O Crémant é um espumante francês feito pelo método champenoise com regras específicas, em regiões da França como Loire, Bordeaux, Borgonha, uma opção mais acessível a champagne. Para estimular seu consumo seria natural chamar a atenção de quem já conhece a categoria, o amante tradicional de vinho.
Mas não é isso que a Freixenet vai fazer quando seu Crémant de Loire, da Gratien & Meyer, desembarcar aqui no próximo ano. Por ser mais “leve e refrescante ele vai ser trabalhado com o público que também consome coquetéis”, disse ao NeoFeed Fabiano Ruiz, diretor-executivo da Henkell-Freixenet Brasil.
Essa tem sido a receita adotada até agora pela subsidiária brasileira da multinacional para os espumantes: “estabelecer territórios e priorizar a ocasião de consumo”. Em 2023, a projeção é que o Brasil cresça 31% em valor e 28% em vendas em relação ao ano passado, alcançando mais de 3 milhões de garrafas. Até 2027 o volume deverá ser de 5 milhões de unidades. Hoje, metade das vendas são dos rótulos das cavas Carta Nevada e Cordón Negro.
“Ao posicionar seus produtos como itens de lifestyle, não focando em questões técnicas como o 'método champenoise', mas concorrendo com o gin no bares, por exemplo, a Freixenet impactou toda a categoria de importados, que assim ganhou participação de mercado”, disse Felipe Galtaroça, Ceo da Ideal Consulting.
Segundo ele, a concorrência está investindo em garrafas e rótulos mais chamativos e menos conservadores em busca de novos consumidores. Um exemplo seria a chilena Undurraga. Entre os nacionais, a Chandon estaria priorizando as "ocasiões de consumo."
Entre janeiro e agosto deste ano comparado ao mesmo período do ano passado, espumantes importados subiram de 19% para 25% de participação do mercado, pelos dados da consultoria.
Proporcionalmente, os nacionais reduziram sua fatia de 81% para 75%. A Freixenet ampliou sua liderança com 34% em volume até setembro, pelos dados da Ideal. A Cepas Argentinas vem na sequência com 6,2% de participação. “Na prática, temos 5% do mercado total e estamos em expansão”, diz Ruiz.
Num primeiro momento, diz Galtaroça, os espumantes nacionais sofreram esse ano com as denúncias de trabalho análogo à escravidão na Salton, Aurora e Garibaldi. “Mas isso já ficou para trás para o consumidor depois das explicações das empresas.”
O crescimento de participação dos espumantes importados, diz ele, entra no embalo da sofisticação do consumo de vinhos no Brasil, em um processo iniciado na pandemia, com os “produtos de maior valor agregado crescendo e os mais populares caindo”.
Desde que alcançou o maior desempenho dentro do grupo Henkell-Freixenet, no ano passado, com 49% de incremento em volume, a subsidiária brasileira entrou de vez no radar da matriz, a maior fabricante de espumantes do mundo.
“Isso significa que passamos a ser um mercado de investimento para eles, que vamos trabalhar com novas categorias e ter produtos desenvolvidos especificamente para o Brasil, com insights a partir do mercado local”, diz Ruiz.
O foco da matriz no Brasil também abrange um reforço no marketing institucional, com “construção de um portfólio” como espumantes mais sofisticados, champagne e vinhos, inclusive sem álcool, e a transformação do Brasil num centro de expansão da companhia para a América do Sul.
Há dois meses o "headquarter" decidiu abrir uma filial no Uruguai que será operada pela subsidiária brasileira. “O Uruguai é um grande consumidor de Freixenet e Montevideo vai funcionar com um hub logístico para o Cone Sul”, diz Ruiz.
“No Uruguai a mercadoria não precisa ser internalizada. As garrafas são armazenadas em um regime especial com destino as lojas Duty Free.”
Vão atender desta forma as cidades irmãs da fronteira, como Rivera e Santana do Livramento e Chuy e Chuí. O Rio Grande do Sul é o segundo estado em importância para a empresa, atrás apenas de São Paulo.
O modelo de administração a partir do Brasil “será expandido” na América do Sul. Entre os países em estudo estão Colômbia e Peru, considerados “emergent markets”. A Argentina é uma operação Freixenet avaliada como “consolidada”, e não entra nesta lista.
Em 2018 a Henkell adquiriu a Freixenet. Em 2022, a companhia vendeu 244 milhões de garrafas, o que significa que “um a cada dez espumantes consumidos no mundo" pertence ao grupo. Nesse processo de dominar o mundo das borbulhas, a Henkell foi fazendo aquisições de produtoras tradicionais em vários países.
Na Itália, por exemplo, adquiriu a Mionetto, em 2008, uma fabricante de prosecco de 1887, com produção de 30 milhões de garrafas/ano. Na França, comprou em 2004 a casa de champagne artesanal Alfred Gratien, com volume anual estabelecido em 300 mil garrafas.
No Brasil, a empresa trabalha com espumantes das marcas Freixenet, Henkell, Segura Viudas e Mionetto. Agora ao fortalecer seu portfólio quer, evidentemente, ampliar ainda mais seu público. “E até alcançar o consumidor mais especializado com seu champagne, criando no entendimento do mercado aquela pirâmide de status de consumo”, diz Galtaroça.