2024 não será fácil afirmam em uníssono economistas em revisões de cenário que brindam a abertura do ano. A cautela é compreensível. É arriscado, porém, descartar dias melhores para a economia doméstica porque boa parte da insegurança atual reflete variáveis externas sobre as quais o governo brasileiro e o setor privado não têm controle.

A continuidade da guerra Rússia-Ucrânia, o conflito Israel-Hamas e os ataques dos rebeldes Houthis, do Yêmen, a cargueiros no Mar Vermelho com a escalada de contra-ataques de potências ocidentais – além do ciclo eleitoral que levará à troca de presidentes em dezenas de países – elevam riscos de desestabilização política e econômica. Por tabela, a um aumento de volatilidade nos mercados.

Adicionam incerteza ao contexto geopolítico e conspiram para menor crescimento econômico e resistência da inflação, condições financeiras apertadas e efeitos do El Niño que se estendem até abril e La Niña, que terá efeito predominante no segundo semestre.

Com impacto nas águas do Atlântico e do Pacífico, alteração extrema de temperatura e mudança nos regimes de chuvas, a dupla de fenômenos climáticos ameaça safras agrícolas, o comércio exterior e o orçamento de famílias por preços de alimentos em alta.

A inflação declina, mas resiste. E mantém bancos centrais de sobreaviso porque as metas, que orientam as políticas monetárias, não foram atingidas e repiques não são desconsiderados.

Até por isso, cresce a expectativa com o posicionamento dos maiores bancos centrais do mundo que – não necessariamente – cortarão no curtíssimo prazo juros que seguem nos maiores níveis em décadas e abatem as economias.

Declarações de representantes do Federal Reserve (Fed) e do Banco Central Europeu (BCE) no Fórum Econômico Mundial em Davos, Suíça, deprimiram, nos últimos dias, preços dos ativos financeiros ao considerarem precipitada a discussão sobre a redução das taxas básicas.

Christine Lagarde, também em Davos, na quarta-feira, 17 de janeiro, deu um sopro de esperança, que não durou. A chefe do BCE acenou com corte do juro no meio do ano, mas avisou que o processo não será agressivo como o mercado espera.

E a soma das declarações elevou a expectativa com a reunião de política monetária do banco na quinta-feira, 25 de janeiro, que abrirá o calendário de decisões que vão culminar, no dia 31, com a definição de juro pelo Fed – em data coincidente com a do Banco Central do Brasil.

É certo que o Copom cortará mais uma vez a Selic em 0,50 ponto percentual. Quanto aos gigantes Fed e BCE há torcida para que ambos explicitem perspectiva de alívio em seus comunicados. Se Jerome Powell for positivo – mesmo sendo cauteloso como Lagarde –, a vida melhora.

FED e mercados de olho no PIB

Entretanto, há uma variável, a ser conhecida também na quinta, 25 de janeiro, que poderá influenciar e muito a decisão do Fed: o resultado da primeira estimativa (de três) para o PIB dos EUA no quarto trimestre de 2023.

No trimestre anterior, a economia americana cresceu anualizados 4,9%. O resultado no quarto trimestre poderá ficar abaixo de 2%, apontando forte desaceleração, calculam analistas. É altamente provável que o Fed ajuste seu discurso ao dado e ao índice de preços que o acompanha. E uma reação dos mercados é dada como certa. Para o bem ou para o mal.

Por aqui, o cenário é mais favorável após as vitórias do governo no Congresso em medidas que elevam a arrecadação. E indicadores recém-divulgados, sobretudo de vendas no varejo, elevaram o otimismo com o PIB do quarto trimestre, que poderá escapar do vermelho.

O recesso do Legislativo também amainou uma perturbadora tensão política, flagrante semanas atrás, quando o azedume nas relações entre o Executivo e o Congresso chegou ao ápice com a decisão do governo de reonerar a folha de pagamentos de 17 setores – contrariando a lei pela desoneração até 2027 proclamada em 28 de dezembro.

O Ministério da Fazenda e os chefes do Senado e da Câmara estudam pontos de convergência que poderão levar à reoneração da folha em prazo mais alongado, beneficiando de alguma forma os setores envolvidos e os cofres da União. Resta saber quem vai capitalizar o resultado – se Fernando Haddad ou o Congresso.

É fato que alívio na tensão política contribui para a melhora de humor dos investidores. No entanto, faltam “gatilhos” para uma necessária correção de expectativas ainda não tão favoráveis.

Por ora, revela a Focus, o PIB de 2024 está longe de reprisar a expansão de quase 3% esperada para 2023; a inflação projetada segue bem acima da meta; e a Selic cairá, mas a conta-gotas.

Exemplo do poder dos “gatilhos”, em agosto do ano passado, dois foram disparados e promoveram importantes correções: o corte da Selic e a aprovação do arcabouço fiscal.

Resultado: a previsão para o PIB de 2024 avançou de 1,2% em junho para 1,5% em setembro. Na última edição da Focus, a estimativa era de 1,59%. A projeção para a Selic deste ano rondava 10%, caiu a 9,5%, a 9,25% e está cravada em 9%. Há semanas.

Crescem as apostas na possibilidade de a Selic cair mais, contribuir para o barateamento do crédito, impulsionando investimentos. Contudo, um movimento consistente nesse sentido depende de novos “gatilhos” – preferencialmente que renovem o compromisso do governo com a redução da dívida e o equilíbrio fiscal. Expectativas positivas por aumento na arrecadação estão com dias contados.