Nova York - Até 19 de outubro, as 750 mil pessoas que passam diariamente pela Grand Central Terminal notarão uma diferença. Na lendária estação de trem na rua 42, que liga Manhattan ao norte do estado de Nova York, os habituais cartazes publicitários foram tomados por fotografias de nova-iorquinos: ilustres desconhecidos, com histórias comuns e, ao mesmo tempo, extraordinárias.

Intitulado Dear New York, o projeto foi idealizado por Brandon Santon, um fotógrafo que há 15 anos caminha pelas ruas da cidade captando imagens de alguns de seus 8 milhões de habitantes e estampando nas redes sociais que compõem o Humans of New York. Idosos com passados inéditos, casais que se declaram, órfãos lembrando de seus pais, imigrantes relatando suas sagas.

“Nova York é a humanidade em si. Aqui há todo tipo de gente: todas as etnias, culturas, religiões e pontos de vista. E, de alguma forma, apesar das buzinas, berros e empurrões, fazemos tudo funcionar”, diz Stanton ao NeoFeed.

Como ele reforça, a mostra acontece no momento em que muitos nova-iorquinos enfrentam o peso do aumento do custo de vida, da desigualdade social e do isolamento.

Maior evento público nos 122 anos de história da estação, a exposição já começa na estação de metrô de mesmo nome, ligada ao terminal de trem. Lá, as placas publicitárias também foram despidas, dando lugar às fotografias, incluindo as catracas e painéis digitais.

“Não estou de passagem. Vim até aqui só para ver a exposição”, disse um jovem que observava os painéis na caótica estação de metrô, mas com a calma de quem visita um museu.

Cenário de filmes clássicos como Os Intocáveis (1987), o vão central da Grand Central Terminal ganhou projeções de fotos gigantes ao lado das imensas janelas.

No centro, um piano de cauda da Steinway & Sons faz parte da obra: ali, revesam continuamente até 10 da noite alunos e professores da renomada escola de música Juilliard School. Stanton abriu oportunidade também à candidatura de pianistas da cidade, pagando US$ 500 por hora de música.

A exposição estática fica em uma área adjacente chamada Vanderbilt Hall. Com design projetado por David Korins, cenografista de peças da Broadway como Hamilton e projetos digitais como Immersive Van Gogh, o ambiente reúne duas mostras convergidas no mesmo espaço.

Nos painéis centrais, estão as imagens produzidas por onze fotógrafos profissionais, cujas lentes capturam diferentes comunidades da cidade dos coreanos do Queens e judeus Hassidicos do Brooklyn aos personagens peculiares que povoam as madrugadas de Manhattan.

Ao redor destes painéis, estão 600 fotos (300 delas emolduradas e 300 em telas digitais) feitas por estudantes de escolas públicas. Seguindo o padrão de Stanton, cada foto é acompanhada por um texto. No caso, as crianças deveriam selecionar alguém relevante em suas comunidades ou vidas.

Em sua grande maioria, os portraits clicados pelos pequenos mostram mães, pais, professores e diretores de escolas. Mas há também cidadãos em situação de rua, ou mesmo o padeiro que serve o café a um estudante todas as manhãs. São relatos genuínos que trazem à tona os bastidores da vida cotidiana.

“Esta é a maior obra pública que a cidade já viu desde The Gates [mostra realizada em 2005, no Central Park], e em alguns aspectos, talvez a maior de todas, pois fala a todas as pessoas e a todos os estilos de vida”, diz Korins.

“Não há taxa de entrada. Não há elitismo. É para todos nós e feita por nós. De forma humilde e simples, ela segura um espelho diante da sociedade e reconhece que somos humanos”, complementa.

Tanqueray, a dançarina de burlesque

Aos 41 anos, casado e pai de três crianças pequenas, Stanton arcou do próprio bolso o custo das duas semanas sem anúncios na Grand Central. Como? Ele confessa ter zerado suas economias dos últimos 15 anos, incluindo suas ações nas bolsas de valores. Para quem o acompanha desde o início de sua jornada, a atitude não surpreende.

“Nova York é a humanidade em si. Aqui há todo tipo de gente", diz o fotógrafo Brandon Santon (Foto: Divulgação)

A exposição já começa na estação de metrô, ligada ao terminal de trem (Foto: Divulgação)

O design da mostra é assinado por David Korins, cenografista de peças da Broadway como "Hamilton" e projetos digitais como "Immersive Van Gogh" (Foto: Divulgação)

As fotos trazem à tona os bastidores da vida cotidiana de Nova York (Foto: Divulgação)

Nascido nos subúrbios de Atlanta, na Georgia, o fotógrafo se formou em História, mas trabalhou como operador de títulos em Chicago. Nos fins de semana, tirava fotos. Mas, ao perder o emprego em 2010, ele se mudou para Nova York e passou a flanar pela cidade fotografando seus habitantes, contando suas histórias e colocando-as no Facebook.

Assim foi criado o Humans of New York, hoje com mais de 10 mil histórias em diversas plataformas digitais, com 30 milhões de seguidores mundialmente, sendo que 1,5 milhão só em Nova York.

O primeiro dos quatro livros, uma coletânea das principais fotos, saiu em 2013, com filas infindáveis em noites de autógrafos e figurando no topo da lista de mais vendidos do jornal The New York Times. A obra seguiu na aclamada lista por mais de seis meses, assim como todos os outros que vieram depois. Ao que tudo indica, o mais recente, Dear New York, não será diferente.

Carinhosamente apelidadas de “máquina filantrópica” pela New York Magazine, as campanhas online organizadas por Stanton já arrecadaram mais de US$ 10 milhões: de US$ 1,2 milhão para uma criança filha de imigrantes com doença crônica até US$ 2,7 milhões em vendas de uma marca de sapatos feitos por uma jovem paquistanesa.

Uma das iniciativas filantrópicas mais memoráveis foi de Stephanie Johnson, uma senhora de então 76 anos, fotografada num dia de inverno quando Stanton saía da ginástica. Ao contar a sua história uma dançarina de burlesque na década de 70, conhecida como Tanqueray ela revelou que não podia mais andar por causa de uma queda.

Ao mobilizar seus seguidores, o fotógrafo levantou US$ 2,7 milhões para cobrir assistência médica 24 horas e fisioterapia. O livro de memórias de Stephanie foi lançado em 2022, com as fotos de Stanton.

Nesta exposição, a imagem de Tanqueray está à mostra na estação do metrô. E 100% do lucro do livro Dear New York, (adivinhe?) será direcionado a diversas instituições de caridade da cidade.