas – os carros elétricos made in China, por exemplo, foram taxados em 100%.

Biden também triplicou as tarifas sobre o aço chinês de 7,5% para 25%, “para proteger os produtores americanos”. Harris ainda deve detalhar seus planos para este tema, mas o fato é que os dois candidatos pretendem aproveitar o impacto positivo causado pela guerra comercial EUA x China entre o eleitorado.

O que Trump e Harris evitam discutir é o custo desse protecionismo – que poderá chegar a US$ 500 bilhões adicionais por ano aos consumidores.

Impostos

Esse é um tema que os candidatos fazem promessas sem levar em conta o impacto na dívida pública, que aumenta conforme cai a arrecadação tributária.

Harris prometeu cancelar US$ 7 bilhões em dívidas médicas de até 3 milhões de americanos qualificados e planeja pressionar o Congresso a tornar permanente um crédito fiscal de US$ 3.600 por criança.

Disse ainda que seu governo expandirá os créditos fiscais para quem compra uma casa pela primeira vez e “fará pressão” para construir 3 milhões de novas unidades habitacionais em quatro anos. Harris também se comprometeu em não aumentar os impostos sobre quem ganha menos de US$ 400 mil por ano.

Trump, por sua vez, promete estender os cortes de impostos que sancionou em 2017. O pacote reduziu a alíquota do imposto corporativo de 35% para 21%. A ideia é reduzir ainda mais a taxa – para apenas 15% – e revogar quaisquer aumentos de impostos que ocorreram sob Biden.

Assim como as propostas de Harris, as do ex-presidente dependem de aprovação do Congresso. Além disso, os cortes de impostos feitos por Trump em 2017 vão expirar no fim de 2025. No modelo atual, sem as promessas feitas pelos dois candidatos, uma renovação desses cortes vai acrescentar mais de US$ 3,8 trilhões à dívida pública durante a próxima década.

Imigração

Apesar do forte apelo político do tema, as medidas para conter a imigração ilegal ameaçam causar impacto na economia americana.

Trump é o candidato mais empenhado em explorar o assunto em seus comícios. O ex-presidente promete organizar a maior deportação doméstica da história dos EUA, expulsando todos os imigrantes ilegais – uma operação que poderia envolver campos de detenção e a Guarda Nacional.

Também sinalizou que vai deportar pessoas que estão legalmente nos EUA, mas que nutrem “simpatias jihadistas”, e acabar com a cidadania por nascença para pessoas nascidas nos EUA cujos pais estão no país ilegalmente. Trump acusa Harris e o governo Biden pelo agravamento da crise imigratória.

A candidata democrata diz apoiar uma reforma abrangente da imigração, procurando caminhos para a cidadania para os imigrantes nos EUA sem estatuto legal, com um caminho mais rápido para os jovens imigrantes que vivem ilegalmente no país e que chegaram quando crianças.

Uma análise do Instituto Peterson de Economia Internacional prevê uma queda de 2,1% no PIB americano com a eventual deportação de 1,3 milhão de imigrantes ilegais. Há também o temor de aumento da inflação, pois a deportação da mão de obra que atua no setor de serviços vai gerar aumentos nos salários.