A inflação brasileira é o principal indicador econômico no pipeline na primeira semana “cheia” de outubro e dividirá atenções com a possível votação da MP que prevê tributação de ativos financeiros e do projeto de Lei Diretrizes Orçamentárias (LDO) de 2026 – ambas previstas para terça-feira, 7.
A tributação de investimentos é vital para o caixa do governo nesse ano e no próximo. A LDO, ainda na Comissão Mista do Orçamento, é base para a confecção do Orçamento no eleitoral 2026.
No calendário externo, a Ata do Fed, na quarta-feira, 8 de outubro, poderá agitar os mercados, a depender da sinalização sobre cortes de juro se o shutdown do governo americano não minar a agenda. O IPCA de setembro será conhecido na quinta-feira, 9 de outubro, e deverá reforçar a percepção de que Selic a 15% freia a atividade sem levar a inflação à meta de 3%.
Antecipado pelo IPCA-15, o IPCA de setembro sairá de território negativo, de 0,11% em agosto decorrente de abatimento nas contas de luz, para cerca de 0,50% pelo rebote desse abatimento. Ritmo que, se confirmado, vai manter o índice no patamar interanual de 5% pelo oitavo mês consecutivo. Mas nem tudo é tão ruim quanto parece.
A determinação do Banco Central em frear a inflação trará “dividendos” sobretudo a partir de 2026. Mas um efeito positivo de preços menores, ainda que não por esforço monetário, já foi sentido – a confiança de consumidores saiu do vermelho.
Salgada, a inflação geral não contribui com expectativas favoráveis. Entretanto, a queda da inflação dos alimentos em domicílio reveste de algum otimismo o sentimento de consumidores que percebem no bolso a diferença e esperam melhora no futuro. Empresários, por sua vez, apostam na sustentação da demanda pelo mercado de trabalho e programas sociais que transferem renda à população ou liberam orçamento.
Resultado: a bateria de índices de confiança que patinaram no vermelho por um, dois e até três meses migraram para o azul em setembro, aponta o FGV Ibre. Apesar da alta da Confiança do Consumidor, Construção, Indústria, Comércio, Serviços e Empresas, os dados estão distantes da neutralidade, mas acusaram melhora.
É precipitado afirmar que a tendência positiva está instalada. Porém, vetores econômicos e políticos encadeados em setembro desanuviaram o ambiente.
Entre os eventos políticos destacaram-se o julgamento do ex-presidente Jair Bolsonaro; manifestações contra a PEC da Blindagem e anistia; enfática defesa da soberania nacional pelo presidente Lula; postura menos belicosa de Lula contra Trump; e a “excelente química” que pintou entre os dois presidentes na ONU reconhecida por ambos e que poderá levar a entendimentos na seara comercial diminuindo, talvez, a pressão que o aumento de tarifas impôs às empresas.
A “bola” estará com o BC em 2026
“A melhora da avaliação do governo, vista nos últimos meses tem gatilhos políticos e econômicos. Na economia, uma relevante redução da inflação de alimentos em domicílio ocorreu. Continuidade de uma tendência iniciada em junho, após meses de altas consideráveis de preços que pesaram na popularidade do governo”, avalia Alessandra Ribeiro, sócia e diretora de Macroeconomia e Política da Tendências Consultoria.
Ao NeoFeed, a economista lembra que a alimentação no domicílio acumulou três meses seguidos de deflação e o quarto deve ser confirmado com o IPCA de setembro.
“Por conta do bônus de Itaipu, que propiciou a redução da conta de luz, o IPCA de agosto também foi negativo. E o comportamento desses preços, que favorece a população em geral, beneficia particularmente as famílias de menor renda”, afirma Ribeiro que destaca a dinâmica do mercado de trabalho como outro vetor favorável ao consumidor.
“O mercado de trabalho dá sinais tênues de desaceleração, mas há criação de vagas e a renda continua subindo. A sensação, portanto, é de mercado de trabalho muito aquecido. Entretanto, há vetores negativos a considerar neste momento e que tendem a se agravar. O crédito já está mais limitado, o custo das operações está alto e a inadimplência crescendo. Não só a bancária.”
A economista avalia que esses fatores exigem atenção porque maior confiança baseada em expectativas – percepção de futuro melhor – pode resultar em frustração e, portanto, perda de confiança mais adiante. Contudo, ela pondera que, apesar da dinâmica da economia e indicadores antecedentes apontarem desaceleração, “a economia crescerá menos, mas seguirá crescendo”.
A Tendências projeta expansão de 2,2% para o PIB em 2025 e 1,6% em 2026. No ano que vem, a indústria seguirá desaquecendo, assim como os serviços e o agro. Nesse caso, sobre uma base histórica. Ribeiro considera equivocada, porém, a ideia de que gastos inerentes às eleições de 2026 – para presidente, vice-presidente, governadores, senadores e deputados federais e estaduais – compensarão a perda de dinamismo da economia.
O consumo das famílias, lembra, está na casa de 64% do PIB, enquanto gastos do governo representam 19%. Ainda que cresçam, as cifras são incomparáveis.
Para a Tendências, o cenário é claro. “A economia continuará perdendo tração. Não crescerá 2,2%, mas 1,6%. A taxa de desemprego não estará na mínima histórica, mas deverá rondar 6,6% e continuará abaixo da neutra. A massa de renda não vai crescer 6,5% acima da inflação como nesse ano, mas subirá 3,5%”.
Importante, diz Ribeiro, a inflação deve cair e abrir espaço para corte do juro. “Ainda que as métricas do crédito, de famílias e empresas, continuem desacelerando e com inadimplência em alta, que também afeta a atividade econômica, no final de 2026, o juro menor já estará fazendo diferença para melhor no serviço financeiro das famílias. Não é exagero acreditar que, em 2026, a bola estará com o BC”, pontua.