TROMSO (Noruega) – Muito antes de a produção nórdica conquistar o mundo do streaming, principalmente com tramas noir e locações geladas, um festival norueguês já destacava o que há de melhor no audiovisual do norte da Europa.

Conhecido como TIFF, o Festival Internacional de Cinema de Tromso encerra neste domingo, 22 de janeiro, a sua 33ª edição. Localizada no sudeste da ilha de Tromsoya, esta é uma cidade de belas paisagens árticas e de imensa escuridão durante o inverno.

Com dias tão curtos, de apenas três horas de luz solar nesta época do ano, geralmente das 10 horas às 13 horas, Tromso é o local ideal para abrigar o maior festival de cinema da Noruega. São cerca de 60 mil ingressos vendidos por edição do evento.

Há projeções nas tradicionais salas escuras comerciais, mas também exibições ao ar livre, na praça central. O chamado Winter Cinema costuma lotar todas as noites, apesar de as temperaturas oscilarem entre -3ºC e 3ºC em janeiro.

TIFF é uma vitrine com mais de 200 títulos, divididos entre várias mostras. A mais popular das seções é a Films from the North, apresentando filmes e séries da Noruega, Suécia, Finlândia, Islândia, Alasca, Groelândia, Rússia e Canadá. Essa mostra também inclui os filmes do povo sámi, a maior população indígena da Europa, que habita a região no norte da Escandinávia.

Este ano a seção foi aberta com “A Letter from Helga”, um drama ambientado em região de fiordes (golfes estreitos entre as montanhas), na Islândia dos anos 1940. Também foi destaque “Memory of Water”, filme finlandês sobre um mundo dominado pela China onde a água é controlada pelos militares.

“Nós selecionamos o que há de melhor na nova safra produzida no extremo norte do mundo”, diz Astrid Aure, diretora de programação do Films from the North. “A seleção serve de espelho, fazendo com que a nossa plateia se identifique. E, ao mesmo tempo, é uma janela para que possamos entender melhor nossos vizinhos e os povos dos países mais distantes que também são acima do Círculo Polar Ártico.”

Atualmente, são mais de 70 produções realizadas nos países nórdicos disponíveis só no catálogo da Netflix. Segundo dados divulgados pela gigante do streaming, quase dois terços dos assinantes espalhados pelo mundo todo já assistiram a um filme ou a uma série proveniente desses países. E o Amazon Prime Video também anunciou no fim do ano passado a produção de 18 títulos nórdicos.

O que mais fascina o espectador costuma ser os enredos políticos, criminais ou místicos, quase sempre ambientados em paisagens frias e obscuras. As séries de suspense, que ganharam força nos serviços de streaming, sobretudo durante a pandemia, são decorrentes de uma tradição literária, o chamado “noir nórdico”.

Antes do “boom” das séries, a Escandinávia já exportava escritores. Como Stieg Larsson, o sueco da trilogia “Millennium”, que foi adaptada pelo cinema europeu e, mais tarde, por Hollywood. O norueguês Jo Nesbo também foi projetado internacionalmente com romances policiais, assim como o sueco Henning Mankel, conhecido pelas aventuras do inspetor Kurt Wallander.

A série “Borgen”, na Netflix, é chamada de a “House of Cards” dinamarquesa
A série “Borgen”, na Netflix, é chamada de a “House of Cards” dinamarquesa

Entre as séries mais celebradas dos últimos tempos estão “Borgen”, chamado de a “House of Cards” dinamarquesa, e “Trapped”, um thriller rodado no rigoroso inverno islandês. “Borderliner”, da Noruega, é outro destaque, investindo no dilema moral de um policial, enquanto “Bordertown”, da Finlândia, colocou no comando das investigações um detetive com síndrome de Asperger.

Da nova safra de séries, Tromso apresentou na última semana a première de “Reindeer Mafia”, um drama criminal rodado na Finlândia, ainda sem data para estrear no Brasil. O foco aqui cai na divisão da herança, quando morre uma matriarca dos negócios locais envolvendo renas. Uma luta pelo poder é instalada quando ela revela à família, no testamento, que o marido não é pai biológico de um dos seus filhos, fazendo o viúvo tomar as terras do mesmo.

Para mostrar que a produção nórdica vai além dos suspenses e dos assassinatos, outra série que ganhou visibilidade em Tromso foi “Saving the Fucking Planet”, da Noruega. É uma espécie de Romeu e Julieta da crise climática, narrando o encontro de uma ativista ambiental com um negacionista do aquecimento global.

Uma das produções norueguesas de maior sucesso nos últimos tempos foi a série “Ragnarok”, uma trama de fantasia que bebe na mitologia nórdica, sugerindo uma reencarnação atual do deus Thor. Com ação passada na fictícia Edda, “Ragnarok” é rodada na cidade de Odda, na geleira Folgefonn e no parque nacional Hardangervidda, o maior da Noruega.

“As locações espetaculares estão inspirando o público do mundo todo a colocar o nosso país na lista de lugares a serem visitados”, afirma Sigmund Elias Holm, da Western Norway Film Commission, órgão governamental que trabalha para atrair produções nacionais e internacionais. “Uma operadora de turismo alemã até lançou um pacote de viagens ‘Ragnarok’ para a Noruega.”