Pet com tigela Le Creuset? Depois de se estabelecer na lista de desejos dos gourmands, a companhia francesa de utensílios domésticos de luxo, famosa pelas panelas de ferro fundido e cerâmica coloridas, tem se articulado para se tornar uma grife de lifestyle. Quer ocupar mais espaços dentro de casa, mesmo que seja nos domínios dos animais de estimação. Afinal, os bichos já trocaram o quintal pela sala de estar há um bom tempo.
“Estamos alcançando o cachorro e o gato de nossos clientes com resultados surpreendentes e, por isso uma expansão de linha já está sendo desenvolvida”, diz Marcos Pinto, diretor da Le Creuset Brasil. Por enquanto, a linha compreende potinhos de cerâmica para água e ração que custam até R$ 299 cada, mas, “diante do resultado”, a equipe de inovação está sendo instigada a ampliar a gama de itens.
“A Le Creuset está se expandindo para além da cozinha, buscando novos públicos e segmentos. Foi o que fizemos com a coleção Harry Potter, lançada no fim do ano, em que despertamos a atenção dos geeks. Com lançamento da garrafa de hidratação, por exemplo, buscamos o universo fitness e outras novidades virão neste movimento.”
Um dos principais lançamentos deste ano, contudo, está intrinsicamente conectado com os hábitos despertados na pandemia: uma panela de ferro fundido para fazer pão. Os padeiros amadores que descobriram sua vocação cozinhando para si mesmos terão de investir R$ 2.699 na novidade que acaba de chegar por aqui nas cores vermelha e azul.
O protagonismo da vida doméstica provocado pelo longo período de isolamento e a expansão do e-commerce foram os principais fatores de crescimento da empresa que expandiu “90% entre dezembro de 2019 e dezembro de 2021.” Pela estimativa de mercado, a Le Creuset teria chegado a R$ 100 milhões de faturamento no fim do ano passado.
“Nos praticamente dobramos de tamanho. A pandemia foi um divisor de águas para nós e posicionou a empresa em outro patamar de negócios. As pessoas sentiram uma grande necessidade de cozinhar e equipar a casa. Com isso, o e-commerce explodiu com uma expansão de 300%. Hoje, responde por 20% do nosso resultado.”
Até 2011, a Le Creuset atuava praticamente no atacado. Hoje, essa frente representa 50% da distribuição. De lá pra cá, a empresa também criou uma rede de dez lojas próprias no país.
Mas, confinados durante a pandemia, muitos consumidores resolveram se aventurar com a marca pela primeira vez pelas lojas virtuais, fosse a própria, fosse a de terceiros como as tradicionais presenteiras, além de Amazon e Westwing. “60% do nosso resultado nos meios eletrônicos vieram de novos clientes. E os que já conheciam a marca ampliaram suas linhas, num movimento de colecionismo”, diz.
O comportamento de compra também teria mudado. Antes, os consumidores buscavam ter todos os itens da mesma cor. “Parece que até para trazer mais alegria para dentro de casa num momento tão delicado, os clientes abandonaram o monocromatismo e investiram em itens multicoloridos.” No repertório entraram de saleiros e pimenteiros de cerâmica até as icônicas cocotes. O tíquete médio no período saltou de R$ 400 para R$ 700.
Apesar de São Paulo ainda responder por 40% do negócio, seguido pelo Paraná com 9%, nos últimos dois anos Pernambuco e Bahia tiveram um crescimento expressivo, mas foi o Centro-Oeste que se destacou. “Credito à força do agrobusiness na região. São tíquetes com até dez itens de uma vez.”
Por isso, o projeto de expansão para este ano inclui ações específicas para a região com desenvolvimento de varejistas locais em cidades também do interior como Sinop (MT). Para agilizar as entregas no e-commerce, por sua vez, a empresa estuda a abertura de novos hubs de distribuição no Centro-Oeste e Nordeste, com algumas cidades já no radar, como Goiânia e Sergipe.
Marcos Pinto sabe que não vai repetir o “mesmo salto” em 2022. “Este ano é, digamos, a retomada da novo normal. Devemos crescer em torno de 14% ancorados na expansão do e-commerce”. Um dos limitadores de crescimento, diz ele, é a logística. “Além da pandemia, temos uma guerra. O custo do container saltou de US$ 12 mil para US$ 60 mil.”
Este ano, a Le Creuset completa 25 anos no país e, além de uma agenda de celebrações, a empresa planeja ter uma edição comemorativa que poderia ter viabilidade global. “Pensamos em desenvolver estampas de lugares icônicos do país como Amazônia, Pantanal, Rio de Janeiro para louças.”
Marcos Pinto está na companhia desde 2004, acompanhando todos os altos e baixos do mercado brasileiro como a consolidação do mercado gastronômico, a celebretização de chefs e implantação das escolas universitárias. Nessa trajetória, curiosamente, sua família já ocupou vários postos de diretoria de subsidiárias da Le Creuset e hoje são responsáveis pela Ásia, Portugal e Espanha. Além do Brasil, ele também responde pelos mercados da Colômbia e do Chile.
Desde 1988, a Le Creuset pertence a Paul van Zuydam, que ocupa a posição de chairman aos 84 anos. A fábrica original de panelas de ferro fundido se mantém em Fresnoy-le-Grand, norte da França, mas o empresário sul-africano transformou a empresa que basicamente atuava na Europa ocidental em uma companhia de objetos de desejo com representatividade internacional.
Durante estes anos, Zuydan se dedicou a expandir o guarda-chuva da marca com a compra, por exemplo, da Screwpull, marca de artigos para vinho, e de outras plantas fabris na Tailândia (cerâmicas), Portugal (peças de aço inox), Alemanha (facas) e China (itens de silicone).
São 40 subsidiárias e presença em 70 países com mais de 600 lojas próprias pelo mundo. No Japão, um dos mercado mais importantes ao lado de Estados Unidos e Europa, “25% dos japoneses até 25 anos de idade tem pelo menos uma Le Creuset, em casa”. O faturamento em 2021 teria superado 1 bilhão de euros.
O mercado global de cookware (panelas e utensílios em geral) foi avaliado em US$ 23,75 bilhões em 2021 com expetativas de crescimento de 6,5% ao ano até 2030, segundo relatório da consultoria americana Grand View Research.