O elegante Tom Dixon, quem diria, tocou baixo em uma banda punk. Só parou porque sofreu um acidente de moto e machucou o braço. Com mais tempo livre na recessiva Londres dos anos 1980, ele passou a se dedicar seriamente ao hobby que cultivava na época: “fazer coisas”, como ele mesmo diz, em entrevista exclusiva ao NeoFeed.
“E as pessoas compravam. De repente, percebi que era uma maneira incrível de ganhar a vida”, conta ele, que em meio a crise no país, recolhia sua matéria-prima em ferros-velhos e soube navegar nos aluguéis baixos e na disponibilidade de mão de obra para se estabelecer como profissional da área.
Hoje um dos maiores designers em atividade, com escritórios em Londres, Milão, Hong Kong, Nova York, Tóquio, Hangzhou, Pequim e Xangai, Dixon vem ao Brasil nesta semana.
Ele participa, em 5 de setembro, do Archtrends Summit, um fórum de criatividade com ingressos esgotados organizado pela Portobello, fabricante nacional de revestimentos cerâmicos., com apoio da POLI.DESIGN – núcleo de inovação da universidade Politecnico de Milano. Seus produtos são conhecidos por aqui e estão à venda em lojas como Firma Casa e Lumini, entre outras.
O britânico de origem franco-tunisiana está atualmente envolvido em projetos de todas as escalas. Desde as luminárias Portables, versões portáteis de peças suas já em linha, ao empreendimento Unity, um conjunto de dois mil estúdios prontos para morar distribuídos entre Dinamarca, Suécia e Finlândia.
É um investigador inquieto de novas formas de produção. Há dois anos, por exemplo, lançou a cadeira Hydro, em parceria com a indústria homônima de alumínio e energia, uma peça 100% reciclável.
O que foge da tríade iluminação/móveis/acessórios para casa é concebido não sob o selo que leva seu nome, mas no braço de interiores da marca, o Design Research Studio. Ali, nascem propostas tão diversas quanto as suítes dos cruzeiros Virgin Voyages a um clube no Japão para amantes de carros. “É meio estacionamento, meio clube. Uma descrição estranha, admito”, descreve.
Se esta última empreitada soa mesmo extravagante, a essa altura já não importa. “Dixon alcançou um estágio em que não precisa provar mais nada”, observa Winnie Bastian, curadora da plataforma Design do Bom e observadora atenta dos movimentos nesse setor.
“Não é exagero pensar nele como sucessor de Philippe Starck, que é cerca de dez anos mais velho”, analisa, referindo-se ao carismático francês que conquistou o mundo com sua irreverência, capaz de transformar em objeto de desejo um utensílio tão prosaico quanto um espremedor de limão.
A marca registrada de Dixon, porém, reside para além de criações icônicas – como a cadeira S, de 1991, peça autoral que passou a ser produzida pela gigante italiana Capellini e hoje figura em acervos como o do MoMA e o do Victoria and Albert Museum. O designer não se sente satisfeito “apenas” com isso.
Para ele, o processo não está completo sem seu dedo nas estratégias de comunicação e comercialização, algo que a maioria dos colegas evita a todo custo. Muito dessa visão de negócio ele atribui à temporada como diretor criativo da Habitat, consagrada firma britânica de itens para a casa, entre 1998 e 2008.
“Essa experiência me proporcionou a oportunidade de trabalhar em muitas categorias do design, como brinquedos ou pôsteres. Ganhei uma compreensão mais ampla de onde as coisas são feitas e quem as compra. Sem falar da chance de encomendar ou comissionar alguns dos grandes designers dos anos 1960, por exemplo. A passagem pela Habitat foi a minha universidade”, revela.
A influência foi tamanha que, ao fundar sua marca, em 2002 (em meio à crise que sucedeu o 11 de setembro), estava clara a premissa de oferecer soluções completas para interiores, até os objetos do dia a dia. “Sempre me interessei pelos muitos níveis diferentes do design. Já trabalhei tanto com empresas de luxo quanto com marcas como a IKEA, mais acessíveis. Os acessórios permitem que mais pessoas usufruam do que fazemos”, afirma.
O passado como performer no palco talvez explique as ações mais ousadas, como a que ele realizou em 2006 na vitrine da loja de departamentos Selfridges, outro patrimônio londrino, para demonstrar a forma de fabricar a cadeira da série Fresh Fat Plastic.
“Tenho muito prazer em observar artesãos, engenheiros ou máquinas em ação, e sinto vontade de compartilhar minha forma de fazer isso. No Reino Unido, justamente o berço da Revolução Industrial, as pessoas estão pouco conectadas com a produção e fabricação daquilo que consomem", conta.
"Sempre senti que trazer isso mais para perto do público era uma boa maneira de envolvê-lo. Esse pensamento agrada, tanto que é muito presente em restaurantes, onde agora a cozinha é o centro das atenções”, analisa.
Aliás, na contramão da tendência pandêmica de valorizar o e-commerce em detrimento dos espaços físicos, restaurantes fazem parte do modelo de negócios nos QGs de Londres e Milão.
“Lojas de móveis sempre foram entediantes, não há muita vida. Um restaurante em um showroom faz com que os visitantes permaneçam e testem os móveis e utilitários em um cenário da vida real", diz.
Por isso "se torna um ótimo laboratório para nosso trabalho. Em Londres, 1200 clientes ficam conosco por duas horas todas as semanas. Você não teria isso em uma loja de móveis convencional, certo?”, provoca.
Seu feeling para decidir se é hora de combater ou aceitar as convenções parece ser outro ponto forte para o sucesso dos negócios. A recente ênfase na linha de iluminação exemplifica essa tática.
“Os móveis estão cada vez mais conservadores. Ninguém quer correr grandes riscos em peças caras, que durarão muito tempo. Na iluminação, há mais espaço para ousadia e inovação. Luminárias são objetos transformadores, e estamos apenas começando a explorar isso de verdade”, diz.
“Antes, ficávamos presos à parede, amarrando a luz a uma tomada, a um fio. Agora a tecnologia permite mais liberdade. Mover a luz é o início de uma aventura realmente incrível. Ao mesmo tempo, é algo tão simples, é o que fazíamos com as velas...”, compara. Adaptar seus bestsellers a versões menores é, portanto, o movimento atual. Por coincidência ou não, em meio a mais um cenário de crise num Reino Unido abalado pelas consequências do Brexit.
“A próxima fase tem a ver com uma mudança dramática na funcionalidade”, adianta. Como assim? “Não posso revelar. Teremos de fazer outra exclusiva mais adiante.” No aguardo, Tom Dixon.