Quase nove anos desde o primeiro anúncio da construção, em julho de 2017, e de, no meio do caminho, dobrar o volume de investimentos, a farmacêutica brasileira Biolab inaugura, em janeiro de 2026, a principal fábrica da companhia no País. Localizada na cidade mineira de Pouso Alegre, ela terá capacidade de mais do que dobrar a produção atual.

Com cerca de 80 mil metros quadrados (m²), a fábrica será responsável pela produção de mais de 200 milhões de unidades de medicamentos por ano. O custo total para a conclusão da indústria ultrapassa R$ 1 bilhão.

“É possível que a gente faça ainda mais investimentos na planta. Ela vai dar suporte para os próximos 50 anos da empresa. Vamos dobrar a capacidade de produção só com um turno e ainda podemos implementar outros dois”, diz Fábio Amorosino, CEO da Biolab, em entrevista ao NeoFeed.

Hoje, a Biolab tem parques fabris nas cidades paulistas de Taboão da Serra, Jandira e Bragança Paulista. No ano passado, a empresa comercializou 143 milhões de unidades de medicamentos.

Quando o projeto original da fábrica de Pouso Alegre foi lançado, que envolvia um investimento de R$ 500 milhões, a ideia era de que o empreendimento estivesse pronto em quatro anos, até 2021. Mas a pandemia da Covid-19 prejudicou esse avanço.

Em abril de 2023, a farmacêutica informou que iria dobrar o aporte, alegando justamente o impacto da inflação no período, e o aumento dos preços dos materiais de construção e equipamentos. Entre 2017 e 2024, o Índice Nacional de Construção de Construção Civil (INCC) chegou a 101,7%, no acumulado.

Outro ponto apresentado pela empresa para explicar parte da demora tem a ver com a legislação. Além de atender as exigências da Agência Nacional de Vigilância Sanitária (Anvisa), a nova unidade também se adequou aos padrões da Food and Drug Administration (FDA) e da European Medicines Agency (EMA), para atender o mercado de exportação.

A unidade central está em fase final de montagem e hoje opera em uma espécie de ramp-up, em um período de ajustes finos e de adaptações nas linhas de produção. Falta a conclusão de outros prédios ao redor da planta e que compõem o conjunto fabril.

Ainda que com o longo período de construção, a entrega da nova fábrica é encarada como um pilar importante para o plano da companhia de chegar a R$ 5 bilhões de receita em 2027. Hoje, a companhia fatura R$ 3,2 bilhões.

Criada em 1997, a Biolab tem como fundadores Cleiton de Castro Marques e Paulo de Castro Marques, família com tradição na indústria farmacêutica. O irmão, Fernando Marques, é dono da União Química, e o sobrinho, João Adibe Marques, comanda a Cimed.

Com crescimento anual por volta de 12%, a empresa vai precisar acelerar este ritmo para alcançar a meta de R$ 5 bilhões, com uma taxa de pelo menos 25% ao ano em 2026 e 2027.

Pastinhas da Biolab

O caminho de crescimento para a empresa, segundo Amorosino, que tem a nova fábrica como ponto central, está em duas estratégias. A primeira delas é o lançamento de medicamentos inovadores, principalmente em cardiologia, área que representa 52% do negócio.

Atualmente, a empresa tem cinco produtos em desenvolvimento, nas áreas de sistema nervoso central, ginecologia, diabetes, além dos medicamentos cardiológicos.

A segunda estratégia de crescimento está ligada ao avanço de parcerias comerciais para representação e comercialização de medicamentos no Brasil de farmacêuticas estrangeiras. O racional desse plano está em aproveitar a força de vendas da companhia, que conta com 1,8 mil representantes.

Por mês, são realizadas 320 mil visitações médicas, o que inclui 20 mil cardiologistas. Desta forma, na "pastinha" do propagandista da Biolab, estão, além dos lançamentos da empresa, os produtos das farmacêuticas do exterior.

Com 35 parcerias internacionais ativas, esta vertical representa 30% do faturamento da Biolab. A mais recente foi celebrada em setembro, com a inglesa George Medicines, para a venda no Brasil do Widaplik, único medicamento no mundo que reúne três princípios ativos para o tratamento da hipertensão arterial em um único comprimido.

