PORTO - O polêmico tinto alentejano Júpiter Code 01 2015 foi lançado em 2021 ao preço de mil euros por garrafa (sim, de 750 ml), e logo foi alvo de dúvidas dos especialistas e consumidores. Afinal, como um tinto, em sua primeira edição alcança preço superior ao mítico Barca-Velha (cerca de 900 euros cada garrafa, em Portugal)?
Nesta semana, entretanto, o Júpiter foi escolhido entre os 10 melhores vinhos de Portugal em 2021 no Essência do Vinho. Realizado no Palácio da Bolsa na cidade do Porto desde 2004, o evento é um dos balizadores do mercado de vinhos portugueses. Na degustação, às cegas, estavam 62 amostras pré-selecionadas pela Revista de Vinhos de Portugal que alcançaram as melhores avaliações na publicação ao longo de 2021.
O júri foi formado com especialistas de diferentes países (Brasil, Dinamarca, Espanha, Estados Unidos, Inglaterra, Itália, Portugal e Suíça) para selecionar os 10 melhores, seis tintos, dois brancos e dois fortificados. E a tal garrafa de mil euros ficou entre os premiados.
Isto foi praticamente um “braço a torcer” para os portugueses. “Muitas vezes sou considerado arrogante por colocar um vinho português a este preço no mercado”, diz o idealizador do Júpiter, Cláudio Martins, que falou ao NeoFeed com exclusividade durante a Essência do Vinho, no Porto.
O Júpiter Code 01 integra o projeto batizado de Wines from Another World (WAW), idealizado por Martins em sociedade com Pedro Antunes, diretor de arte da agência de criação Sparrow Creative Solutions.
A série de nove vinhos inspirada nos planetas do sistema solar teve sua versão inaugural com o Júpiter 2015 e nos próximos anos deve seguir para outras conhecidas e reputadas regiões vinícolas: Toscana, Bordeaux, Mosel, Champagne, Priorato, Napa, Kakheti (Geórgia) e Douro.
O projeto WAW teve seu pontapé inicial no evento Villa d’Este Wine Symposium, um hotel nas margens do lago Como, na Itália, que hospeda algumas das mais caras e raras degustações já realizadas no mundo do vinho, o que, obviamente implica em rótulos de peso como Romanée-Conti, Pétrus, Gaja e Vega-Sicilia.
Na edição 2019 do Villa d’Este o país homenageado foi Portugal e Pedro Ribeiro (enólogo de Herdade do Rocim e Bojador) e Martins tiveram a oportunidade de conversar sobre o projeto. Em seguida foram a Herdade do Rocim e lá acordaram que haviam três talhas (ânforas) com algo especial. “Falei ao Pedro para separá-las que ali estava o vinho ideal para começar o WAW”, diz Martins.
O vinho que ficou quatro anos nas talhas é resultado da colheita de uma vinha de apenas 0,36 hectare (3.600 metros quadrados), conhecida como Vinha da Micaela, onde predominam as tintas Moreto, Trincadeira, Tinta Grossa, Alicante Bouschet, e as brancas, Antão Vaz e Perrum, cujas videiras possuem mais de 90 anos de idade e são colhidas todas no mesmo momento e vinificadas em um lote único.
A grande questão é que o Júpiter colocou os holofotes em Cláudio Martins, empresário que vem sendo considerado o novo guru do vinho português. Martins não é enólogo, tampouco possui vinhas ou é herdeiro de alguma marca ou empresa de grande porte portuguesa. “Comecei a trabalhar como lavador de pratos em Londres, com 20 anos de idade”, diz o hoje CEO do Martins Wine Advisor aos 43 anos de idade.
O grande salto de Martins ocorreu em 2012 quando entrou para a New Street Wine Shop e trabalhou ao lado de Nicholas Clerc, possuidor do título de Master Sommelier e melhor sommelier da Inglaterra em 2007. “Além de aprender muito sobre o produto ao lado dele, fui apresentado aos grandes consumidores do Financial District de Londres”, afirma Martins.
Em dois anos, Martins conseguiu consolidar sua carteira de clientes e já tinha a confiança para atuar como um negociante autônomo de vinhos. “Analisava, comprava e vendia vinhos das adegas dos meus clientes, como um clube fechado. Isto me levava uma semana a Saint-Tropez, outra a Moscou, Nova Iorque e Zurique", diz Martins.
Com isso, Martins construiu e passou a atender uma carteira de colecionadores de vinhos que confiam em suas recomendações e que dão a liberdade de oferecer os rótulos que considera raros e únicos. Isto o levou ao título de embaixador do projeto Liber Pater de Bordeaux, em que um dos vinhos chega a custar 30 mil euros cada garrafa, o que significa algo perto de uma caixa (6 garrafas) do mítico Pétrus.
Liber Pater está localizado em Graves (Bordeaux) e seu caráter único se dá pela plantação de vinhas não enxertadas (pé-franco) e variedades que eram plantadas antes do ataque da filoxera como Castets, Tarney Coulant e St. Macaire. Em algumas safras, a produção total não passa as 200 garrafas.
Martins tem na ponta da língua os cinco fatores que despertam a atenção de seus clientes: “qualidade, qualidade, qualidade, comunicação e um grande storytelling por trás”. E hoje o consultor acredita que Portugal consegue entregar todos esses fatores.
“Se fosse apenas para ficar mais rico faria um Champagne ou Rioja, regiões do mundo que se vendem mais facilmente e a preços superiores”, afirma Martins, que acredita no potencial do vinho português e que pode ser posto neste contexto de “luxury wines”. O Wines from Another World deve fechar sua série (a ideia é lançar um vinho a cada ano) com um vinho do Douro (possivelmente um Porto).
A escassez e exclusividade também fazem parte do negócio e do Júpiter foram produzidas 800 garrafas, das quais 600 já estão alocadas e 200 a serem relançadas quando a coleção WAW estiver completa, em uma caixa com os nove vinhos.
No Brasil, a World Wine é a distribuidora oficial do Júpiter e deve receber apenas 15 garrafas, ainda sem preço definido. Segundo Martins, “o fenômeno FOMO (fear of missing out), foi um catalisador para as vendas do Júpiter serem tão rápidas”.
Como próximo passo, o consultor pretende reunir vinhos fortificados emblemáticos de Portugal, já nomeado de "Super Fortified Wines" apresentados e vendidos de forma conjunta, em uma caixa. Além do Madeira e do Porto, Portugal tem Moscatéis, de Setúbal e do Douro, temos Carcavelos, e outros achados. Aguardemos o preço.