Na porção ocidental da península de Sicklaön, ao sul de Estocolmo, o bairro de Sickla está em obras. Uma construção gigantesca, mas surpreendentemente silenciosa e limpa — sem cimento, concreto ou aço; sem britadeiras, betoneiras ou réguas vibratórias. Naquela área de 250 mil metros quadrados, ergue-se uma nova “cidade”.
Mas não uma cidade qualquer… Stockholm Wood City, como o próprio nome sinaliza, é uma cidade de madeira — certificada, claro. Sob o comando da empresa de desenvolvimento urbano Atrium Ljungberg, ao custo de US$ 1,25 bilhão, o empreendimento promete ser o mais ousado projeto de arquitetura sustentável do mundo.
Pautados pela elegância minimalista do design escandinavo, os trabalhos em Sickla começaram em outubro de 2024 e, pelos próximos dois anos, está previsto o lançamento de 7 mil escritórios e 2 mil moradias, distribuídos em 25 quarteirões. Batizada Nobelberget, a área residencial é a mais avançada. Um de seus distritos, o Kravarter 7, deve ser entregue entre dezembro de 2025 e março de 2026.
Os 80 apartamentos do condomínio têm de 25 a 156 m², com um a sete quartos, custam entre US$ 300 mil a US$ 850 mil. Pés-direitos altos, varandas e janelas generosas para permitir a entrada de luz natural, as unidades dão para um pátio de convivência, com jardins caprichados.
Das colunas, vigas e lajes aos pisos, tetos e escadas, tudo em Stockholm Wood City é feito com madeira engenheirada. Dos tipos MLC ou CLT, a depender do modo como as lâminas são dispostas umas sobre as outras, o novo material tem a rigidez, a durabilidade e a resistência ao fogo do aço.
Graças à inovação, ao substituir o uso da liga metálica e, consequentemente, do cimento por madeira, a obra ganha celeridade — e, o mais importante, sustentabilidade.
Stockholm Wood City está sendo levantada a um ritmo de mil metros quadrados por semana. Com os materiais tradicionais, os trabalhos demorariam o dobro do tempo. Nos cálculos da Atrium Ljungberg, a agilidade compensaria os custos, em média, 20% superiores das construções com MLC e CLT, já que os imóveis podem ser ocupados, alugados ou vendidos mais rapidamente.
A construção civil, do modo como a conhecemos hoje, é “de longe o maior emissor de gases de efeito estufa (GEE)”, informam os especialistas da Organização das Nações Unidas (ONU), no relatório Building Materials and the Climate: Constructing a New Future. O setor responde por 37% de toda a poluição lançada na atmosfera anualmente.
E mesmo depois de prontos, os prédios comuns seguem contribuindo para o aquecimento global por causa do uso de energia para eletricidade, refrigeração e aquecimento, por exemplo.
Como de 50% a 70% dos edifícios previstos para 2050 no mundo ainda nem começaram a ser erguidos, é imprescindível encontrar formas de construção e gestão mais eficientes e menos agressivas ao planeta.
Um caminho está sendo proposto pela Atrium Ljungberg em parceria com os escritórios de arquitetura Henning Larsen, dinamarquês, e White Arkitekter, sueco.
“Estamos realmente em um setor em que podemos fazer a diferença, se pudermos construir de forma diferente e administrar os edifícios de uma forma mais ecológica”, diz Håkan Hyllengren, chefe de desenvolvimento de negócios da construtora, em entrevista à plataforma CNBC.
Com o uso da madeira, o potencial de aquecimento global das construções reduz drasticamente. E o motivo é simples: durante o crescimento das árvores, o material sequestra carbono.
Um estudo publicado em 2024, na revista especializada Building and Environment, por pesquisadores do governo dos Estados Unidos, é revelador da redução do impacto climático: no mínimo, uma pegada ecológica 81% inferior à do aço e 76% à do cimento.
Com o desenvolvimento da MLC e CLT, as casas e edifícios são montados e desmontados tal qual um Lego. E com uma vantagem extra importante: caso um prédio passe por uma reforma e sobrem “peças”, o excedente pode ser reciclado.
A serenidade da floresta
Tem mais. Graças às propriedades naturais da madeira, as construções impactam o bem-estar físico e até psicológico de quem as frequenta ou habita.
O material regula a umidade interna, absorvendo-a quando em excesso e liberando-a naturalmente quando o ar está mais seco — o que, por exemplo, pode evitar o aparecimento de bolor e mofo, fator de risco para doenças respiratórias.
A madeira também ajuda a absorver o som, propiciando um ambiente mais silencioso e tranquilo — é bem provável que os futuros moradores e trabalhadores de Stockholm Wood City venham a sofrer menos de estresse e ansiedade.
Ao manter a temperatura interna estável, a madeira proporciona maior conforto térmico, reduzindo a dependência de sistemas de refrigeração e aquecimento.
De dez anos para cá, a ciência tem demonstrado os benefícios do uso do material para a criatividade, o foco e a produtividade.
E isso se deve em grande parte à sensação de contato com a natureza proporcionada pela madeira — mesmo quando se está dentro de casa ou do escritório. Não à toa, os idealizadores de Stockholm Wood City prometem uma cidade com a “serenidade da floresta”.
E isso, para os escandinavos, é uma preciosidade, sobretudo para os suecos. Com cerca de 70% do país coberto por bosques, eles têm uma forte conexão (cultural e econômica) com a floresta e, consequentemente, com a silvicultura.
Em Stockholm Wood City, a madeira estará dentro e fora da cidade. “Não deve ser algo que você descobre apenas ao entrar [em um ambiente]”, descreve Oskar Norelius, arquiteto da White Arkitekter, ao jornal The Guardian. “A madeira deve fazer parte da experiência da rua.”
E, assim, Sickla, a antiga área industrial da capital sueca, famosa por suas fábricas de motores a diesel, se projeta para o futuro como sede da "maior cidade de madeira do mundo". E a mais sustentável.