Onde estaria a humanidade se a apropriação da eletricidade não tivesse sido alcançada? Nada de telefones, carros, aviões, internet, viagens à Lua e ao espaço. Se não tivesse existido o sérvio Nikola Tesla talvez a história da civilização teria tomado outro rumo. Ele viveu entre 1856 e 1943 e é um nome ainda hoje desconhecido para bilhões de pessoas, pois não aparece nos livros escolares.

Mas virou moda como ícone da cultura pop e geek (nerd) nos últimos anos, com seu retrato reproduzido em pôsteres e camisetas, ao mesmo tempo em que é chamado de o “avô da informática" e dá nome à mais valiosa e controversa corporação global de veículos. Bom, ele foi e é bem mais que isso.

A biografia "Tesla: a vida e a loucura do gênio que iluminou o mundo", do jornalista sérvio Marko Perko e do conceituado psiquiatra Stephen M. Stahl, que a Globo Livros lança este mês, propõe dois desafios: esmiuçar sua vida de inventor e tentar explicar como funcionava sua cabeça de gênio louco, atormentado pela bipolaridade, depressões profundas e manias e TOCs.

Os autores observam que sua biografia tenta satisfazer “a fome insaciável de compreensão e conhecimento desse homem, à medida que mais e mais pessoas descobrem o surpreendente, misterioso e oculto mundo de Nikola Tesla e como ele aproveitou seu incrível dom enquanto carregava o esmagador dardo do transtorno bipolar”.

O inventor é responsável por 80% das tecnologias usadas hoje e estava praticamente esquecido quando o bilionário da tecnologia Elon Musk se empenhou em resgatar sua importância com a fabricante de veículos elétricos Tesla. Um detalhe curioso: o maior ídolo de Musk, no entanto, é Thomas Edison é seu maior ídolo.

Curiosamente, não foi Musk quem deu nome à empresa, mas seus dois fundadores, em 2003 – a quem ele se juntou pouco tempo depois. Tudo começou porque queriam desenvolver um carro elétrico com preços acessíveis a partir do motor de indução criado por Tesla.

Tesla é o cientista mais aclamado e polêmico da história, que pode ser definido como inventor e, mais precisamente, o engenheiro eletrotécnico e mecânico dono de dezenas de patentes, porque capturou a corrente elétrica alternada, construiu a primeira hidrelétrica do mundo e inventou muitas outras maravilhas.

Tesla é o cientista mais aclamado e polêmico da história, que pode ser definido como inventor e, mais precisamente, o engenheiro eletrotécnico e mecânico

Entre elas, estão campo magnético rotativo, motor de indução, rádio, transmissão sem fio de energia e dados, ressonância magnética, iluminação neon e fluorescente, laser, controle remoto, robótica, raio X, radar, acelerador de feixe de partículas (raio da morte), bobina de Tesla e até a base para o projeto Guerra nas Estrelas.

Embora tenha escrito uma autobiografia (Minhas invenções), há pouco de sua vida excêntrica, desregrada e sem qualquer controle de suas finanças, marcada por graves transtornos psiquiátricos. Tesla ficou conhecido pelas rasteiras que levou de seu patrão Thomas Edison e de Marconi, por sacrificar o sucesso pessoal pelo dos outros, por colocar o princípio acima do lucro e concentrar sua genialidade para tornar o mundo um lugar melhor para se viver.

O engenheiro morreu há exatos 80 anos e praticamente não é mais possível encontrar alguém que tenha convivido com ele, o que limita a escrita de sua vida a fontes documentais. O próprio Tesla escreveu apenas fragmentos de sua infância, inconsistentes, muitas vezes.

Também mudava versões nas entrevistas e depoimentos que deu. “Sua luta ao longo dos anos com problemas de saúde mental não foi abordada de forma séria por outros biógrafos”, justificam os autores.

Para eles, Tesla passou a vida lutando contra um vasto rol de patologias mentais. Teve de conviver com os problemas psiquiátricos, mas que não atrapalhavam sua genialidade. Nos dez primeiros anos, por exemplo, com inteligência acima da média, deu sinais de um estado contínuo de hipomania e ocasionalmente psicótico, enquanto fez a primeira invenção, uma armadilha para sapos.

Em suas memórias, contou que foi acariciando o gato da família que viu a eletricidade em ação. Em seguida, inventou uma espingarda de brinquedo, em meio a alucinações visuais, sintomas de TOC como contagem de passos, necessidade de ter coisas divisíveis por três ou algo ruim aconteceria, aversão a brincos, pulseiras, pérolas, cabelos, pêssegos, cânfora. A primeira depressão grave veio com a morte do irmão, quando Tesla tinha 15 anos de idade.

No colégio e na faculdade, mostrava-se indiferente, socialmente retraído, esquizoide e egocêntrico, como descrevem os biógrafos. Mas, provavelmente, em estado hipomaníaco e ocasionalmente psicótico, criativo. Com alucinações visuais, desenvolvia soluções para problemas e desenvolvia habilidades de edição mental que resultaram em inventos de grande utilidade humana. “Imaginativo, pensando fora da caixa”, observaram.

Bem jovem, em Paris, Tesla foi empregado de Thomas Edison, que o enganou várias vezes e ficou chocado ao saber que a corrente elétrica que criou foi usada para executar um homem (negro) em Saint Louis, em 1896.

Outra decepção foi ver Marconi se apoderar da invenção do rádio e ganhar o Prêmio Nobel em 1909 – ele recorreu, mas só depois de sua morte a Suprema Corte Americana o reconheceu como verdadeiro inventor do rádio. A batalha contra Marconi foi relevante em sua vida. Contra Edison também. Tanto que, em 1912, recusou-se a dividir o Prêmio Nobel de Física com ele.

Graças a Tesla, a geração de energia elétrica começou nas Cataratas do Niágara, em 1893. Seu reconhecimento veio em 1907, quando foi admitido na Academia de Ciências de Nova York. Desenvolveu nesse ano a tecnologia de decolagem e pouso vertical, para a qual receberia duas patentes em 1928. Dois anos depois, inventou o motor de turbina sem pás, inspirado em seus experimentos da primeira infância e no efeito da camada-limite. Entre 1916 e 1928 recebeu inúmeras patentes engenhosas.

Ao completar 75 anos, em 1931, mesmo ano da morte de Edison, Tesla virou capa da revista Time, a mais badalada publicação do mundo naquela época. Foi o reconhecimento que merecia. Naquele ano, começou suas coletivas anuais de imprensa.

Nos últimos anos de vida, frágil, Tesla foi atropelado por um táxi e passou a usar bengala. Enfrentou o fim da vida acamado, alternando estados de consciência, até surgirem os primeiros sinais de senilidade.

O TOC persistiu até o fim com sua fascinação pelo número 3 – só ficava em endereço ou quarto com número divisível por três. Seu último quarto foi o 3327, no New Yorker Hotel. Demoraria para o mundo lhe dar o título que faltava: o maior cientista de todos os tempos.

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Tesla: a vida e a loucura do gênio que iluminou o mundo
Marko Perko e Stephen M. Stahl
464 páginas
Impresso: R$ 79,90
E-book: R$ 54,90
Globo Livros