Até o momento, a quinta temporada de “The Crown” arranhou mais a imagem da realeza do que o primeiro volume de “Harry & Meghan”. Não há nada de “bombástico” contra a família real, como se esperava na série documental sobre o príncipe Harry e Meghan Markle, fruto de um contrato de produção estimado em US$ 100 milhões assinado com a Netflix.

Nos três primeiros episódios de “Harry & Meghan”, o duque e a duquesa de Sussex atuam como se estivessem estrelando um reality show, com os altos e baixos de suas vidas. Por enquanto, o único vilão da história é a mídia, à medida que eles atacam a manipulação dos tabloides ingleses, plantando histórias e criando narrativas sensacionalistas.

Resta saber se o segundo volume, com os três últimos episódios que chegam à plataforma no dia 15, vão macular a imagem da “instituição”, que atualmente atravessa um momento de crise. O fato de rei Charles III ser menos popular que a mãe, Elizabeth II, tem pesado.

E, para piorar, a última pesquisa do instituto YouGov, realizada na Inglaterra, revelou que a princesa Diana ainda é a mais popular de todos os membros da monarquia. Isso mesmo 25 anos após a sua morte, em 1997, em acidente de carro, aos 36 anos.

No trailer de “Harry & Meghan”, o príncipe Harry tinha dado a entender que a série tinha um potencial incendiário. Principalmente ao citar “a dor e o sofrimento das mulheres que se casam nessa instituição, alimentando o frenesi”. E Meghan reforçava a promessa, dizendo: “Eles nunca vão proteger você”.

Mas “The Crown”, uma das produções mais caras da Netflix, foi muito mais eficaz neste sentido. Com um orçamento estimado em US$ 65 milhões por temporada, a quinta parte da biografia real colocou o foco no casamento complicado da princesa Diana com o então príncipe Charles, despertando ainda mais antipatia pelo atual rei, pela frieza com que ele tratava a esposa.

Vivida por Elizabeth Debicki, Diana é vista como “mentalmente instável” pela família real, que passou a hostilizá-la, sobretudo depois da separação. A série sugere que a monarquia espionava Diana, e o príncipe Philip chega a visitar a princesa para alertá-la de que ela precisa permanecer leal ao marido e à família em público. “Até o túmulo”, diz ele, em uma cena carregada de tensão.

O trunfo de “Harry & Meghan” também está em Diana, mas por outros motivos. Parte da imprensa britânica até ataca o casal de explorar a própria intimidade para fazer dinheiro, o que inclui muitas imagens de arquivo de Diana com o filho Harry, ainda pequeno. Ou mesmo uma cena atual, de Meghan, com um dos filhos no colo, mostrando ao bebê um retrato da avó Diana na parede.

Como a série não conseguiu acrescentar algo novo ao que já se sabia sobre os desafios enfrentados pelo casal, sobretudo quanto ao racismo direcionado a Meghan, o resultado é decepcionante. Para os fãs de Diana, o que salva talvez seja esse material de arquivo da princesa, vista aqui sempre muito amorosa com os filhos e pouco confortável quando Charles está por perto. “Sou filho da minha mãe”, diz Harry, que chega a comparar Meghan a Diana na série.

Não dá para ignorar o empurrão financeiro que “Harry & Meghan” representa para o casal. Até porque se eles queriam mesmo fugir dos holofotes, com a renúncia de suas funções na realeza, estrelar um documentário é o contrário disso, por instigar ainda mais o apetite voraz da mídia.

Desde que a dupla pediu afastamento de seus postos reais, no início de 2020, o apoio monetário recebido da monarquia foi encerrado. Eles passaram então a viver na Califórnia com os US$ 10 milhões recebidos da herança de Diana e com cerca de US$ 2 milhões dos ganhos acumulados de Meghan, na carreira de atriz.

Isso explica a necessidade de um acordo milionário com alguma gigante do entretenimento, como o contrato de US$ 100 milhões com a Netflix, firmado em 2020. Por esse valor, Harry e Meghan se comprometeram em realizar mais documentários, filmes e programas infantis assinados pela produtora do casal, a Archewell Productions.

Também em 2020, a dupla fechou um acordo com o Spotify, de estimados US$ 25 milhões, para a produção de podcasts. Um deles é o “Archetypes”, conduzido por Meghan, para tratar dos estereótipos que as mulheres ainda enfrentam. Mas, apesar dos esforços da apresentadora em trazer entrevistadas famosas, como a tenista Serena Williams, o podcast não decolou.

A renda do casal ainda foi incrementada com os US$ 20 milhões que Harry recebeu da Penguin Random House para escrever o seu livro de memórias, com lançamento mundial em 10 de janeiro. “O Que Sobra”, que chega ao Brasil pelo selo Objetiva, do Grupo Companhia das Letras, vai explorar a perda de Diana e o impacto da tragédia sobre a vida do príncipe.

Mas, por enquanto, nada promete ser tão explosivo quanto a entrevista que Diana deu ao programa “Panorama”, da BBC, em 1995. E, na ocasião, a princesa sequer cobrou para fazer as revelações que abalaram as estruturas da monarquia. Como o casamento de “três pessoas”, referindo-se ao caso de Charles com Camila Parker-Bowles, a atual rainha consorte.