Aprovado pelo FDA, o medicamento ainda precisa ser autorizado pela Anvisa para poder entrar nas prateleiras das farmácias brasileiras. Não há um prazo certo para isso, mas o CEO da Biolab acredita que esta fase possa estar concluída até o fim do ano que vem.

No ano passado, a Biolab firmou parceria com a alemã Bayer para a comercialização do contraceptivo Qlaira, líder do segmento no País. Desde 2022, a empresa distribui e comercializa o medicamento Repatha, que combate doenças vasculares, da americana Amgen.

O plano é crescer neste segmento de alianças internacionais. Hoje a Biolab tem na prateleira 186 oportunidades de parceria em análise. Isso não significa, no entanto, o volume do que, de fato, se transforma em contrato.

“A consistência de crescimento da empresa em relação ao mercado e o respeito dos players internacionais que buscam a Biolab como um parceiro estratégico no Brasil nos trazem o confronto de que o caminho vai ser alcançado”, diz Amorosino.

Concorrência familiar e IPO

Apesar de ter como DNA a área cardiovascular, com foco na população acima de 50 anos no Brasil, a Biolab também tem buscado ampliar portfólio e crescer em genéricos, que hoje respondem por 20% da receita.

O pano de fundo está em garantir oportunidades de capturar o cliente que passa a comprar o medicamento mais barato, quando a exclusividade de 20 anos do criador do produto deixa de existir.

O Vonau, por exemplo, que está no top 3 de vendas da empresa e que é indicado para náuseas, teve a patente expirada em 2021. O remédio foi criado em parceria com a Universidade de São Paulo (USP), que recebeu royalties durante a vigência da patente.

Hoje, a empresa já oferece a ondansetrona (princípio ativo do medicamento) como genérico também, o que neutraliza a perda das vendas do medicamento referência.

Com a expansão da área de genéricos, a Biolab avança em uma avenida já transitada pela Cimed, o que, para o CEO, não é visto como um problema, nem do ponto de vista empresarial nem familiar.

“A família Marques é muito representativa no setor farmacêutico. Há um respeito muito grande entre eles. O mercado é soberano e há espaço para todos. Cada uma opera nas áreas que entende que agrega valor”, diz Amorosino.

Possivelmente, as duas também passem a disputar, a partir do ano que vem, o mercado de canetas emagrecedoras, que deve movimentar R$ 7,5 bilhões no Brasil a partir do fim da patente de semaglutida.

Além de Cimed, empresas como EMS, Biomm, Prati-Donaduzzi, entre outras brasileiras, já demonstraram interesse em produzir o Ozempic genérico. “Pode ser. É um mercado interessante e a gente observa todas as oportunidades. Todas estão de olho”, afirma.

Com a chegada de Amorosino na liderança, em outubro de 2024, os fundadores da Biolab decidiram avançar na governança da companhia, com a implementação de um conselho com profissionais de mercado e com a entrada do primeiro CEO sem o sobrenome Marques.

Amorosino, que foi CEO do banco Alfa por 16 anos, já ocupava, havia três anos, um assento no conselho de administração. Hoje, além de presidente, ele também lidera o conselho.

Com sete cadeiras, o colegiado conta com Cássio Casseb (ex-presidente do Banco do Brasil e do GPA), Paulo Gandolfi (CEO da 3M Brasil) e João Bezerra Leite (ex-CTO do Itaú). Os quatro executivos se somam aos irmãos Marques e a Dante Alário Júnior, outro sócio-fundador da empresa.

Com o plano de crescimento estabelecido e o modelo de governança desenhado, Amorosino reconhece que a companhia hoje está preparada para uma possível abertura de capital, no momento em que o mercado sinalizar essa janela de oportunidade.

“A governança hoje é a principal conexão entre as áreas da empresa, com os sócios confortáveis com esse grupo. Nosso caminho é a busca de geração de valor para a empresa”, diz o CEO. “Um IPO pode ser uma consequência.”