Graças aos avanços das ciências e tecnologias dos alimentos, o dióxido de carbono pode deixar de ser o inimigo número 1 do Planeta para virar aliado do ser humano, na busca por sistemas agroalimentares mais produtivos, sustentáveis e inclusivos.
Confirmado o sucesso das experiências mais recentes, em um futuro não muito distante, poderemos almoçar um filé de frango e jantar uma posta de pescado, obtidos a partir de um dos mais nocivos gases de efeito estufa.
Um sinal inequívoco das potencialidades do cardápio feito de carbono foi emitido na quinta-feira, 18 abril. A Archer Daniels Midland (ADM), uma das maiores tradings agrícolas do mundo, e a startup Air Protein, pioneira na produção de proteínas feitas do ar, firmaram um acordo de desenvolvimento estratégico.
A ideia é que a gigante do setor alimentício, com a experiência e estrutura de seus 121 anos de história, ajude a biotech a escalar os produtos da Asir Protein. Não é a primeira vez que as duas empresas se juntam. Em 2021, a ADM liderou o investimento de US$ 32 milhões na startup.
Participaram da rodada de série A, fundos do porte da Fundação Ford, Barclays Sustainable Impact Capital, Plum Alley e GV (o antigo Google for Startups) Até agora, a biotech já levantou US$ 107 milhões.
Fundada em 2019, em Pleasanton, na Califórnia, a Air Protein nasceu da obsessão de Lisa Dyson em combater a crise climática. Com PhD em física pelo prestigioso Massachussetts Institute of Technology (MIT), em 2008, ela desengavetou um projeto da Nasa, da década de 1960.
Projeto da Nasa
No auge do programa espacial americano, os cientistas da agência exploraram uma forma de criar proteína a partir do dióxido de carbono exalado pelos astronautas, durante as missões espaciais. Os estudos, no entanto, não foram adiante e acabaram arquivados.
Com as ferramentas do ecossistema de inovação 4.0, Lisa pôde dar continuidade às pesquisas e, em 2011, nasceu a Kiverdi, uma empresa focada no desenvolvimento de tecnologias capazes de transformar o CO² em matéria-prima sustentável, para indústrias dos mais diversos setores. Além da alimentícia, a têxtil e a de plásticos, por exemplo.
Oito anos depois, com a produção da primeira carne de carbono do mundo, o filé de frango Air Chicken, a biotech foi fundada. A tecnologia criada pela startup segue um processo muito semelhante ao da fabricação de queijos e iogurtes.
Em vez, no entanto, de alimentar um punhado de micróbios com açúcar ou leite, a Air Protein fornece aos microrganismos ar, água e energia – renovável, diga-se. Levados a grandes tanques de fermentação, essa cultura, em poucas horas, produz proteínas.
Esse material é então colhido, seco e transformado em um pó de cor amarronzada, com um teor de proteína ao redor de 80%. Além do alto valor proteico, segundo a empresa, o produto é rico também em vitaminas e minerais, além de conter os nove aminoácidos essenciais ao bom funcionamento do organismo. A quantidade desses nutrientes é o dobro da encontrada na soja.
Farinha poderosa
Lisa não pretende fazer da Air Protein uma fábrica de filés de picanha, frango ou peixe. O uso da farinha vai além da carne. O produto pode ser misturado em shakes, massas, biscoitos e sorvetes, por exemplo.
Se puder ser escalada, a tecnologia desenvolvida pela startup pode de fato aliviar a pressão sobre o sistema agropecuário. A produção de proteína não requer terra, pode ser implantada em praticamente qualquer lugar, não depende das estações e, consequentemente, não está sujeita à volatilidade de preços do setor e é carbono negativo.
O grande desafio, segundo os analistas de mercado, é dar volume à produção, o que requer muita ciência e dinheiro. E é aí que entra a ADM. Para se ter ideia da força da companhia, o primeiro trimestre de 2023, encerrado em 31 de março, registrou um aumento de 10,2% no lucro líquido, na comparação com o mesmo período de 2022, atingindo US$ 1,2 bilhão.