O governo completa 100 dias na segunda-feira, 10 de abril. A data será marcada por uma reunião ministerial para avaliação das medidas já anunciadas e sinalização do plano de voo para os próximos meses. O “presente” chegará com um dia de atraso e o portador será o Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE).
O órgão divulgará na terça-feira, 11 de abril, o Índice de Preços ao Consumidor Amplo (IPCA) de março e a inflação brasileira deve cair abaixo de 5% em 12 meses pela primeira vez em mais de dois anos.
O indicador deve avançar 0,73% no mês e 4,67% em 12 meses, estima a LCA Consultores. A taxa anualizada será a menor desde janeiro de 2021, quando cravou 4,56%. Embora inferior ao teto da meta, de 4,75%, o índice ainda ultrapassará, em muito, a meta central de 3,25% definida para este ano.
A inflação abaixo de 5% poderá engrossar o coro contra a taxa de juro. Mas o resultado será insuficiente para que o Banco Central (BC) altere a sinalização de que a Selic deverá permanecer em 13,75% por tempo prolongado.
“Cabe ao BC entregar a meta, está na lei, e nós vamos perseguir a meta”, afirmou o presidente da instituição, Roberto Campos Neto, durante participação no Bradesco BBI Brazil Investment Forum, na quarta-feira, 5 de abril.
A percepção de que a taxa básica segue firme leva em conta a expectativa de que o declínio da inflação é transitório. Decorre de um efeito estatístico já mencionado neste espaço.
O indicador recuará no cálculo em 12 meses, graças à substituição de variações mensais mais elevadas do IPCA nos primeiros meses de 2022 por variações menores neste ano. Esgotada a troca, a inflação volta a superar 5%.
Não à toa, a inflação oficial esperada para 2023 segue flertando com 6% – patamar que, pela cartilha do BC, justifica manter o aperto monetário em curso há dois anos.
A favor de Campos Neto na defesa da política de juro está o processo de desinflação. Em abril do ano passado, o IPCA acumulava alta de 12,13%. O índice de março, que sai na terça, deve confirmar a queda a menos da metade.
Entretanto, parte dessa queda também refletiu a desoneração dos preços dos combustíveis – medida tomada em março do ano passado pelo governo Bolsonaro em busca da reeleição. A isenção expirou em 31 de dezembro, mas foi renovada por 60 dias, para gasolina e etanol, pelo atual governo.
A favor do presidente Lula e das críticas disparadas contra o BC está o fato de o juro nas nuvens – e por tanto tempo – minar a atividade e ameaçar seu fortalecimento. O crescimento que Lula almeja entregar fica comprometido.
As projeções do PIB
Na última edição da Focus, publicada em 3 de abril e subscrita por mais de 100 contribuidores, a projeção mediana para o PIB deste ano permaneceu em 0,90% e, para 2024, em menos de 1,50%.
XP e Santander Brasil atualizaram cenários na quinta-feira, 6 de abril. E as indicações não são animadoras. A XP vê expansão de 1% em 2023 e 2024. O banco Santander prevê 0,8% para este ano e 0,5% para o próximo.
Essas projeções vão de encontro à “obsessão” do governo por crescimento, expressão citada por Lula na reunião ministerial de 3 de abril. Na abertura do encontro, o presidente apontou o crescimento econômico como condição essencial para o bem-estar dos brasileiros.
Torna-se cada vez mais evidente que o governo enfrentará um dilema no curto prazo: bombar a atividade ou controlar a inflação perseguindo as metas.
A ideia de que é possível conviver com um pouco mais de inflação – tese defendida pela Fazenda nos primeiros mandatos de Lula em contraste com a postura do BC de Henrique Meirelles – eleva a probabilidade de revisão das metas pelo Conselho Monetário Nacional.
Na terça-feira, 4 de abril, o ministro da Fazenda, Fernando Haddad, disse, durante o fórum do Bradesco BBI, não desejar antecipar a discussão sobre a meta de inflação “até a reunião que discute isso”.
Na quinta-feira, 6 de abril, o presidente Lula dispensou rodeios e, em café da manhã com jornalistas, afirmou: “Se a meta está errada, muda-se a meta”.
É na reunião realizada em junho que o Conselho define a meta para três anos à frente. Neste ano, será definida a meta de inflação de 2026. E as metas de 2024 e 2025 poderão ser reavaliadas.
Essa possibilidade contribui para reduzir os ataques do governo contra o BC, mas Lula tem carta-branca para brigar por juro mais baixo. Pesquisa Datafolha revelou que 80% dos brasileiros consideram que o presidente age bem ao pressionar o BC pela queda da taxa.
Lula na China
Juro e crescimento são temas que não vão sair da agenda econômica e tampouco da agenda política, mas poderão hibernar na próxima semana de envio do arcabouço fiscal ao Congresso e da viagem de Lula à China.
Lula embarca na terça-feira, 11 de abril, deve retornar ao país no domingo, 16 de abril, e com pelo menos 20 acordos comerciais assinados. O ponto alto da visita será o encontro com o presidente Xi Jinping.
Por aqui, a atenção estará voltada ao texto do novo arcabouço fiscal. O marco fiscal poderá ser encaminhado com a Lei de Diretrizes Orçamentárias e um conjunto de medidas arrecadatórias para garantia de execução de superávit primário nas contas públicas.
Em sucessivas exposições nos últimos dias, o ministro da Fazenda esclareceu que o governo precisa ampliar a receita entre R$ 100 bilhões e R$ 150 bilhões. Mas garante que não haverá aumento de impostos.
O governo pretende corrigir distorções na cobrança da Contribuição sobre Lucro Líquido (CSLL), combater o que Haddad chama de “contrabando” em comércio online e taxar apostas em jogos eletrônicos.
Embora economistas estejam reticentes quanto as premissas embutidas na construção do marco fiscal, o anúncio da proposta produziu reações positivas.
Gestores e investidores aguardavam ansiosamente o posicionamento do governo, inclusive, para coroar o alívio da tensão que imperou em março, quando os mercados foram sacudidos pelo risco de crise bancária nos Estados Unidos e Europa. A crise não se confirmou, mas o crédito ficou mais apertado e os bancos mais cautelosos.
Neste início de abril, a percepção é de que essa cautela, somada a indicadores que apontam desaceleração da economia americana, leve o Federal Reserve (Fed) a abreviar a alta da taxa de juro já na reunião de 3 de maio.
Essa expectativa é forte o bastante para desvalorizar o dólar ante as principais moedas. No Brasil não é diferente. Com Fazenda e BC exibindo entendimento, o real se fortalece e ensaia romper o suporte de R$ 5 por dólar.