Há quem só veja os paetês. Mas, aos 18 anos, Patricia Bonaldi passava 14 horas por dia trabalhando como operária em uma fábrica de componentes eletrônicos em Ushiku-shi, no Japão, sua primeira experiência internacional.
Foram três anos sem voltar ao Brasil, ao lado do marido Luiz Humberto, descendente de japoneses, para juntar dinheiro e montar um negócio em Uberlândia, no Triângulo Mineiro, onde nasceram.
“Dekassegui, em geral, volta e compra uma casa. Nós montamos uma multimarca de moda porque todo mundo gostava do que eu vestia, mas na época eu tinha medo de vender minhas próprias roupas”, diz ao NeoFeed, a diretora criativa e fundadora da marca PatBo.
Hoje, a PatBo, cujo tíquete médio é R$ 2 mil, conta com uma fábrica em Uberlândia com 200 funcionários, tem 10 lojas no país e exporta para 25 países. Neste ano, planeja abrir mais três pontos físicos. No exterior conta uma flagship no Soho, em Nova York, e se prepara para fortalecer sua presença na Europa, ao lançar seu e-commerce e montar uma operação em Portugal.
“Atualmente, 60% do nosso faturamento já vem do mercado internacional”, diz. “Na Europa, temos muitos clientes em Londres, onde há muitos anos vendo na Harrod’s. Mas também uma demanda grande da Itália.” A previsão com as novas frentes é de um crescimento de 25% este ano, em relação ao ano passado.
Uma jornada de internacionalização na contramão da tendência do “luxo silencioso”, com peças bordadas com pedrarias, tanto casuais, quanto para festa. “Sou maximalista mesmo.” Sua roupas têm tanta personalidade que, quando anda pelas ruas em Nova York, as pessoas reconhecem. "Eles me abordam e falam: I love your PatBo."
Aos 43 anos, Patrícia Bonaldi tem 1,2 milhão de seguidores no Instagram, comunidade que conquistou “por causa da PatBo, não de minha vida pessoal”. Debutou há poucos dias num dos tapetes vermelhos mais disputados durante o festival de Cannes, o evento de gala da Amfar (organização beneficente de combate a Aids).
Estava ali convidada como designer ao lado de outros nomes badalados da moda contemporânea como o inglês Laquan Smith, e vestindo celebridades com a sua grife, como a influenciadora alemã Leone Hanne.
Em setembro, Patrícia faz seu quinto desfile na Semana de Moda de Nova York, onde se tornou a única brasileira a estar no calendário do Council Of Fashion Designers of America (CFDA).
Foi das passarelas de Nova York que ela conquistou ainda mais celebridades como Camila Cabello, a cantora que desfilou um vestido seu no Grammy, em fevereiro deste ano.
Mas, antes disso, na Saks, Bergdorf Goodman, entre outras lojas de departamento, já tinha atraído a atenção de Catharina Zeta-Jones e Alicia Keys. E esta semana Jennifer Lopez vestiu peças PatBo na campanha da coleção de sapatos de sua marca.
Com essa projeção, a PatBo entrou no radar de grandes grupos de moda. “Recebi propostas de vários. Mas para preservar o DNA, que é um negócio com grande foco no manual, decidi manter minha visão de negócios.”
Na contramão, optou criar ela mesma seu grupo, o Nohda. O objetivo é agregar marcas que também tenham a mesma proposta do saber fazer manual, mas que para crescer “precisam de um suporte estruturado”. O Apartamento 03, de Luiz Cláudio Silva, é a primeira delas, com primazia em alfaiataria.
O projeto agora é abrir uma loja própria este ano para a Apartamento 03, que hoje tem peças vendidas no site e lojas PatBo, e começar seu processo de internacionalização, seguindo o mesmo caminho que construiu “no muque” com a PatBo
O pioneirismo com influenciadoras
Do chão de fábrica até a expansão na Europa e no Brasil, Patrícia teve vários pulos do gato. A multimarcas “Patricia Bonaldi” na qual investiu R$ 500 mil não foi tão bem assim. “Quando estava a ponto de quebrar, tive coragem de começar a fazer as minhas roupas mesmo.”
Ela desenhava o modelo e a cliente antecipava o pagamento para os tecidos, como faziam as modelistas de antigamente. “Logo virou uma loucura. Tinha filas de formandas e tudo foi crescendo no boca a boca.”
Em 2004, fez sua estreia no Minas Trend Show e fechou sua primeira venda internacional, para a Arábia Saudita. Mas foi com a criação da marca PatBo, expandindo seu universo para além das festas, que seu negócio ganhou amplitude. “Entrar no casual foi a forma para escalar o negócio”.
Mas veja bem, o casual de Patricia inclui intervenções manuais em muitas peças. Foi assim que ela criou uma escola para formação de bordadeiras em Uberlândia, na qual já passaram mais de 300 profissionais e permitiram a construção de uma linha de produção consistente.
“O objetivo é recriar a cultura do bordado. Muitas delas trabalham com a gente. Mas várias abriram o próprio negócio ou atendem a concorrência.” Este ano ela começou uma nova frente para a formação de costureiras.
No começo da PatBo, a particularidade de suas roupas atraiu a atenção de influenciadoras como Camila Coelho e Tassia Naves. “Fui a primeira marca no país a trabalhar com influenciadoras.”
Logo, as “seguidoras delas queriam saber quem era a autora das peças” e foi aí que Patrícia se viu obrigada a “abrir meu perfil no Instagram” e, assim, se tornar, ela mesma, uma influenciadora.
Além das próprias marcas, ela faz colabs em diferentes setores. Assinou produtos para Camicado, Coca-Cola e Kitchenaid, por exemplo. Mas também para Converse, Swaroviski e Arezzo.
Uma de suas máximas é o não desperdício, diz. “Nada sobra aqui. Se acho um pedaço de tule, trato logo de transformá-lo em algo.” Na pandemia, diz, quando houve queda geral nas vendas, ela transformou o estoque de tecidos em pijamas glamurosos. “E fomos muito bem com eles.”
Por meio da Fundação Dom Cabral, ela estruturou todo seu plano de crescimento para os próximos cinco anos em que pretende ter até 30 lojas no Brasil e reforçar o varejo nos Estados Unidos. “É o tamanho que comporta uma marca como a PatBo”.
Sua inspiração como modelo de negócio é a grife de luxo Chanel. “Nunca fez parte de nenhum grupo, cresce todo ano, se tornou global e mantendo o DNA por gerações.” Para tanto, segue o que a guia desde o início. “O Japão me deu tudo. A começar pela disciplina e pela persistência.”