A Bolsa de Valores de Londres (LSEG) tem enfrentado um forte êxodo nos últimos anos. Apenas em 2024, 88 companhias deixaram de ter suas ações listadas no pregão britânico, segundo dados compilados pelo jorna Financial Times.

Agora, quem pode ampliar essa dose é a AstraZeneca. Essa parece ser, ao menos, a intenção de Pascal Soriot, o CEO da farmacêutica britânica. Em reuniões privadas, o executivo teria manifestado o seu desejo de transferir a listagem para os Estados Unidos, onde a empresa já negocia ADRs.

As informações são do jornal The Times, que cita fontes próximas à companhia. E o plano, caso seja levado à frente, representaria um duro – e talvez o maior – golpe para a LSEG. Listada por lá desde 1999, a empresa, avaliada em £ 162,9 bilhões, é atualmente a mais valiosa do mercado de capitais local.

Publicamente, o executivo já falou em diversas ocasiões sobre suas preocupações com a forma como a Europa ficou para trás dos Estados Unidos e da China, os dois principais mercados da farmacêutica, no que diz respeito à inovação do setor.

Soriot também já deixou claro sua frustração com as restrições de medicamentos impostas pelo National Institute for Health and Care Excellence (Nice) e os preços praticados em programas do Serviço Nacional de Saúde do Reino Unido.

Em janeiro deste ano, em outro sinal recente do descontentamento do executivo, a empresa recuou do plano de investir £ 450 milhões na expansão de uma fábrica de vacinas contra a gripe em Liverpool. Na época, o grupo culpou o governo por não cumprir o prazo para confirmar o apoio financeiro ao projeto.

Dois anos antes, por sua vez, Soriot citou uma taxa de imposto “desencorajadora” para justificar a decisão da empresa de investir US$ 360 milhões em uma fábrica na Irlanda, em vez da Grã-Bretanha.

Em contrapartida, a AztraZeneca vem ampliando seus investimentos nos Estados Unidos, país que respondeu por mais de 40% da receita de US$ 54 bilhões reportada pela farmacêutica no ano passado. Isso inclui um aporte previsto de US$ 3,5 bilhões no mercado americano até o fim de 2026.

Há três meses, por exemplo, Soriot disse que a companhia estava planejando aplicar mais recursos em solo americano. Ao mesmo tempo, ele alertou que empregos poderiam desaparecer a menos que a Europa respondesse melhorando os incentivos e o acesso a novos medicamentos.

A China também tem sido cada vez mais um destino dos recursos da empresa. Em março desse ano, a companhia anunciou um investimento de US$ 2,5 bilhões em Pequim, juntamente com o plano de sediar o seu sexto centro global de pesquisa e desenvolvimento na capital chinesa.

Segundo as fontes, um movimento de migração da listagem provavelmente enfrentaria, porém, uma resistência de parte do conselho de administração da AstraZeneca, bem como do governo britânico, que elegeu o setor como um dos oito segmentos prioritários em sua estratégia industrial.

Entretanto, em um possível sinal de que uma eventual deslistagem na LSEG teria o apoio de investidores, as ações da AstraZeneca encerraram o pregão desta terça-feira, 1º de julho, com alta de 2,79%, cotadas a £ 10.402.

O fato é que, caso siga nessa direção, a AstraZeneca vai reforçar uma onda de empresas que decidiram deixar a LSEG ou torna-la seu mercado secundário. Isso em um contexto no qual há um esforço para revitalizar o mercado acionário local, que tem perdido atratividade desde o Brexit, em 2020.

Um dos exemplos mais recentes foi dado pela Wise. No início de junho, a empresa, listada na bolsa londrina desde 2021, anunciou o início de um processo de dupla listagem, com a intenção de ter os Estados Unidos como o principal mercado para as suas ações.

Na oportunidade, a fintech ressaltou o argumento de que o mercado americano é mais amplo e líquido, o que permitiria expandir sua base de acionistas. Além de ampliar o conhecimento da marca nos Estados Unidos.

Meses antes, em dezembro de 2024, a Ashtead, empresa de locação de equipamentos para construção, já havia divulgado um plano de listar suas ações nos Estados Unidos. Dois anos antes, a BHP decidiu ter a Bolsa de Sidney, na Austrália, como seu principal mercado de ações.

A lista inclui ainda nomes como a Flutter, dona da empresa de bets Paddy Power, e a CRH, companhia de materiais de construção. Além de casos como o a da mineradora Cobalt, que, em junho desse ano, desistiu dos planos de listar suas ações em Londres, onde pretendia captar US$ 230 milhões.