O Brasil voltou! Emblemático sobre a necessidade de reposicionamento do Brasil no cenário internacional, o mantra lançado pelo presidente Lula logo após sua vitória nas urnas em 2022 poderia ecoar com força nos próximos dias com a instalação do Fórum Econômico Mundial, em Davos, Suíça – o primeiro evento global de peso de 2024. Mas é improvável que isso aconteça.
Entre 15 e 19 de janeiro, o Fórum reunirá centenas de participantes entre lideranças políticas, ministros de Estado, empresários, banqueiros, investidores e acadêmicos sob o lema “Reconstruindo a Confiança”.
A pauta das discussões deverá focar em mudança climática, segurança global, criação de empregos e desenvolvimento da inteligência artificial. Esses temas, caros também ao governo Lula, não parecem suficientes, porém, para justificar uma robusta representação do Brasil nos Alpes Suíços. A perspectiva é de uma representação discreta – se houver.
O presidente Lula, dedicado a uma intensa agenda internacional em 2023, não participou do Fórum naquele ano e não deverá comparecer na atual edição.
O ministro Fernando Haddad, que representou o Brasil em 2023 junto com a ministra do Meio Ambiente e Mudança Climática, Marina Silva, tampouco marcará presença, confirmou ao NeoFeed, o Ministério da Fazenda.
Após brevíssimo período de descanso, iniciado em 2 de janeiro e interrompido no dia 8 pelo ato “Democracia Inabalada” – evento que marcou um ano dos ataques às sedes dos Três Poderes em Brasília – Haddad voltou às férias e retomará sua rotina, na segunda-feira, 15 de janeiro.
Se, de um lado, a ausência do ministro no Fórum Econômico revela foco em negociações com o Congresso pela reoneração da folha de pagamentos de 17 setores da economia que encontra franca resistência entre os parlamentares; de outro, sua ausência é um ponto “contra” o Brasil.
O País perderá a oportunidade de apresentar à elite financeira internacional um inventário de realizações econômicas que marcaram o primeiro ano do governo. E tem, no ministro, o protagonista de avanços que, um ano atrás, não passavam de acenos à qualificada audiência do Fórum.
Em janeiro de 2023 – uma semana após os ataques em Brasília e com o Programa de Recuperação Fiscal na bagagem – Haddad desembarcou em Davos. Foi portador de mensagens política, econômica e ambiental que reverberaram nos meios econômicos em meio à perplexidade geral quanto aos ataques de 8 de janeiro.
O ministro declarou, em Davos, o compromisso do Brasil com a democracia dentro e fora de suas fronteiras e com a retomada do crescimento com sustentabilidade fiscal e ambiental, e com justiça social. Linha mestra de discursos proferidos por Lula mundo afora – antes e após Davos.
Defesa solitária do déficit zero
Apesar da agenda apertada, Haddad reuniu-se, durante o Fórum em 2023, com representantes de empresas multinacionais interessadas em investir no País e com o secretário-geral da OCDE – Organização para a Cooperação do Desenvolvimento Econômico e Social – vista como um clube de países ricos junto ao qual o Brasil poderá estar posicionado.
Há dois anos, em janeiro de 2022, o Brasil recebeu – e aceitou – o convite da OCDE para iniciar o processo de acessão ao organismo. E foi reconhecido por ser o país não-membro participante do maior número de projetos e ter aderido a um elenco de instrumentos legais promovidos pela Organização.
Nada trivial, o processo encarado pelo Brasil é oportuno, inclusive, pela bem-sucedida reinserção do País no cenário internacional e por deter a inédita (e relevante) presidência do G20 neste ano.
A esse grupo das 20 nações mais industrializadas e emergentes do planeta – parte delas representadas na OCDE – interessa o saldo das iniciativas do governo brasileiro que culminaram com a Reforma Tributária, a constituição do arcabouço fiscal e uma série de medidas arrecadatórias, ainda que a um elevadíssimo custo de emendas parlamentares.
E o saldo do 1º ano de Lula 3 é considerável. A ser apresentado em março, o Produto Interno Bruto (PIB) de 2023 deverá crescer bem mais que o esperado. Juntam-se a esse resultado, o consistente desempenho do mercado de trabalho; a revisão para melhor da perspectiva e rating do País por agências de avaliação de risco de crédito; o fortalecimento exemplar do superávit comercial; a queda da inflação e o corte da taxa de juro.
O balanço fiscal ficou devendo. Informação recém-divulgada remete a déficit primário consolidado do setor público de R$ 37,3 bilhões em novembro, acima das projeções mais pessimistas. Em 12 meses, o rombo alcançou R$ 131,4 bilhões ou 1,22% do PIB. Revisões foram promovidas. Inicialmente, porém, o governo estava comprometido com déficit inferior a R$ 100 bilhões, em 2023.
Para 2024, a Fazenda persegue déficit zero. E ensaia atribuir ao Congresso a quase certa mudança da meta fiscal, caso os parlamentares rejeitem de vez o restabelecimento da taxação da folha de pagamentos – questão que catalisará a atenção do mercado financeiro e do meio empresarial nos próximos dias.
Ausente em Davos, Haddad escapará de explicações sobre a perspectiva, considerada líquida e certa, de desequilíbrio fiscal se insistir no déficit zero. Isso não exclui, contudo, a possibilidade de ser cobrado – dentro e fora do Brasil – pelo compromisso pouco factível. Solitariamente defendido.