É feriado nacional de sete de setembro, mas isso não significa que as portas para os M&As no Brasil estão fechadas. E quem está movimentando esse balcão nesta quinta-feira, com uma cifra bilionária, é um dos segmentos, literalmente, mais férteis da economia do País.

Gestora de private equity focada no agronegócio, a Aqua Capital acaba de anunciar um acordo para a venda da brasileira Biotrop, sua controlada, para a Biobest, grupo belga de biocontrole de pragas, doenças e polinização natural.

Com expectativa de conclusão até o fim de 2023, a transação avalia a fabricante brasileira de insumos biológicos, com sede em Vinhedo (SP), em R$ 2,8 bilhões (€ 532 milhões) e também envolve a venda da fatia detida pelo Fundo Soberano de Cingapura (GIC) na operação.

Nos termos de compra, a Biobest irá desembolsar esse montante em troca de 85% das ações da Biotrop. O acordo prevê ainda a aquisição da fatia restante pelo grupo após um período de transição de três anos.

A empresa informou ainda que, para financiar a aquisição, irá realizar um aumento de capital que será subscrito por alguns de seus acionistas atuais, entre eles, o fundo Sofina, e novos investidores, como os fundos Tikehau Capital, M&G Investments, Unigrainse Sofiprotéol.

“Esse anúncio é um marco para a Biobest”, afirmou, em comunicado, Jean-Marc Vandoorne, CEO do grupo, ressaltando que o mercado brasileiro de controle biológico e produtos relacionados está estimado em mais de US$ 1 bilhão, com uma taxa de crescimento anual de 43%.

Ao observar que esse ritmo de expansão no País superar qualquer outro mercado no mundo, o executivo também pontou que o segmento tem sido impulsionado por um ambiente regulatório favorável. E destacou o potencial da Biotrop nesse cenário.

“A Biotrop ocupa uma posição de destaque nesse mercado. Suas fortalezas incluem registros de patentes inigualáveis baseados em extensa pesquisa e desenvolvimento, produção escalável de alta qualidade e uma estratégia de entrada no mercado multicanal forte”, disse Vandoorne.

Para o CEO da Biobest, o acordo amplia o escopo do grupo, da horticultura para a agricultura, incluindo nesse processo grandes cultivos a campo aberto, do biocontrole a outros produtos biológicos, incluindo inoculantes e bioestimulantes.

Fundada em 1987, a Biobest tem mais de 1,7 mil funcionários, distribuídos em 24 subsidiárias. Até então, na América do Sul, sua presença direta estava restrita a uma operação na Argentina. A atuação global do grupo é reforçada por uma rede de mais de 120 distribuidores, em cerca de 70 países.

Fundador e líder da Aqua Capital, Sebastian Popik, por sua vez, ressaltou que os seis anos da Biotrop no portfólio da gestora foram uma “jornada incrível” e que, nesse novo momento, a empresa não poderia ter encontrado “um lar melhor do que a Biobest”.

Na outra ponta do acordo, Antonio Zem, CEO da Biotrop, reforçou esse discurso e afirmou que, com a gestora e o GIC, a empresa conseguiu implementar uma estratégia vencedora e se preparar para entrar em outros mercados. E que esse era o momento ideal para fazer parte de um grupo global.

“Houve muito interesse de importantes players globais do setor agrícola, mas escolhemos a Biobest pelo seu posicionamento como especialista em produtos biológicos, sua agilidade e seu comprovado histórico de integrações bem-sucedidas de empresas após a aquisição, aproveitando a iniciativa dos times de gestão locais”, observou Zem.

Ativo cobiçado

Fundada em 2018, a Biotrop apurou uma receita líquida de R$ 276,9 milhões em 2022, ante R$ 139,6 milhões em 2021. O lucro líquido, por sua vez, evoluiu de R$ 29,1 milhões para R$ 30,9 milhões nesse intervalo. Para este ano, a empresa projeta uma receita bruta de R$ 679 milhões.

Com esses números, a companhia vinha sendo, de fato, um ativo bastante cobiçado nos últimos meses. Em entrevista concedida ao AgFeed, em maio deste ano, Rogério Rangel, diretor de marketing da empresa, admitiu que a companhia estava sendo alvo de diversas consultas, mas que, até aquele momento, não havia nada de concreto.

Na época, o valor de uma eventual transação estava estimado justamente em um patamar acima de R$ 2 bilhões. “A Biotrop é uma empresa que levanta interesses no mercado, pela capacidade de inovação, pelo rápido crescimento e pelos excelentes resultados”, disse Rangel.

Parte desse valuation também incorpora outros números relativos ao mercado brasileiro de biodefensivos, que, segundo um estudo da consultoria CropLife Brasil, movimenta R$ 3,3 bilhões e registrou um crescimento médio anual de 61%, entre 2018 e 2022.

A pesquisa também projeta que esse segmento vá chegar a uma cifra de R$ 17 bilhões, em 2030. E que, a partir de um mercado ainda bastante pulverizado, com mais de 140 players, a perspectiva é de que haja uma forte consolidação nesse contexto.

Em direção a esses números, a Biotrop tem feito investimentos para aumentar suas capacidades. Entre eles, um aporte de R$ 90 milhões aplicado na ampliação de sua fábrica em Curitiba, na construção de uma segunda unidade na mesma cidade e também de uma terceira planta em Jaguariúna (SP).

Para financiar esses passos, a empresa recorreu à emissão de debêntures verdes, em 2022, em uma oferta que resultou na captação de R$ 100 milhões. O “poder de fogo” da companhia também já tinha sido reforçado em 2021, com a entrada do GIC em seu quadro de investidores.

Com essa nova estrutura, a companhia estabeleceu como meta a manutenção de um ritmo de lançamentos na faixa de cinco a seis produtos por ano. E, para isso, projetou reservar de 12% a 13% de sua receita para investimentos em pesquisa e desenvolvimento.

Um dos fatores no centro dessa estratégia e que também ajuda a explicar a evolução da companhia, com poucos anos de estrada, é a tese de criar produtos com uma “vida útil” de longo prazo, o que permite reduzir a complexidade na distribuição e no armazenamento dos insumos.