Em algum momento da vida, 25% das 270 milhões de vacas leiteiras, espalhadas pelo mundo, desenvolvem mastite. Caracterizada pela inflamação da glândula mamária, a doença compromete a qualidade e a quantidade do leite – em alguns casos, a queda na produção chega a 45%. Tem mais: deixada a seu próprio curso, a infecção pode matar o animal.
Frequentemente, a mastite evolui lenta e silenciosamente. Sem sinais aparentes de sua ocorrência, quando diagnosticada, pode ser tarde demais. Por isso, os exames para detecção da afecção devem fazer parte da rotina de cuidados dos animais.
Os testes tradicionais, no entanto, só costumam flagrar a inflamação em estágios mais avançados. Uma startup de Bangalore, na Índia, desenvolveu uma tecnologia capaz de identificar a doença em tempo real e, o mais importante, em suas fases iniciais.
Obtido a partir de três gotas de leite, misturadas a biomarcadores, o diagnóstico sai em poucos minutos. A nova tecnologia permite aos produtores identificar, com extrema precisão, o animal doente e o estágio da doença.
Fundada em 2021, a Fauna Tech Solutions, apesar de seu pouco tempo de história, já ganhou alguns dos prêmios mais celebrados do ecossistema agrifoodtech. No mais recente deles, a empresa recebeu o “Dairy Awards 2023”, na categoria “Inovação em Práticas Agrícolas Sustentáveis – Cuidados com Animais”, da Federação Internacional de Laticínios.
“Em nossas pesquisas, constatamos que a detecção precoce da doença aumenta a produção de leite em 22%, reduz em 55% os casos graves de mastite e diminui sobremaneira os gastos com veterinários e medicamentos”, diz o cofundador e CEO da Fauna Tech, Rajat Pandya, à plataforma do AgFunder, fundo americano de venture capital focado no agronegócio. “Nossa solução leva a um aumento médio na renda anual dos produtores de US$ 120 a US$ 150, por animal.”
A precisão do teste da Fauna Tech evita ainda o uso exagerado de antibióticos. Os medicamentos frequentemente estão associados à poluição do meio ambiente, sobretudo dos cursos de água.
Além da mastite, a inovação permite ainda a análise, entre outros parâmetros, das quantidades de gorduras no leite, o que afeta o preço do produto, e a acetonemia, condição causada pelo déficit de energia do animal.
Embora tenha sido concebida com foco nos pequenos e médios criadores, a plataforma da Fauna Tech custa entre US$ 400 e US$ 500; ainda cara para seu público-alvo. Por enquanto, os principais clientes da startup são os sindicatos indianos de produtores de leite. Algumas empresas já manifestaram interesse na inovação. Uma delas, segundo o AgFunder, é a gigante Nestlé.
Não é à toa que os avanços no monitoramento das vacas venham da Índia. O país é o principal produtor de leite no mundo, segundo a FAO, a agência para agricultura e alimentação da Organização das Nações Unidas (ONU). A produção indiana, em 2022, foi de 221 milhões das 930 milhões de toneladas globais. No ranking da FAO, o Brasil aparece em sexto lugar com quase 35 milhões de toneladas.
A busca por rebanhos mais saudáveis é condição sine qua non para o desenvolvimento sustentável de uma indústria em ascensão. Avaliado em US$ 893 bilhões, em 2022, o mercado global de leite e derivados deve ultrapassar a marca de US$ 1 trilhão, em 2028, evoluindo a uma taxa de crescimento anual composta de quase 6%, até lá, informa a consultoria Imarc.
Mas Pandya não quer ficar apenas nas vacas leiteiras. Segundo o CEO, a ideia é adaptar a plataforma de diagnósticos para a testagem de carne bovina, de peixes e de aves, além de grãos. “Não precisamos alterar o hardware, apenas adicionar diferentes biomarcadores à plataforma”, afirma o executivo.
Análises como a da Fauna Tech reforçam a preocupação crescente de produtores e consumidores com a segurança, a qualidade e a rastreabilidade das matérias-primas dos alimentos que colocamos à mesa.