Aceita um cafezinho molecular? A oferta é da startup americana Atomo. Com o intuito de mitigar os impactos ambientais da cafeicultura, o empreendedor serial Andy Kleitsch e o cientista de alimentos Jarret Stopforth inventaram o “beanless coffee”. O produto tem gosto de café, aroma de café, mas não é café. É um composto de ingredientes vegetais reciclados, capaz de reproduzir as características sensoriais do cafezinho de verdade.
Fundada em 2019, em Seattle, a Atomo acaba de lançar a versão espresso de seu café molecular, na badalada Gumption Coffee, da Times Square, em Nova York. Ainda artesanal, a produção é pequena. Mas, Kleitsch, atual CEO, e Stopforth planejam inaugurar, em março de 2024, uma fábrica com capacidade de quase 2 mil toneladas por ano. Um quilo do novo produto é vendido por US$ 21, aproximadamente.
Para chegar ao “espresso beanless”, foram quatro anos de muita pesquisa. A equipe de P&D da Atomo mapeou, em detalhes, todos os compostos encontrados em um grão de café. Concluída essa etapa, vasculharam e combinaram uma infinidade de resíduos vegetais até chegar ao blend perfeito, aquele que faz do café o café. Em especial, o sabor, o cheiro e a sensação na boca.
Graças aos avanços da biotecnologia, os cientistas conseguiram reproduzir a estrutura molecular do café com a mistura de sementes de tâmaras, girassol, ramon, feno grego e chá verde, além de algumas pitadas de proteína de ervilha, milho, limão e goiaba. A maioria dos elementos é proveniente do fluxo de resíduos da indústria alimentícia. Pelos preceitos da economia circular, nada se perde, tudo se reaproveita.
Como a Atomo tem controle sobre a receita do “espresso beanless” é possível customizar o café ao gosto do cliente. Prefere descafeinado? É só tirar a erva-mate. A “personalização” faz parte de uma estratégia para levar a plataforma da Atomo para outros mercados.
Desde a fundação da empresa, a foodtech levantou quase US$ 52 milhões, em quatro rodadas de investimentos. Entre os dez fundos que apostaram na startup, estão: AgFunder, Climate Capital, Blue Horizon Corporation, Horizons Ventures e RSEVentures.
Em relatório, a Atomo informa que a produção do espresso sem grãos emite 93% menos gases de efeito estufa e 94% menos água do que a bebida tradicional. A foodtech foi eleita, pela revista Time, uma das 200 melhores inovações de 2022.
O café é uma das culturas mais suscetíveis aos efeitos da crise climática e, ao mesmo tempo, um dos cultivos mais prejudiciais ao meio ambiente. Mais frequentes e intensas, as ondas de calor prejudicam as plantações. Até 2050, metade de toda a área usada hoje pela cafeicultura está prevista virar terra arrasada.
Por outro lado, o café está entre as dez culturas vilãs do aquecimento global. Do modo como o grão vem sendo cultivado ao longos dos séculos, leva ao desmatamento, ao empobrecimento e erosão do solo e ao uso intensivo de recursos naturais. Da fazenda à mesa, uma única xícara de cafezinho consome cerca de 150 litros de água.
Enquanto isso, aumenta o consumo da segunda bebida mais popular do mundo. Avaliado em US$ 122 bilhões, o mercado mundial da commodity deve movimentar quase US$ 184 bilhões, nos próximos cinco anos, nos cálculos da consultoria Coherent Market Research. Como se vê, o problema é grande.
No ecossistema de inovação agrifoodtech, muita gente está pensando em como tornar a cafeicultura mais sustentável e resiliente aos eventos climáticos extremos. A também americana Minus segue a linha de pesquisa da Atomo, mas ainda está em estágios mais precoces de desenvolvimento.
Além do “café sem grãos”, alguns focam em práticas agrícolas regenerativas e outros apostam na reciclagem. Há quem trabalhe com edição gênica para produzir espécies mais resistente ao calor. Quem se dedique a cultivar café em laboratório, a partir de células vegetais, e quem invente novas máquinas de torrefação.