Todos os anos, os supermercados brasileiros perdem cerca de 2% de seu faturamento em produtos vencidos. São R$ 8 bilhões jogados no lixo. De modo a combater o desperdício, em março de 2021, Luciano Kleiman fundou a b4waste, foodtech que conecta consumidores e varejistas para o comércio de alimentos próximos da validade, por, no mínimo, metade do preço.

Depois de quase três anos e 2 mil toneladas de comida salvas, Kleiman se prepara para levar a b4waste a novos desafios. “Calibramos a operação e estamos prontos para uma expansão mais agressiva, para escalar de verdade”, diz o CEO da startup, em conversa com o NeoFeed.

A empresa deve movimentar R$ 10 milhões transacionados na plataforma neste ano. Em 2024, Kleiman quer quintuplicar esse valor. A ideia é aumentar o número de consumidores cadastrados na plataforma de 50 mil para 400 mil. E o de lojas, de 120 para 400.

O empreendedor está em negociações, por exemplo, com a rede de supermercados Savegnago. Sediada em Ribeirão Preto, é uma gigante do varejo de alimentos no interior paulista. Kleiman conversa com outras marcas, mas, por enquanto, ele prefere não revelar quais.

A estratégia de crescimento passa pelo breakeven, esperado para o primeiro trimestre do próximo ano. A partir do momento em que a startup se tornar uma companhia geradora de caixa, Kleiman pretende acelerar os investimentos em três áreas.

“Em marketing, porque a b4waste precisa ser mais conhecida do que ela é; em tecnologia, para melhorar a experiência do consumidor; e, por fim, em equipe”, explica o CEO.

O movimento de expansão foi impulsionado pelos R$ 6 milhões, levantados desde a fundação da b4waste. Entre os investidores estão o fundo argentino de impacto Glocal e o family office brasileiro Ene 2.

Também apostaram na foodtech Pierre Berenstein (presidente no Brasil da Bloomi’n Brands International), Alexandre Rappaport (diretor-geral da Ticket), Rodrigo Rodrigues (head de Agro da Falconi), Leandro Zynger (cofundador da Bling), Arnaldo Rocha (sócio da Deal Maker) e João Lenza (ex-diretor de operações do Mambo). Mais recentemente entraram o espanhol Juan Moya (sócio da Persán) e o chinês Jimmy He (presidente da Standart Elevator Systems).

Na nova fase, Kleiman conta ainda com a chegada de Rodrigo Chaimovich à b4waste como investidor e COO. O executivo tem 20 anos entre Danone e Unilever, em cinco países diferentes. “É o maio reforço de time que já tivemos”, comemora o CEO.

A b4waste opera hoje em São Paulo, Rio de Janeiro e Belo Horizonte. Kleiman quer ampliar a presença da empresa não apenas em mais capitais como também nas periferias das grandes cidades. Do portfólio da startup constam tanto mercados de luxo como Empório São Paulo, Varanda e Natural da Terra quanto as lojas do Lopes, em Guarulhos, ou as da D’avó, na zona leste paulistana.

Kleiman tem motivos para estar otimista. Há muito espaço para uma empresa como a b4waste crescer. Para se ter ideia, são 100 mil supermercados no Brasil. “O setor é muito maior do que aquele que fomos capazes de atingir até agora”, diz o CEO.

Há de se levar em conta ainda o tamanho do desperdício de comida no varejo brasileiro. Muitas vezes, o lucro do supermercado está muito próximo daqueles 2% anuais do faturamento, perdidos com os alimentos vencidos.

Luciano Kleiman, fundador e CEO da b4waste
Luciano Kleiman, fundador e CEO da b4waste

Aos 50 anos, formado em administração pela FGV e com vasta experiência nos varejos de moda e de vinho, com passagem pela rede Mambo, Kleiman sabe que está lidando com um segmento complexo, nervoso e resistente a mudanças.

Por isso, a operação da b4waste foi desenhada para interferir o menos possível na operação já estabelecida. “Atuamos dentro das regras dos varejistas”, diz o CEO. “Para que a adoção seja a mais alta possível, damos o mínimo de trabalho para eles.”

Os comerciantes decidem quais alimentos entram em promoção e as regras dos descontos, cabendo-lhes apenas subir os produtos na plataforma da b4waste – hoje são 20 mil itens em oferta no aplicativo.

Os supermercados não arcam nem com a entrega das compras. Ainda que o delivery represente apenas 30% dos pedidos, quando acontece, a logística é por conta b4waste. Como o aplicativo funciona à base de geolocalização, os clientes preferem economizar no frete e buscar pessoalmente suas encomendas.

O modelo de negócios proposto pela b4waste acontece essencialmente no B2C, mas segundo Kleiman, a foodtech pode ajudar os varejistas também no B2B. “Há uma perda muito grande de alimentos nos centros de distribuição”, conta. “E a gente tem sido capaz de fazer negociações de grandes volumes, voltados para pequenos mercados e restaurantes, por exemplo.”

No fundo, facilitar a vida dos varejistas é uma forma de educá-los para a importância do combate ao desperdício de alimentos. Dizer que, ao comercializar alimentos que de outra feita iriam para os aterros sanitários, a b4waste evitou a emissão de 1,7 mil toneladas de gases de efeito estufa, por enquanto, não serve como argumento de convencimento.

“A preocupação do varejo ainda é essencialmente comercial. A agenda sustentável segue mais pautada pela dor do que pelo amor”, afirma Kleiman.  “Nosso papel é estimular a mudança cultural do setor.”

Mas, conforme aumenta o poder de consumo das gerações mais jovens e recrudesce as legislações contra o desperdício, o movimento tende a ganhar força. Na França, por exemplo, os supermercados que jogam comida fora são condenados a multas pesadas.

Porque continuar do jeito que está, não dá. “É um descalabro, é hediondo, que 10% da população global vive sob algum grau de insegurança alimentar, quando, pela primeira vez na história, se produz alimento o suficiente para dar de comer a todo mundo.”