Foi com surpresa que o mercado recebeu a decisão da Getnet de fechar seu capital, em maio de 2022. O movimento vinha à tona apenas sete meses depois de a empresa brasileira de meios de pagamento controlada pelo Santander listar suas ações na B3 e na Nasdaq.

O processo foi concluído em dezembro de 2022. Mas outro itinerário, sinalizado justamente como o principal destino a partir da entrada da empresa no mercado de capitais, está sendo percorrido, de fato, agora.

A Getnet está investindo na conexão com as outras operações da PagoNxt, hub global que reúne os ativos de meio de pagamento do Santander. A partir dessa escala, o plano é fazer o intercâmbio de ofertas entre os portfólios que compõem esse guarda-chuva.

“Essa convergência é um dos nossos pilares de crescimento mais sólidos e rápidos”, diz Cássio Schmitt, CEO da Getnet no Brasil, ao NeoFeed. “Vamos acelerar o time to market em todos os países, com muito mais escala, investimentos compartilhados e a um custo muito menor.”

O plano de voo para viabilizar e agilizar essa troca entre os portfólios passa pela nuvem. O grupo tem um projeto de convergência dos sistemas, dados e iniciativas de todas as operações em uma única plataforma, hospedada em uma infraestrutura de cloud.

Além da importação e exportação de ofertas, que não está restrita às maquininhas de cartão, essa abordagem vai permitir o desenvolvimento de produtos e serviços a “quatro ou mais mãos”. Hoje, nessa área, a PagoNxt tem times no Brasil, Espanha, Índia, Emirados Árabes e Alemanha.

A unificação da plataforma ainda está em curso. Isso não impede que a Getnet tenha alguns exemplos que já inauguraram essa via de mão dupla ou estão prestes a seguir esse trajeto.

Uma das ofertas made in Brazil que já está de malas prontas rumo a outros mercados é uma plataforma de pagamentos para canais de e-commerce, que terá como primeiro destino os países da América Latina.

Outra solução local em vias de ganhar o mundo é a Get Store. Ela permite que varejistas embarquem diversos aplicativos parceiros – de gestão de vendas, por exemplo - em suas máquinas de cartão.

Cássio Schmitt, CEO da Getnet no Brasil, fala sobre a integração com a PagoNxt:

No caminho inverso, uma das ofertas que devem desembarcar no País é uma plataforma de turismo e mobilidade. Entre outros recursos, de gestão de pagamento e reservas de viagens, essa alternativa envolve sistemas de gestão de risco e de proteção contra fraudes.

“Na Europa, a PagoNxt tem uma boa presença, por exemplo, com companhias aéreas”, conta Schmitt. “Já no Brasil, o volume de clientes no setor ainda é muito baixo. Isso vai nos permitir levar essa relação a outro nível.”

No pacote que deve reforçar o portfólio local, ele cita ainda um serviço de tokenização e ferramentas que viabilizam pagamentos em diferentes moedas. Essa última opção será voltada, por exemplo, a sellers estrangeiros dispostos a vender num marketplace do País.

Nas duas direções, a estratégia vai passar ainda por áreas como softwares de gestão de vendas, conciliação financeira e antecipação de recebíveis. No curto prazo, os mercados-alvos são a América Latina e, na Europa, Espanha e Portugal.

A etapa seguinte deve adicionar Inglaterra e Polônia a esse escopo. E, num terceiro momento, os demais países do Velho Continente. Para avançar nessa pegada global, a PagoNxt conta com uma equipe comercial, alocada na Espanha e centrada em clientes multinacionais.

“Existem muitas empresas americanas e europeias atuando na América Latina”, diz Schmitt. “Para elas, é mais fácil ter uma única plataforma gerenciando esses pagamentos. E isso pode ser um diferencial nosso em relação a boa parte da concorrência.”

A PagoNxt fechou o primeiro semestre de 2023 com uma receita de € 521 milhões, alta anual de 27%. Em adquirência, o volume total de pagamentos (TPV) cresceu 25%, para € 95 bilhões.

O hub global atua em mais de 24 países e reúne 5 mil profissionais. Desse quadro, 1,6 mil funcionários integram o time da Getnet Brasil e, como prova da sua relevância nesse mapa, a marca brasileira é a bandeira da PagoNxt em adquirência, com presença em mais de dez mercados mundo afora.

Competição e rentabilidade

Enquanto a Getnet dá seus primeiros passos em direção a esse portfólio global, no Brasil, o percurso tem se mostrado mais acidentado para todo o setor. Especialmente na vertente principal do negócio, as máquinas de cartão, cada vez mais concorrido e, ao mesmo tempo, com perspectivas de desaceleração.

Desde 2022, os analistas vinham destacando o apetite por participação tanto da Getnet como da Rede, a operação de adquirência do Itaú, e o avanço da dupla sobre os pares listados do setor.

Um relatório do BTG Pactual retrata essa movimentação. No segundo trimestre, a Rede assumiu a liderança com uma fatia de 28,6%, contra 26,9% da Cielo, que, por muito tempo, esteve no topo e viu suas ações desabarem ao divulgar seu balanço do período.

Com uma base de 770 mil clientes no País, a Getnet se manteve no terceiro lugar. Mas também ampliou sua fatia no mercado. De uma participação de 16,7%, no segundo trimestre de 2022, a companhia saltou para 18,2%.

“No segundo semestre de 2022, nós decidimos buscar mais volume e fomos um pouco mais agressivos”, diz Schmitt. “Poderíamos buscar uma fatia de mais de 20%, mas temos reforçado o foco em buscar mais rentabilidade, tanto que reprecificamos nossos produtos e serviços.”

Desde que fechou capital, a empresa não divulga mais os dados do seu balanço no Brasil. Nas contas do BTG, o TPV da Getnet no País cresceu 4,1%, em base anual, entre abril e junho, para R$ 132,3 bilhões.

“No primeiro semestre, o TPV da Getnet Brasil cresceu 15%, ano contra ano, impulsionado por soluções para PMEs e ofertas sob medida para grandes contas e novas verticais”, escreveram os analistas Eduardo Rosman, Thiago Pauta e Ricardo Buchpiguel.

Com um foco cada vez maior nas PMEs, a Getnet vem buscando reduzir a dependência do Santander na distribuição, ao fechar parcerias com players como o BEES Bank, banco digital da Ambev, e a Sicredi. Mais recentemente, porém, a companhia estreitou seus lanços com sua “empresa-mãe”.

“Nós dobramos o time de especialistas que apoia as equipes comerciais do banco, de 150 para 200 profissionais”, diz Schmitt. “Precisamos estar, basicamente, em todo o Brasil.”

A empresa não é a única a investir nessa capilaridade. Há um mês, ao divulgar seu balanço trimestral, a Cielo anunciou o plano de contratar até mil profissionais para reforçar o time comercial que atua justamente junto aos seus bancos parceiros.